16-Saude Coletiva

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SAÚDE

COLETIVA

Taís de Campos Moreira


UNIDADE

Introdução, conceitos
básicos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste capítulo, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a saúde coletiva.


 Descrever a genealogia da saúde coletiva no Brasil e no mundo.
 Apontar as diferenças nos conceitos entre saúde coletiva e saúde
pública.

Introdução
Embora sejam conceitos diferentes, em inúmeras situações as pessoas
acham que o conceito de saúde coletiva é igual ao conceito de saúde
pública. a saúde coletiva como conceito resultou do movimento sani-
tarista, e a saúde pública é a tentativa de assegurar que todo indivíduo
tenha, dentro da comunidade, um padrão de vida que lhe assegure a
manutenção da saúde.
Neste capítulo, serão abordados o conceito e o histórico da saúde
coletiva no Brasil e no mundo, bem como as diferenças entre saúde
coletiva e saúde pública.

Saúde coletiva
A saúde coletiva é composta da integração das ciências sociais com as polí-
ticas de saúde pública. Ela identifica variáveis de cunho social, econômico e
ambiental que possam acarretar no desenvolvimento de cenários de epidemia
em determinada região, por meio de projeções feitas através da associação dos
dados socioeconômicos com os dados epidemiológicos. Com essas informa-
2 Introdução, conceitos básicos

ções, é possível elaborar políticas eficientes de prevenção de acordo com as


características da população (PAIM, 2008; NUNES, 1994). A saúde coletiva
busca ampliar a compreensão sobre a saúde, incluindo investigações históricas,
sociológicas, antropológicas e epistemiológicas. Ela foi criada a partir de um
movimento sanitarista que surgiu no Sistema Único de Saúde (SUS), e tem
como objetivo auxiliar na identificação de variáveis sociais, econômicas e
ambientais que possam acarretar o desenvolvimento de epidemias em regiões
específicas. O termo da saúde coletiva surgiu a partir da reforma sanitária, que
começou no Brasil na luta contra a ditadura, com o tema Saúde e Democracia,
e estruturou-se nas universidades, no movimento sindical, em experiências
regionais de organização de serviços. Esse movimento teve início no final da
década de 1970, e a ideologia do movimento pela reforma sanitária brasileira
preconizava a saúde não como uma questão a ser resolvida pelos serviços
médicos, mas, sim como uma questão social e política. A saúde coletiva no
Brasil teve como marcos iniciais a criação do Centro Brasileiro de Estudos
de Saúde (CBES) e a criação da Associação Brasileira de Pós-Graduação em
Saúde Coletiva (ABRASCO) (OSMO; SCHRAIBER, 2015).
A saúde coletiva abrange atualmente um conjunto complexo de práticas e
saberes relacionados ao campo da saúde, envolvendo desde organizações que
prestam assistência à saúde da população até instituições de ensino e pesquisa
e organizações da sociedade civil. Compreende práticas técnicas, científicas,
culturais, ideológicas, políticas e econômicas.
Em relação à análise do processo saúde-doença, a saúde coletiva tem tido
como desafio a necessidade de incorporar novas abordagens que possam
explicar os fenômenos, sobretudo valorizando o indivíduo, bem como as
representações sociais. Dessa forma, as pessoas experimentam o estar com
saúde ou o sentir-se doente levando em consideração as condições sociais
mais amplas (L’ABBATE, 2003).
Quanto às práticas de saúde dentro da saúde coletiva, é importante perceber
o usuário como uma pessoa portadora de vontades e de desejos, capaz de agir
e reagir diante do que está sendo oferecido como resposta às suas queixas.
É necessário aproximar a saúde coletiva de campos disciplinares como a
filosofia e a psicanálise, tendo em vista a complexidade que as questões da
saúde assumem.
Alguns temas que são essenciais na saúde coletiva, como, por exemplo,
orientações sobre estilos de vida ou orientações em relação ao grave problema
da violência doméstica passaram a ser trabalhados por especialidades médicas,
mostrando a real preocupação com a promoção da saúde e a necessidade de
estar sempre conectando as questões da saúde coletiva (L’ABBATE, 2003).
Introdução, conceitos básicos 3

