O Impacto Do Acolhimento Institucional Na Vida Dos Adolescentes

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Acolhimento institucional

ARTIGO ORIGINAL
na vida de adolescentes

O impacto do acolhimento institucional


na vida de adolescentes
Patrícia Nunes da Fonseca

RESUMO – Objetivo: Esta pesquisa objetivou analisar o impacto do


acolhimento institucional na vida de adolescentes. Participaram 11 ado­
lescentes do sexo masculino, com idade média de 15,36 anos (DP=1,36;
variando de 13 a 17 anos). Método: Utilizou-se um questionário
sociodemográfico e um roteiro de entrevista semiestruturado. Para análise
de dados, foram empregados o pacote estatístico SPSS (versão 21) e o
software Iramuteq (versão 0.7 alpha 2). Resultados: Os resultados indicaram
que mesmo na casa de acolhimento os adolescentes mantêm vínculos com
familiares e amigos por meio de visitas, telefone e redes sociais. Quanto à
vida acadêmica, os jovens apresentaram baixo desempenho escolar, embora
tenham demonstrado uma percepção positiva da escola. Com relação às
perspectivas de futuro, os participantes manifestaram a intenção de formar
uma família e mantê-la. Conclusão: Por fim, ressalta-se a importância das
redes de apoio social para o bem-estar do jovem institucionalizado.

UNITERMOS: Desenvolvimento Humano. Adolescentes. Acolhimento.

Patrícia Nunes da Fonseca - Psicóloga. Especialização Correspondência


em Educação Básica e Psicopedagogia. Mestrado e Patrícia Nunes da Fonseca
Doutorado em Psicologia Social pela Universidade Universidade Federal do Paraíba
Federal da Paraíba. Docente da Universidade Federal Núcleo de Estudos do Desenvolvimento Humano,
da Paraíba do Departamento de Psicopedagogia e da Educacional e Social
Pós-Graduação em Psicologia Social, Coordenadora Centro de Educação- Departamento de Psicopedagogia
Núcleo de Estudos do Desenvolvimento Humano, João Pessoa, PB, Brasil – CEP 58059-900
Educacional e Social, João Pessoa, PB, Brasil. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO bre o impacto do acolhimento6, o que evidencia


