O desequilíbrio climático estimula a expansão de empresas verdes, que reduzem os impactos ao meio ambiente e os passivos ambientais, bem como aquelas destinadas a tornar os negócios de seus clientes - ou o planeta - mais sustentáveis. Regulamentação, demandas do consumidor, participação em cadeias de valor, acesso a mercados e capital estão entre os vetores rumo à economia verde, com maturidade e dinâmicas particulares a depender de segmentos e empresas.
“O potencial de negócios e impacto em sustentabilidade varia e depende de inovação tecnológica, demanda e gestão pública”, avalia Marta Camila Carneiro, docente e autora de cursos ESG, na FGV.
A Aço Verde do Brasil (AVB), do grupo Ferroeste, nasceu há oito anos com foco em reduzir ao máximo a emissão de carbono (CO2). Tem capacidade de produzir 800 mil toneladas ao ano com uso de carvão vegetal de eucalipto, colhido de florestas próprias. Todo o gás de biomassa é usado em alto-forno e responde por um terço da energia consumida. O restante é energia renovável. A perda de água, em circuito fechado, é de 3%.
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A construção de uma segunda termoelétrica vai produzir 100% da energia necessária. Resíduos sólidos destinados a aterros serão aglomerados para uso no alto-forno, junto do carvão vegetal. Embora sem preço premium, o aço verde sairá na frente quando a Europa impuser limitação de emissão de CO2 a partir de 2026, diz Sandro Marques Raposo, diretor de ESG e novos negócios da AVB.
Segundo Daniela Carbinato, sócia e líder de ESG para bens de consumo nas Américas da Bain & Company, pesquisa realizada com 30 CEOs no Brasil indicou insatisfação de quase 80% com a velocidade com que as empresas geram impacto positivo e atingem suas metas de sustentabilidade. Do total, apenas 21% estão muito satisfeitos e 7%, insatisfeitos. “A questão agora é alcançar retorno sobre o investimento”, diz.
Isso requer entender a mitigação de custos ou riscos ocultos, melhor estrutura financeira, papel do Estado ou como gerar receita adicional. Mesmo assim, ela avalia que iniciativas para reciclagem e descarbonização, por exemplo, estão em alta, principalmente em segmentos como plástico ou moda.
Na cadeia química de derivados de petróleo, a brasileira Leaf se dedica ao poliol à base de óleo de mamona. O produto é base para fabricar poliuretano para espumas, como EPS. Com produção mensal em torno de 1,2 mil toneladas, quase 80% são destinadas à exportação. A verificação do ciclo de vida do produto pela consultoria ACV Brasil rendeu declaração da certificadora global SGS relacionada à pegada negativa de CO2 - para cada tonelada de poliol da Leaf são retirados até 730 kg de CO2 equivalente. “Estamos pesquisando óleo de mamona para tintas, colas e adesivos”, diz o fundador e CEO, Jesse Mella. Em agosto a empresa chega à Espanha e, no ano que vem, aos Estados Unidos.
Os diversos tipos de plásticos estão entre os principais agressores ambientais. No campo da embalagem, a americana ERT fabrica biopolímeros compostáveis a partir da cana-de-açúcar que, fermentada, se transforma em termoplástico biodegradável para embalagens. Depois do uso, vira adubo em até seis meses em condições de compostagem. A empresa tem clientes como 5àSec e Positivo e, segundo a diretora de estratégia e sustentabilidade, Gabriela Gugelmin, prepara nova planta em Manaus (AM) para dobrar a produção atual, de 3,5 mil toneladas anuais, em Curitiba (PR).
NotPla e Mango atuam no mesmo campo. A britânica NotPla criou de filme plástico à base de algas a papel com produtos recolhidos nos mares. A americana Mango captura gás metano para produzir biorresina e plásticos flexíveis para clientes como Natura e Stella McCartney, de moda. Aliás, o segmento de vestuário é visto por Tereza Cristina Carvalho, coordenadora do Laboratório de Sustentabilidade e do Centro de Descarte e Reúso de Resíduos de Informática (Cedir), da Escola Politécnica da USP, como um dos mais desafiadores do mundo. Outros segmentos desafiadores são o lixo orgânico, praticamente sem uso no Brasil, e equipamentos de informática - o Cedir remanufatura computadores para diversos usos. “O Brasil gera 240 mil toneladas de resíduo informático ao ano e apenas 4% são recicladas”, diz.
Além de tecidos sintéticos à base de petróleo, a indústria da moda emprega produtos químicos, como tintas, e se apoia em ciclos de uso curto. Iniciativas como uso de segunda mão, reciclagem e adoção de materiais biorrenováveis começam a ser avaliadas.
Uma joint venture entre a Suzano e a finlandesa Spinnova, produtora de têxteis sustentáveis, gerou a Woodspin, fábrica de fibra têxtil sustentável, reciclável e biodegradável vinda de árvores. Com mil toneladas anuais e emissão zero, a unidade economiza mais emissões do que gera. Em reúso, o brechó online Enjoei vale R$ 500 milhões na B3. Já a C&A lançou linha de Jeans Circular, com uso de materiais recicláveis e certificação Cradle to Cradle (berço a berço).
O conceito, que batiza a criação de produtos 100% recicláveis, ainda não é popular. Mas tende a ganhar espaço. Um exemplo é o da fabricante de carpetes Desso. Recomprando produtos usados, inclusive de outros fabricantes, a empresa desenvolveu desde fibra mais durável e máquinas especiais até forro de borracha, que pode ser usado em pneus ou asfaltos. Com inovações, os produtos são capazes de eliminar odores ou reduzir a temperatura ambiente.
Ricardo Assumpção, sócio líder de sustentabilidade e CSO LATAM da EY, observa que a única forma de criar valor em empresas verdes é a inovação. “A economia verde ainda depende da marrom, convencional”, diz. Por outro lado, se até hoje o comprometimento ambiental não afetava produção de caixa, agora afeta a capacidade de atrair capital, com custo mais alto, e acesso a mercados, por perda de competitividade.
A americana Brimstone apostou em inovação para descarbonizar cimento. O setor responde por 7,5% das emissões globais de CO2, com 60% delas provocadas pelo uso do calcário como matéria-prima - o material contém carbonato de cálcio, que ao esquentar evapora o CO2. Os 40% restantes são da energia necessária para aquecimento a 1.400 graus Celsius. O truque foi trocar o calcário por basaltos, usados geralmente como brita em construções. A empresa já tem 12 patentes, validação da ASTM (correspondente à brasileira ABNT) e recebeu US$ 189 milhões do governo americano para construir planta-piloto, detalha Bruno de Oliveira, vice-presidente de ciência de materiais e geologia.
A legislação também empurra iniciativas. No Brasil, a partir de 2026, as empresas abertas serão obrigadas a relatar indicadores de sustentabilidade, segundo a instrução 193 da CVM. Outros impulsos são a oportunidade de inovação a partir da natureza, um quesito que tende a favorecer o Brasil, e a necessidade de inserção em cadeias de valor lideradas por empresas com agendas verdes fortalecidas.