A Saúde Coletiva, desde o seu início, envolve-se com lutas teóricas, para-
digmáticas, políticas e ideológicas, trazendo repercussões para saúde como
um todo na sua delimitação e renovação, levando à contribuição dos sujeitos
individuais e coletivos e identificado caminhos que permitam tornar a Saúde
Coletiva um espaço cada vez mais aberto a novos paradigmas diante das ne-
cessidades de saúde, dos direitos humanos, de processos emancipatórios e da
democratização da vida social. Ela pode ser considerada uma nova forma de
saúde pública, pois é reconhecida como campo de saber e âmbito de práticas,
o que evidencia a redefinição das concepções da Medicina Social do século
XIX. Sendo assim a saúde coletiva tem muitos desafios dentro do SUS.

Desafios da saúde coletiva dentro do SUS


 Oferecimento de um serviço de qualidade em um sistema em que o
usuário é a totalidade dos brasileiros;
 Vacinação, recebimento de remédios gratuitos para doenças crônicas e
tratamento de câncer, intervenções cirúrgicas ou internações;
 Oferta de construção de uma carreira específica e atrativa para os profis-
sionais de saúde da equipe básica (medicina, enfermagem e odontologia);
 Defesa clara de políticas universalistas no campo da saúde e da vida
coletivas (como o SUS) de campos congêneres, para ação conjunta junto
aos governos e à sociedade civil.

Toda saúde pública é coletiva, mas nem toda saúde coletiva é pública. O planejamento
da saúde pública é mais amplo que o da saúde coletiva.

Saúde coletiva e saúde pública


Quando estudamos a saúde coletiva, deixamos de ver apenas a dimensão
corporal dos indivíduos e passamos a pensar também nos indivíduos como
cidadãos de direito e donos de uma capacidade crítica de reflexão do modo
como levam a vida (CAMPOS, 2000).
4 Introdução, conceitos básicos

Assim, a Saúde Coletiva tem como objetivo evitar a doença e prolongar


a vida; melhorar a qualidade de vida da população; e permitir o exercício
da liberdade humana e a busca da felicidade. Para alcançar esses objetivos a
saúde coletiva usa de informações provenientes da epidemiologia social e das
ciências sociais, priorizando as informações sobre as desigualdades em saúde.
Essa organização da Saúde coletiva vai além do controle de infecções, da
organização de serviços médicos e de enfermagem para o diagnóstico precoce
e do tratamento das doenças, que são conceitualmente tarefas da saúde pública.
A saúde pública é um conjunto de ações e serviços de caráter sanitário
que têm como objetivo prevenir ou combater patologias ou riscos à saúde da
população. Geralmente o termo saúde pública é erroneamente utilizado como
sendo saúde coletiva porque, como é dever do Estado assegurar políticas de
promoção à saúde, esse aparece como o termo mais conhecido. Mas os termos
não devem ser confundidos, pois são termos com objetivos e metas diferentes.
Na saúde pública, há o uso do conhecimento, médico ou não, para organizar
os serviços de saúde e o sistema, além da atuação nos fatores do processo saúde/
doença, controlando a incidência de doenças por meio de vigilância sanitária.
Na medida em que as necessidades da saúde vão além das necessidades dos
serviços de saúde, elas não se restringem a problemas de saúde, ou seja, envolvem
doenças e riscos, que podem ser carências ou vulnerabilidades que expressam
modos de vida e identidades. Envolve, assim, o que é necessário para ter saúde,
sejam os determinantes socioambientais e culturais, seja a ideia de projeto (de
felicidade, qualidade de vida, gozo estético, filosofia, etc.) (PAIM, 2006).
Os desafios da saúde pública dentro da saúde coletiva são imensos. Entre
eles, resolver as questões mais explosivas implicadas na vida coletiva: a fome,
o meio ambiente como natureza deteriorada; a violência como sintoma cole-
tivo de um modo social de viver: contra crianças, idosos, mulheres, etnias,
homossexuais, ativistas no uso de seus direitos civis: grupos paramilitares,
guerras civis e de invasão; desemprego, subemprego, instabilidade, competição
individual pelo direito de trabalhar: o regime capitalista atual de organização
social do trabalho como gerador de sofrimento e de doença individual e coletiva.
É preciso assumir explicitamente que a saúde pública é uma construção
social e histórica e que, portanto, depende de valores, ou seja, é resultante da
assunção e da luta de alguns valores contra outros. Nesse sentido, sugere-se que
os sanitaristas e demais profissionais de saúde assumam uma visão de mundo
fundada na defesa da vida das pessoas. Isso implica a busca da construção de
condições sociais que possibilitem aos especialistas em saúde coletiva trabalhar
com autonomia relativa tanto em relação ao Estado, quanto a partidos políticos,
ideologias e outras racionalidades técnicas (CAMPOS, 2000) (Figura 1).
Introdução, conceitos básicos 5