Atualmente, considera-se a infância como a importância de se pesquisar e entender tais
a fase mais importante da vida dos indivíduos, contextos.
tendo em vista que é nesse período que a criança A partir disso, questiona-se: Quais são as per­
começa a desenvolver seus aspectos cognitivos, cepções dos adolescentes que estão em casas de
biológicos e psicossociais. Durante esse desen­ acolhimento sobre sua vida social e acadê­mica?
volvimento, não são levadas em conta apenas Quais são as perspectivas de futuro desses
questões biológicas, mas também as condições adolescentes?
do ambiente em que a criança está inserida. Diante desse panorama, o presente estudo
Nesse sentido, a família é considerada essen­ teve como objetivo principal analisar a vida dos
cial para tal desenvolvimento, pois tem, dentre adolescentes que vivem nas casas de acolhi­
as diversas funções, a de proteção e de afeto. mento. Especificamente, buscou-se conhecer as
Com o Estatuto da Criança e do Adolescente relações sociais vivenciadas por esses adolescen­
(ECA, Lei Federal nº 8.069/90, as crianças e ado­ tes; saber sobre a vida acadêmica e identificar
lescentes passaram a ser vistos pela população perspectivas de futuro de adolescentes acolhidos
como pessoas em desenvolvimento e, portanto, institucionalmente.
precisavam ter garantidos os seus direitos1,2.
A efetividade desses direitos deve ser pro­ Acolhimento institucional: a vivência de
porcionada pela família em parceria com o adolescentes
Estado e a sociedade, os quais devem garantir Com o objetivo de defender e assessorar
o direto à vida, saúde, alimentação, educação, crianças e adolescentes que se encontram em um
lazer, profissionalização, convivência familiar e contexto de risco e vulnerabilidade social, o ECA
comunitária3. prevê o acolhimento institucional como medida
Nesse sentido, cabe destacar o papel pri­ de proteção integral a crianças e adolescentes3.
mário de proteção da família, espaço no qual Esta medida tem caráter provisório e excep­
se constroem as primeiras aprendizagens e se cional, visa garantir a menores abandonados,
desenvolve a personalidade e os valores dos cujos pais e familiares estejam impossibilitados
indivíduos. Assim, este grupo deve proporcionar de cumprir suas funções, um lugar de desen­
um ambiente de segurança emocional e física volvimento cognitivo, social e afetivo, até que
para que as crianças e os adolescentes possam seja possível o retorno à família de origem ou
crescer de modo saudável4. en­caminhamento para família substituta1,3,6.
No entanto, nem sempre as famílias conse­ Conforme o ECA, o acolhimento institucional
guem garantir aos filhos um ambiente seguro e deve ser aplicado apenas quando esgotadas
satisfatório, necessário para o desenvolvimento todas as alternativas de permanência em seu
infanto-juvenil, passando, muitas vezes, a serem núcleo de origem2,3. Entretanto, não raro, esta
geradoras de risco aos seus membros5. Deste medida se apresenta como alternativa mais
modo, quando a situação de risco no âmbito viá­vel na busca da superação dos momentos
familiar torna-se severa, ocasionando violações de violação7. Segundo o Conselho Nacional de
de direito, são previstas intervenções chamadas Jus­tiça (CNJ), mais de 40 mil crianças e ado­
de medidas de proteção, às quais o acolhimento lescentes, em todo Brasil, vivem essa realidade
institucional está inserido1. de acolhimento8.
Diante disso, não existe um consenso quanto De acordo com a Nova Lei Nacional de Ado­
à consequência da institucionalização no desen­ ção (NLNA), a Lei 12.010/093, o acolhimento
volvimento de crianças e adolescentes. Mesmo institucional não deve ultrapassar o tempo
com o aumento de pesquisas nesta área, ainda má­ximo de dois anos, salvo casos específicos
são insuficientes o conhecimento e reflexão so­ de­terminados por ordem judicial. A NLNA

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estabelece a necessidade de revisão da medida Nesta fase, as relações de pares entre os