Figura 1. Contexto de sistemas de saúde.


Fonte: Adaptada de Giovanella et al. (2012).

O processo saúde-enfermidade-intervenção não é monopólio nem ferramenta exclu-


siva da saúde coletiva, mas de todo o campo científico da Saúde e de todas as práticas
que compõem o campo mais amplo da saúde.

A história da saúde coletiva


Alguns fatos importantes marcam a história da saúde coletiva no mundo. Seu
surgimento se deu principalmente a partir do momento em que as populações
passaram a ser consideradas como riquezas que deveriam ser cuidadas, cabendo
ao poder público contar as pessoas, conhecer suas condições de vida e acompa-
nhar as taxas de natalidade e mortalidade. Assim surgiram movimentos como
a Aritmética Política, criando o Conselho de Saúde de Londres, proposto por
William Petty, em 1687, e a Polícia Médica, na Alemanha, sob as lideranças de
6 Introdução, conceitos básicos

V. Ludwig Seckendorf (1655), W. Thomas Rau (1764) e J. Peter Frank (1779).


Esse movimento também apareceu na França com a institucionalização da
Higiene, na primeira metade do século XIX, que mais tarde deu origem à
Medicina Social, inspirada no socialismo. Na mesma época, na Inglaterra, a
industrialização agravou as condições de saúde dos trabalhadores e motivou
uma investigação com resultados que deram início ao Movimento Sanitarista,
ou Saúde Pública, com ações de saneamento ambiental.
Os países europeus avançaram um processo macrossocial da maior impor-
tância histórica: a Revolução Industrial, que produziu um tremendo impacto
sobre as condições de vida e de saúde das suas populações. Com a nova
organização dos trabalhadores e o aumento da sua participação política,
principalmente nos países que atingiram um maior desenvolvimento das re-
lações produtivas, como Inglaterra, França e Alemanha, incorporam-se temas
relativos à saúde nas reivindicações dos movimentos sociais. Esse movimento
defende que a medicina é política e auxilia na cura dos males da sociedade.
A participação política é a principal estratégia de transformação da realidade
de saúde: as revoluções populares deveriam resultar em democracia, justiça e
igualdade, que fazem parte da saúde social (PAIM; ALMEIDA FILHO,1998).
Em 1879, os EUA adotam medidas inspiradas na Saúde Pública inglesa e
criam o Departamento Nacional de Saúde, que desenvolve ações de saneamento
para o controle de doenças infecciosas. Todos esses movimentos levam à ideia
da saúde coletiva (ESCOREL, 2009), pois olham para as questões sociais e
não apenas para a doença.
Olhando para a história da Saúde Coletiva no mundo, podemos verificar que
sempre tudo que foi feito em termos de melhoria de saúde foi levando em conta
a Promoção da Saúde. Suas atividades estavam diretamente direcionadas para
o coletivo de indivíduos e o ambiente, compreendido como o ambiente físico,
o social, o político, o econômico e o cultural, através de políticas públicas,
até atingir condições favoráveis ao desenvolvimento da saúde e do reforço da
capacidade dos indivíduos e das comunidades (BUSS, 2000).
Inúmeros eventos marcaram os acontecimentos da saúde coletiva no mundo.
Iniciando na Europa devido a uma epidemia de cólera, em 1851 foi realizada a
primeira Conferência Internacional de Saúde, restrita a apenas à cólera. Já em 1873,
na América Latina, houve a primeira convenção sobre o impacto das epidemias de
cólera e febre amarela na região. Em 1887, no Rio de Janeiro, um novo encontro
aconteceu e ficou estabelecida a Convenção Sanitária do Rio de Janeiro.
Ainda aconteceram o International Sanitary Bureau, em 1902, sediado em
Washington (EUA), que atualmente é a Organização Pan-Americana de Saúde
(Opas); o Office International d’Hygiène Publique (OIHP) em 1907, em Paris; e,
Introdução, conceitos básicos 7