a cada seis meses, priorizando, desta forma, o grupos de amizade também assumem um papel
fortalecimento dos laços afetivos e familiares9. de apoio social, sendo a escolha destes influen­
Os serviços de acolhimento devem ainda pos­ ciada a partir de suas próprias características e
sibilitar de um plano individual de atendimento experiências11. Desta forma, essas relações de
visando as especificidades de cada indivíduo, cuidado e amizade são importantes, pois estão
mediante o acompanhamento de profissionais diretamente relacionadas à autoestima e ao
especializados3. bem-estar, proporcionando aos adolescentes o
Contudo, apesar de todos os avanços preco­ apoio emocional necessário para que eles pos­
nizados pelo ECA, ainda não se sabe ao certo sam lidar com eventos geradores de estresse,
que efeitos a institucionalização pode ter sobre a exemplo de doença ou perda de familiares14.
o desenvolvimento de crianças e adolescentes6, Nesse sentido, Abaid & Dell’Aglio15 afirmam
especificamente durante a adolescência, uma que a maioria dos adolescentes acolhidos, por
etapa importante do desenvolvimento, em que terem vivido em um contexto de violação de seus
as experiências vivenciadas durante esta fase direitos, não encontram nos pais ou em amigos
podem ter efeito sobre a forma como se procede estas relações de confiança e amizade, mas em
na vida adulta10. um funcionário da própria instituição, tornando
este a sua principal fonte de apoio social.
A adolescência é um período de transição da
Tal aspecto se apresenta como um fator pro­
fase infantil para a idade adulta, no qual ocorrem
tetivo da institucionalização e exerce efeitos
mudanças de ordem física, cognitiva, emocional
positivos, pois o fato do adolescente encontrar al­
e social. Nesta fase, os adolescentes passam pelo
guém que tenha afeto verdadeiro e uma relação
processo de construção de identidade, que acon­
de proximidade com ele torna-se um importante
tece em interação com a comunidade, podendo
aspecto promotor do desenvolvimento emocional
influenciar de forma positiva ou negativa o seu
e social16.
desenvolvimento11.
Destaca-se, assim, o papel do educador no
Durante esse período, os adolescentes de­
desenvolvimento desses jovens, pois o mesmo
veriam estar inseridos em contextos (exemplo:
tem a possibilidade de trabalhar não apenas o
família, escola e instituições sociais) que garan­
aprendizado cognitivo, mas também o afetivo,
tam a proteção de seus direitos fundamentais, indispensável para que esses jovens possam
porque teriam suas necessidades físicas, sociais aprender a superar as dificuldades que poderão
e emocionais supridas, além de vivenciar expe­ enfrentar durante o seu percurso social17.
riências positivas que oportunizassem maiores Outro contexto de desenvolvimento para o
expectativas de sucesso12. Nesse sentido, a pre­ adolescente é a escola. Além de constituir um
sente pesquisa abordará três aspectos relevantes am­biente que promove a aprendizagem, integra o
da vida do adolescente: o social, o acadêmico e indivíduo à sociedade, proporcionando um espaço
as perspectivas de futuro. de socialização entre os jovens, em que os mesmos
De acordo com Iannelli et al.13, os vínculos podem estabelecer vínculos mais profundos18.
afetivos são essenciais para o desenvolvimento No entanto, Abaid & Dell’Aglio15 e Abaid19
social e emocional do indivíduo e, portanto, irão apontam que a escola tem se mostrado falha em
influenciar na formação de identidade do sujeito. seu papel protetivo para com os adolescentes
Segundo os autores, as ausências desses víncu­ que vivenciam o acolhimento, pois tem revelado
los afetivos positivos podem configurar vários altos percentuais de reprovação e expulsão, além
sentimentos (eg., insegurança, tristeza, rejeição) de possibilitar vivências de agressão como as
e acarretar o aumento de conflitos entre pais e de ameaça ou humilhação, sobretudo por parte
filhos na adolescência. dos colegas.

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Além disso, a vivência precoce e prolongada de intervenções que minimizem os problemas


nas instituições de acolhimento pode potencia­ vivenciados por esses jovens, promovendo a
lizar baixo rendimento escolar, dificuldades na melhoria na qualidade dos serviços prestados.
aprendizagem e nas relações interpessoais18, o
que, por sua vez, pode influenciar no declínio de MÉTODO
motivação para aprender e afetar o modo como Delineamento
estes adolescentes enxergam o seu futuro.
A presente pesquisa é um estudo de natureza
Nesse sentido, as expectativas de futuro se
exploratória, transversal e de campo que buscou
destacam, na adolescência, como outro fator
analisar o impacto do acolhimento institucional
de proteção para o desenvolvimento humano.
na vida de adolescentes.
Erikson20 enfatizou o esforço de um adolescente
para compreender o self, incluindo o papel que
ele precisa desempenhar na sociedade, como um Amostra
processo saudável e vital para ajudar os jovens Contou-se com a participação de 11 adoles­
a lidar com os desafios da vida adulta. centes do sexo masculino, com idade média de
Todavia, as expectativas de futuro dos ado­ 15,36 anos (DP=1,36; variando de 13 a 17 anos),
lescentes em situação de acolhimento são baixas acolhidos em uma instituição não governamen­
em relação aos adolescentes inseridos em outros tal de vínculo religioso na cidade de João Pessoa
contextos socioculturais19, o que se caracteriza (PB). Os participantes vivem na instituição em
como fator de risco ao desenvolvimento, pois média 4,27 anos (DP=3,43; variando de 1 a
indivíduos que apresentam frágeis expectativas 10 anos). Dentre os motivos de acolhimento,
para superar desafios e obstáculos podem ter a destacam-se a dependência química dos pais
sua condição de vulnerabilidade agravada nessa ou responsáveis (36,36%), vivência na rua
fase da vida21. (27,27%), carência de recursos materiais da fa­
Diante dos aspectos de desenvolvimento mília (18,18%) e violência doméstica (18,18%).
discutidos acima, Constantino22 afirma que os
efeitos da institucionalização sobre o desenvolvi­ Instrumentos
mento da criança e do adolescente vão depender Na construção e realização desta pesquisa
do modo como a instituição é organizada, do seu foram utilizados dois instrumentos:
projeto pedagógico e da qualidade das rela­ções
1. Roteiro de entrevista semiestruturado –
estabelecida dentro desses espaços.
contendo questões sobre as relações so­
Neste sentido, destaca-se a necessidade da
ciais vivenciadas pelos adolescentes na
permanente capacitação dos profissionais que
casa de acolhimento, na escola e na família,
atuam nesses espaços, bem como a implemen­
questões sobre a vida acadêmica, percep­
tação de novas políticas nas instituições de
ção do desempenho escolar, dos vínculos
aco­lhimento como, por exemplo, a inclusão do
afetivos, e das perspectivas de futuro;
psi­copedagogo nestas instituições, uma vez que
este profissional trabalha com todos os aspectos 2. Questionário sociodemográfico – solicita
do desenvolvimento (e.g., cognitivos, afetivos e informações tais como: idade, escolari­
sociais), tendo por objetivo o desenvolvimento dade, motivo e tempo do acolhimento ins­
do indivíduo e a superação das dificuldades na titucional.
aprendizagem, seja do cotidiano ou acadêmicas23.
Frente ao exposto, a presente pesquisa busca Procedimento
contribuir para a produção de conhecimento Inicialmente, foi requisitada a autorização
focalizado em adolescentes que vivenciam o aco­ do gestor da instituição para a participação dos
lhimento, aspirando que os resultados encontra­ adolescentes acolhidos, o que se efetivou com a
dos neste estudo possam auxiliar na formulação assinatura do Termo de Anuência. Em seguida,

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os adolescentes foram convidados a participar da Classificação pelo método de Reinert. Nesta


pesquisa, o que se concretizou com a assinatura análise realiza-se uma classificação hierárquica
do Termo de Assentimento. descendente (CHD), cujos segmentos de texto
Na oportunidade, os participantes foram (ST) são classificados de acordo com seus res­
informados sobre os objetivos do estudo e so­ pectivos vocábulos e o seu conjunto é dividido
licitada a autorização para gravar a entrevista. com base na frequência das formas reduzidas,
Na ocasião foi informado sobre o sigilo das formadas a partir do radical das palavras (lem-
respostas e a confidencialidade das respostas. matisation)25. Assim, objetiva-se obter classes,
Ademais, foi esclarecido aos adolescentes que a as quais são formadas a partir da associação
participação seria voluntária, podendo os mes­ significativa de palavras26.
mos desistirem de participar da pesquisa. Análise de similitude. Esta análise baseia-se
As entrevistas foram realizadas em um na teoria dos grafos de Marchand e Ratinaud27
ambiente reservado, dentro da instituição. Na e identifica as co-ocorrências entre as palavras,
ocasião, os participantes discorreram livremen­ resultando em indicações de conexões entre as
te sobre o tema, sendo necessários cerca de mesmas e ajudando a identificar a estrutura do
20 minutos para conclusão da participação. banco de dados (corpus)28.
O presente estudo cumpriu todos os preceitos Nuvem de palavras. Esta tem como objetivo
éticos vigentes para a realização de pesquisas representar graficamente as palavras, organi­
com seres humanos, defendidos pela Resolução zando de acordo com as suas frequências. Por
510/16 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), ser uma análise que facilita a identificação de
sendo aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa pa­lavras-chave a partir do banco de dados, é
do Centro de Ciências da Saúde da Universidade muito utilizada em contextos em que se vise a
Federal da Paraíba - CCS/UFPB, mediante o pa­ exposição objetiva das informações24.
recer nº 0461/16. CAAE: 58597316.8.0000.5188. De modo geral, este programa realiza análises
computadorizadas dos dados com a finalidade de
Análise dos dados extrair os principais elementos explanados pelos
Para realizar as estatísticas descritivas, em­ participantes em seus discursos, permitindo que
pregou-se o pacote estatístico IBM SPSS (versão o pesquisador realize as devidas interpretações
21), para o cálculo de estatísticas descritivas a partir da organização dos resultados.
(medidas de tendência central, dispersão e fre­
quência). Para analisar as respostas da entrevis­ RESULTADOS
ta, foi utilizado o software de análises de dados O corpus analisado é constituído por 11 tex­
textuais denominado Iramuteq (versão 0.7 alpha tos, os quais representam os discursos dos 11
2)24. Este foi desenvolvido por Pierre Ratinaud24, participantes. Foram encontradas 529 formas
o qual utiliza a interface do software R (R Project (ou seja, o número de palavras com radicais di­
for Statistical Computing) que se dedica à análise ferentes contidos no corpus), totalizando 2.300
multidimensional de bases de dados textuais ocorrências (número total de palavras contidas
(denominados de corpus ou matriz). no corpus). Apresentou uma divisão total em 68
Para proceder a análise dos dados textuais, segmentos de textos (ST), sendo classificados na
as respostas dos participantes foram importadas análise 75% do total do corpus.
para o programa Open Office Writer, no qual se
geraram as linhas de comando que compuseram Classificação Hierárquica Descendente (CHD)
o corpus (conjunto de textos que se pretende Inicialmente, procedeu-se a classificação
analisar) do presente estudo. Após a criação do hierárquica descendente (CHD), cujos resulta­
corpus, foram consideradas as seguintes possi­ dos identificaram a presença de seis classes ou
blidades de tratamento dos dados textuais: contextos temáticos, conforme mostra a Figura 1.