em 1919, The Health Organization of the League of Nations, sediado em Genebra,


Suíça (MATTA, 2005). Todas essas conferências e organizações preocupavam-se
com o controle e a prevenção da transmissão de doenças entre os países.
Após a Carta de Otawa (1986), inúmeros encontros internacionais foram
realizados para aproximar o conceito de Promoção de Saúde da prática.

Cronologia da promoção da saúde no mundo


1974 – Informe Lalonde: uma nova perspectiva sobre a saúde dos canadenses/A New
Perspective On The Health of Canadians
1976 – Prevenção e Saúde: Interesse para Todos. DHSS (Grã-Bretanha)
1977 – Saúde para Todos no Ano 2000 – 30ª Assembleia Mundial de Saúde
1978 – Conferência Internacional sobre Atenção Primária de Saúde - Declaração de
Alma-Ata
1979 – População Saudável/ Healthy People: The Surgeon General’s Report on Health
Promotionan and Disease Prevention. US-DHEW (EUA)
1980 – Relatório Black sobre as Desigualdades em Saúde/Black Report on Inequities
in Health. DHSS (Grã-Bretanha)
1984 – Toronto Saudável 2000 – Campanha lançada no Canadá
1985 – Escritório Europeu da ORganização Mundial da Saúde: 38 Metas para a Saúde
na Região Europeia
1986 – Alcançando Saúde para Todos: Um Marco de Referência para a PRomoção
da Saúde/ Achieving Health for All: A Framework for Health Promotion – Informe do
Ministério da Saúde do Canadá. Min. Jack EPP
Carta de Ottawa sobre Promoção da Saúde – I Conferência Internacional sobre Pro-
moção da Saúde (Canadá)
1987 – Lançamento pela OMS do Projeto Cidades Saudáveis
1988 – Declaração de Adelaide sobre Políticas Públicas Saudáveis – II Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde (Austrália)
De Alma-Ata ao ano 2000: reflexões no Meio do Caminho – Reunião Internacional
promovida pela OMS em Riga (URSS)
1989 – Uma chamada para a Ação/ A Call for Action – Documento da OMS sobre
promoção da saúde em países em desenvolvimento
1990 – Cúpula Mundial das Nações Unidas sobre a Criança (Nova York)
1991 – Declaração de Sundsvall sobre Ambientes Favoráveis à Saúde – III Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde (Suécia)
1992 – Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92)
Declaração de Santa Fé de Bogotá – Conferência Internacional sobre Promoção da
Saúde na Região das Américas (Colômbia)
1993 – Carta do Caribe oara a Promoção da Saúde -I Conferência de Promoção da
Saúde do Caribe (Trinidad e Tobago)
8 Introdução, conceitos básicos

Conferência das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos (Viena)


1994 – Conferência das Nações Unidas sobre População e Desenvolvimento (Cairo)
1995 – Conferência das Nações Unidas sobre a Mulher (Pequim)
COnferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Social (Copenhague)
1996 – Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos (habitat II)
(Istambul)
Cúpula Mundial das Nações Unidas sobre Alimentação (Roma)
1997 – Declaração de Jacarta sobre Promoção da Saúde no Século XXI em diante - IV
Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde (Indonésia)
Fonte: Buss (2000).