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Figura 1. Dendograma da Classificação Hierárquica Descendente (CHD).

A CHD apresenta as partições feitas no cor- saio para ir na casa da minha mãe, para escola,
pus até chegar às classes finais. Assim, o corpus saio para ir no shopping, na praça, eles deixam”
“Aspectos Psicossociais dos Adolescentes Aco­ (Participante 6, 16 anos).
lhidos Institucionalmente” foi dividido em dois A classe 2 intitulada “Percepção acadêmica” é
subcorpus: “Perspectiva social e acadêmica” composta por 10 ST de 68, que explica 19,61% do
e “Perspectivas de futuro”, conforme pode ser corpus. Os vocábulos mais frequentes e signifi­
visto na Figura 1. cativos destes segmentos de textos são: professor,
O primeiro subcorpus, “Perspectiva social e bom, ensinar, conversar, escola, estar, aprender e
acadêmica”, foi composto pelas classes 1, 2 e amigo (p<0,05). Esta classe compreende a per­
6, as quais apresentam um enfoque voltados à cepção que os participantes possuem acerca da
realidade social e acadêmica vivenciada pelos escola, como pode ser visualizado no seguinte
participantes. trecho: “É bom, eu gosto da escola, acho os pro-
A classe 1 “Relações Sociais” apresentou 7 fessores calmos, eles são muito ‘bom’, ensinam a
ST de 68, que explica 13,73% do corpus. Os vo­ gente e também passam umas tarefas tão assim,
cábulos mais frequentes e significativos destes que a pessoa pode aprender mais” (Participante
segmentos de textos são: visita, receber, vez, 9, 16 anos).
casa, telefone e praça (p<0,05). Tal classe en­ A classe 6, “Relações sociais acadêmicas”,
globa meios de interações sociais vivenciados apresentou 9 ST de 68, que explica 17,65% do
pelos adolescentes nas instituições de acolhi­ corpus. Os vocábulos mais frequentes e signifi­
mento, conforme indicam os seguintes trechos: cativos desta classe são: menino, só, abrigo, falar
“Sim, recebo visitas de pessoas que eu conheço e gosto (p<0,05). Nesta classe são evidenciadas
da igreja, elas vêm para cá, fazem visitas, não só as relações sociais vivenciadas pelos adolescen­
para mim, mas para os meninos aqui também. Eu tes no âmbito acadêmico. O segmento a seguir