Sistemas de Saúde no mundo


Os sistemas de saúde são estruturas públicas e privadas de atenção à saúde.
São compostos pela relação que o conjunto de instituições prestadoras de
serviços de saúde mantém entre si. Os sistemas de saúde nos ajudam a saber se
as estruturas de saúde estão falhando ou estão bem-sucedidas nos objetivos de
promover a saúde, cuidar dos pacientes e aliviar o sofrimento (GIOVANELLA
et al., 2012). Os sistemas de saúde auxiliam a garantir a prevenção de doenças
e a oferta direta dos serviços de cura e reabilitação, incluindo o controle e a
definição de regras para a produção de alimentos, medicamentos, equipamen-
tos, proteção do meio ambiente, etc., ou seja, os sistemas devem solucionar
problemas de forma abrangente em cada país. Os principais componentes dos
sistemas de saúde são:

 Financiamento;
 Força de trabalho;
 Rede de serviços;
 Insumos e tecnologias;
 Organizações.

Existem no mundo alguns modelos de saúde, e sabe-se que nenhum país


adota exclusivamente um único modelo. Os modelos são:

 Modelo Universalista: caracterizado pelo financiamento público de


recursos de impostos e pelo acesso universal aos serviços de saúde,
como por exemplo o SUS no Brasil.
Introdução, conceitos básicos 9

 Modelo de Seguro Social: implica num seguro no qual a participação


é obrigatória, como, por exemplo, na Alemanha. O financiamento é
por contribuições dos empresários e trabalhadores.
 Modelo de Seguros Privados: a organização é descentralizada e a re-
gulação pública é escassa. O modelo que mais se aproxima é o dos EUA.
 Modelo Assistencialista: nesse modelo a saúde não é um direito do
povo, mas uma obrigação dos cidadãos, e o Estado só presta a assistência
às pessoas incapazes de assumir o cuidado de saúde.

No Brasil, o SUS, dentro do modelo universalista, visa atender com equidade


a todos os cidadãos brasileiros (CARVALHO, 2013).

Neste link você poderá saber mais sobre o movimento


sanitarista no Brasil e no mundo.

https://goo.gl/bYqeMD

A história da saúde coletiva no Brasil


Na época do Brasil colônia praticamente não existia nada em termos de saúde
para a população. A assistência à saúde era realizada por pajés, jesuítas e
pelos boticários que percorriam o Brasil. Após alguns anos do descobrimento,
começaram a surgir no Brasil as primeiras Santas Casas de Misericórdia, que
foram criadas para suprir o vazio assistencial do país. Com a chegada da família
real e o agravamento de doenças na população, as famílias mais ricas recebiam
cuidados de agentes europeus, que vinham para o Brasil prestar os cuidados.
Os pobres continuavam sendo isolados e recebendo apenas cuidados paliativos.
As primeiras medidas sanitárias no Brasil surgiram apenas em 1902, com
a nomeação do médico Osvaldo Cruz para resolver os problemas das doenças
que se espalhavam rapidamente, como malária, varíola, febre-amarela e peste
10 Introdução, conceitos básicos

bubônica. O médico então convocou pessoas para realizar ações que previam
invadir as residências e queimar roupas e colchões sem qualquer explicação.
Nessa época, aconteceu o auge do conflito de uma vacinação anti-varíola e
a população saiu às ruas no que ficou conhecida como a Revolta da Vacina.
Apenas após a chegada de imigrantes Europeus no Brasil teve início a discussão
um modelo de assistência médica para os pobres. A partir de 1972, surgiram as
primeiras representações sanitaristas no Brasil. A partir de então o movimento
Sanitarista no Brasil foi ganhando força. Assim, a Reforma Sanitária Brasileira
aconteceu no contexto da luta a contra ditadura, referindo-se a um conjunto
de ideias para transformações necessárias na área da saúde que melhorariam
as condições de vida da população. Era composta de principalmente 4 dimen-
sões: dimensão específica do campo saúde/doença; dimensão institucional;
dimensão ideológica; e dimensão das relações entre produção, distribuição e
apropriação das riquezas, de forma a determinar situações de risco (PAIVA
et al., 2013; PAIM; TEIXEIRA, 2006).
Na década de 1970, sobretudo a partir de 1975, as importantes transforma-
ções que ocorreram na sociedade brasileira, marcadas pelo esgotamento das
possibilidades do chamado “milagre econômico” e pela derrocada do governo
militar, produziram uma forte crise econômica, acentuando a dependência
do país aos mercados externos e a desigualdade na distribuição de renda da
população. A crise econômica se refletiu no setor da saúde, diminuíram-se os
recursos destinados à saúde pública e, em contrapartida, houve o aumento dos
gastos com a assistência médica individual, mediante os repasses de dinheiro
público à Previdência Social. Por isso, processavam-se mudanças nas duas
áreas, o que, desde os anos 1960, ocasionou um reordenamento da política de
saúde para fazer face a essa crise político-financeira, principalmente porque o
setor da assistência médica previdenciária sempre foi considerado hegemônico,
por defender os interesses do capital.
Nesse contexto, profissionais das áreas da saúde pública e da medicina
preventiva, que sempre tiveram significativa presença na cena política brasileira
através de algumas organizações de caráter científico e/ou sindical, passaram
a defender o sistema público de saúde, enfatizando o direito à saúde. A questão
da saúde sempre foi altamente politizada no Brasil, e o chamado movimento
sanitário teve papel importante na resistência ao regime militar brasileiro e
na luta pela democratização do país.
Introdução, conceitos básicos 11

Em 1986, a partir da convocação da VIII Conferência Nacional da Saúde


pelo Ministério da Saúde, cujo tema principal foi o direito à saúde, sugeriu-se
a criação do SUS. Mas foi apenas em 1988, com a nova Constituição, que a
saúde brasileira ganhou um valor maior. A CF/88 tem em seu Título VIII,
Capítulo II e Seção II – Da Saúde, que abrangem os artigos 196 até o 200.
Os objetivos do SUS são:

 identificar e divulgar os condicionantes e determinantes da saúde;


 formular a política de saúde para promover os campos econômico e
social, para diminuir o risco de agravos à saúde;
 fazer ações de promoção, proteção e recuperação de saúde, integrando
ações assistenciais e preventivas (CARVALHO, 2013).

Os princípios do SUS são a Universalidade, a Igualdade e a Equidade.

 Universalidade: diz respeito ao direito à saúde e estipula que o SUS


não pode discriminar ninguém, o direito a saúde é para todos.
 Igualdade: todos os cidadãos têm igual direito de acesso às ações e
serviços de saúde.
 Equidade: significa tratar diferentemente os que tem diferenças e
igualmente os que possuem igualdade. No SUS isso é relacionado às
questões de saúde (CARVALHO, 2013).

A partir de então o SUS começou a ser estruturado e, com a alta demanda


e a pouca organização, o sistema ficou insulado e os planos de saúde começam
a surgir discretamente.
No artigo 199, está escrito que a assistência à saúde é livre à iniciativa
privada, o que explica o aparecimento dos planos e seguros de saúde privados
no Brasil a partir de 1988. O surgimento foi de forma muito tímida, mas hoje os
planos e seguros ocupam uma grande parcela do mercado de saúde brasileiro,
O SUS tem muitos desafios. Algumas questões merecem destaque, pois
tendem a melhorar as condições de saúde da população brasileira. Entre elas:
a ampliação do acesso da população às ações e serviços de saúde; a humani-
zação, o acolhimento e a qualidade; a ampliação da qualidade de gestão do
SUS, modernizando os seus mecanismos; o financiamento crescente e estável
para o setor, compatível com o crescimento, o desenvolvimento econômico e
social do país e as necessidades do SUS (CARVALHO, 2013).
12 Introdução, conceitos básicos

Em um cenário de crise no setor da Saúde no Brasil, na segunda metade da década


de 1970, as medidas adotadas foram muito limitadas, a crise se expressava pela baixa
eficácia da assistência médica, pelos altos custos do modelo médico-hospitalar e pela
baixa cobertura dos serviços de saúde em função das necessidades da população.
13 Introdução, conceitos básicos

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