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ilustra essa situação: “Eu não converso muito na -chave apresentam uma composição central na
escola, eu sou muito calado, só falo mais com distribuição, estabelecendo a conexão com os
os meninos daqui do abrigo mesmo que eu con­ demais vocábulos que formam a estrutura. Tal
verso” (Participante 11, 16 anos). disposição pode ser visualizada na Figura 2.
O segundo subcorpus, “Perspectivas de fu­ É notório o enquadramento da palavra não
turo”, formado pelas classes 3, 4, e 5, veicula no centro da distribuição compondo o núcleo
informações relacionadas as preocupações com o central. A representação desse corpus releva
futuro. A classe 3 denominada “Realizações pes- que a falta de vínculo familiar está diretamente
soais”, contém 9 ST de 68, explicando 17,65% do conectada com as demais palavras. Estes resul­
corpus. Os vocábulos mais representativos destes tados mostram que quanto mais nítida (espessa)
segmentos de textos são: policial, pensar, estudar, forem as ligações, maior é a conexão entre os
coisa, irmão, querer, futuro e sair (p<0,05). Esta vocábulos.
classe está relacionada à realização pessoal e Na Figura 2 é possível perceber uma ligação
como progredir na vida. “No futuro quero estudar, bastante espessa entre as palavras não, só, casa,
fazer a faculdade e arrumar um emprego depois gosto, bom e família, sendo esta última a que
de fazer a faculdade” (Participante 5, 16 anos). mais apresenta ramificações (maior número de
A classe 4, “Assistência familiar”, apresenta palavras associadas). Tal fato indica que “não ter
8 ST de 68, explicando 15,69% do corpus. As família” é um dos principais fatores apontados
palavras mais representativas desta classe são: por crianças e adolescentes como motivo para
emprego, conseguir, viver, faculdade, curso, mu- residirem em casas de acolhimento. Porém, vale
lher e filho (p<0,05). Esta representa a intenção destacar que os mesmos possuem uma visão
dos participantes de constituir e manter uma positiva das instituições, refletindo as fortes
família, tal como aponta o seguinte fragmento: ligações entre os vocábulos casa, gosto e bom.
“Conseguir um emprego e construir uma família
ter uma mulher, filhos; é isso que eu penso do Nuvem de palavras
meu futuro” (Participante 2, 17 anos). Por fim, realizou-se a análise de Nuvem de
Por fim, a classe 5, “Relacionamento familiar”, palavras, cuja finalidade é representar e organi­
possui 8 ST de 68, e explica 15,69% do corpus. zar graficamente os vocábulos mais frequentes
As palavras mais associadas a estes segmentos no corpus analisado. O resultado pode ser visua­
de textos são: hora, estar, ajudar, ligar, coitado, lizado na Figura 3.
família, mesmo e precisar (p<0,05). Nesta clas­ Essa análise se pauta na frequência das pa­
se, evidencia-se a intenção dos participantes lavras. Nesta identifica-se a palavra não como
em manter vínculos com a família, conforme destaque, seguida por outros vocábulos como
ilustram os seguintes trechos: “Penso que eu família, só, gosto, professor, bom, aqui, muito e
devo ajudar a minha família, todo mundo tem legal. Este resultado é consonante com os apre­
dificuldades, eu vou estudar para ajudar eles, sentados nas análises anteriores, visto que a falta
minha mãe e meu irmão” (Participante 8, 15 do vínculo familiar ou “não ter família” os fazem
anos); “Que eu posso ajudar minha família, o estar acolhidos institucionalmente. Porém, mais
que eles precisarem pode contar comigo” (Parti­ uma vez, é possível constatar uma percepção
cipante 9, 16 anos). positiva por parte dos acolhidos, refletindo, as­
sim, o destaque das seguintes palavras: muito,
Análise de similitude bom e legal.
No que se refere à análise de similitude, a
mes­ma foi gerada com base nas co-ocorrências DISCUSSÃO
entre as palavras que constituem o presente Como mencionado anteriormente, a presente
corpus. Assim, observa-se que algumas palavras­ pesquisa teve como objetivo principal analisar

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Figura 2. Análise de similitude.

a vida dos adolescentes que vivem nas casas


de acolhimento; de modo específico, procurou
conhecer as relações sociais vivenciadas pelos
adolescentes; saber sobre a vida acadêmica e
social e identificar perspectivas de futuro. Como
pode ser visto no percurso do trabalho, acredita­
-se que tais objetivos foram alcançados.
No que diz respeito às relações sociais dos
adolescentes, apresentado na Classe 1, obser­
vou-se que, apesar de os jovens estarem moran­
do em uma instituição de acolhimento, eles rece­
bem visitas de familiares e saem frequentemente
para escola, praças, shopping e igrejas. Além de
manter relações com pessoas através de telefone
e redes sociais. Isto revela que a instituição cum­
Figura 3 - Nuvem de palavras. pre o que preconiza o ECA3 acerca do direito da

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criança de convivência familiar e comunitária, ter uma perspectiva de futuro, especialmente,


ou seja, de manter os vínculos familiares e co­ no momento da saída da casa de acolhimento,
munitários dos adolescentes a fim de ajudá-los ocasião em que ele buscará sua inclusão na
na formação de sua identidade social. sociedade.
É salutar que esses vínculos de amizade e O segundo subcorpus, “Perspectiva de fu­
afeto sejam mantidos por familiares, amigos e turo”, é composto pelas classes 3, 4 e 5. Neste
funcionários da instituição, uma vez que o apoio é possível constatar um discurso marcado pelo
emocional na vida do adolescente, sobretudo na desejo em construir sua identidade social, com­
expressão de bem-estar e sentimentos positivos, patível com o grupo a qual se encontra inserido20.
constitui em um importante fator para a forma­ Na classe 3, “Realizações pessoais”, pode-se evi­
ção de identidade e constituição de uma boa denciar relatos que indicam o estudo e a escolha
autoestima13,14,16. de uma profissão como forma de obter sucesso
Outrossim, emergiram no discurso dos ado­ na vida. Já na classe 4, “Assistência familiar”, os
lescentes as relações sociais vivenciadas na mesmos destacam a intenção de formar família e
escola (classe 6). Segundo os participantes, as maneiras de obter o sustento através do empre­
amizades da escola são provenientes, quase que go. Na classe 5, “Relacionamento familiar”, os
exclusivamente, de suas relações intrainstitu­ adolescentes expressam o desejo de manterem
cionais. Sinalizando, portanto, uma segregação o vínculo com seus familiares visando estar pre­
destes jovens na vida escolar. Diante disso, sente e fornecer ajuda sempre que for preciso.
pode-se constatar que os adolescentes possuem Desta forma, os participantes apresentaram
uma inclinação a selecionar amigos que tenham preocupações com o futuro, intenção de formar
as mesmas características, manifestando assim uma família, desejos de realizações profissionais,
um esforço para uniformizar as suas relações11. apreensão quanto a formas de sustento e obten­
Assim, pode ser visto no relato dos participantes ção de sucesso no futuro. Sobre isto, Erikson20
que a formação das amizades tinha como eixo destaca a busca do adolescente em compreender
de intersecção a vida de abandono, a história o self e o papel que precisa cumprir na socieda­
de fracasso, baixo rendimento acadêmico e a de enquanto cidadão. Nesse caso, percorreria
repetência escolar18, refletindo na inserção de um processo saudável do desenvolvimento, ao
alguns desses jovens no Ensino de Jovens e mesmo tempo em que o capacitaria a lidar com
Adultos (EJA). os desafios da vida adulta.
Apesar das vivências de fracasso escolar, os Todavia, para que o adolescente se sobressaia
jovens apresentam uma visão positiva da escola, neste período turbulento, é fundamental o apoio
conforme pode ser visto na classe 2 “Percep­ de profissionais adequados, que compreendam
ção acadêmica”. Esses compreendem a escola as sucessivas violações de direitos acometidos
como um contexto de aprendizagem e citam o antes do acolhimento, as marcas que ficaram em
professor como principal responsável pelo su­ suas vidas e o desejo de ter um futuro melhor.
cesso acadêmico. Tal achado vai ao encontro do Ademais, é fundamental que os adolescentes
pensamento de Fernandéz17, que cita o educador saibam desenvolver atividades compatíveis com
como “peça chave” para o êxito na aprendiza­ seus interesses e habilidades, ajudando-os a
gem, pois, além de conhecimentos teóricos, ele serem cidadãos. Neste sentido, destaca-se a im­
pode trabalhar a afetividade, ajudando o sujeito portância de profissionais especializados para
a superar as dificuldades decorrentes da vida atuar junto a esses sujeitos nas instituições de
escolar e social. acolhimento, a exemplo do psicopedagogo.
A formação pessoal e profissional do ado­ O psicopedagogo poderá contribuir para o
lescente acolhido institucionalmente é extre­ desenvolvimento desses jovens, uma vez que
mante relevante, uma vez que permite ao jovem trabalha com a aprendizagem e envolve todas

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as áreas do desenvolvimento, objetivando a su­ Evidencia-se a necessidade de capacitação


peração das dificuldades não apenas escolares permanente para os profissionais que atuam
como também, aquelas decorrentes do dia a dia nes­tas instituições, a fim de melhor atender os
do sujeito23. Portanto, suas práticas permitem acolhidos, de maneira que sejam espaços que
trabalhar questões que favorecem desenvolver favoreçam verdadeiramente o desenvolvimento
a resiliência procurando ensinar a estes adoles­ integral desta população. Nesse sentido, sugere­
centes a reconstruírem suas próprias histórias. -a inclusão do psicopedagogo nesses espaços,
sobretudo, em decorrência da capacidade deste
CONSIDERAÇÕES FINAIS profissional atuar junto aos processos de apren­
A presente pesquisa dedicou-se à inves­ dizagem e desenvolvimento humano.
tigação de aspectos do desenvolvimento de Por fim, a pesquisa cumpre seus objetivos
adolescentes que vivenciam o acolhimento ins­ por meio de seus resultados. Contudo, cabe aqui
titucional, permitindo compreender o contexto apontar a limitação de natureza amostral, toda­
da institucionalização a partir da percepção e via, não invalida o estudo, mas demanda que os
subjetividade dos mesmos. resultados sejam pensados criticamente.
Ademais, o estudo pode identificar os fatores Para pesquisas futuras, sugere-se a realização
de risco (eg., repetência) e fatores de proteção de estudos com amostras maiores, possibilitando
(eg., otimismo quanto ao futuro) presentes no expandir o conhecimento sobre o assunto e me­
de­senvolvimento de adolescentes acolhidos. Tais lhorar a compreensão dos aspectos psicossociais
informes contribuem para gerar discussões sobre envolvidos, bem como a realização de estudos
novas possibilidades de intervenções direciona­ longitudinais, que examinem mais sistematica­
das a essas instituições, jovens, profissionais, mente a influência da institucionalização sobre
famílias e Judiciário. o desenvolvimento desses jovens.

SUMMARY
The impact of institutional sheltering in the life of teenagers

Objective: This study aimed to analyze the impact institutional shelte­


ring in the life of teenagers. Eleven male teenagers took part of this study,
aged about 15.36 years old (SD = 1.36, varying from 13 to 17). Methods:
A sociodemographic questionnaire and a semi-structured interview script
were used. For data analysis, the statistical package SPSS (version 21) and
Iramuteq software (version 0.7 alpha 2) were used. Results: The results
indicated that, even in shelter homes, the teenagers maintain a link with
family and friends through visits, telephone and social networks. Regarding
to the academic life, although they have showed a positive perception of
the school, the young people presented low school performance. In terms
of future perspectives, the participants expressed the intention of forming a
family and maintaining it. Conclusion: Finally, it highlights the importance
of the support networks for the well-being of the integrated young person.

KEYWORDS: Human Development. Teenagers. User Embracement.

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Acolhimento institucional na vida de adolescentes

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Trabalho realizado na Universidade Federal do Pa­ Artigo recebido: 29/8/2017


raíba, João Pessoa, PB, Brasil. Aprovado: 10/9/2017

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