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ANÁLISE
"Dois a Um" comemora com geléia brasileira
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
No último domingo, o
"Dois a Um", programa
apresentado por Mônica Waldvogel, comemorou seu primeiro ano
de existência promovendo o encontro entre o erudito José Celso
Martinez Correia, legendário diretor do Teatro Oficina, e o popular Ratinho, apresentador de TV.
Tropicalista, oswaldiano, engajado nas múltiplas possibilidades
de troca que a mistura brasileira
sugere, Zé Celso procurou desarmar o agressivo colega de trabalho afirmando o terreno comum
da comunicação. Ratinho mordeu a isca coerente com sua raiz
popular, sua experiência no circo-teatro, sua vocação para palhaço,
tradição que Zé Celso preza.
Nessa toada, Sílvio Santos, o dono da emissora que transmite o
programa, foi saudado com a patente mais alta de palhaço-mor.
O diretor do Oficina aproveitou
a ocasião para pedir o apoio de
Ratinho para sua campanha pela
construção de um gigantesco teatro-estádio, projeto que parecia
ter encontrado vazão em uma heterodoxa parceria com Sílvio Santos, mas que estaria esbarrando
no "financeiro" do grupo SS.
A conversa foi rica em pérolas
da geléia geral brasileira. Os referenciais ideológicos e partidários
de esquerda e direita se confundem. No melê, as provocações
cultural-transformadoras de Zé
Celso se sobressaem.
Ratinho se define como "meio
de direita", defende Lula, acusa
FHC de elitismo e define o MST
como capitalista. Zé Celso critica
Lula, elogia Gil e desconcerta o
colega de programa ao admirar
seu belo corpo de ator.
Ratinho entrou na defensiva, repetindo sua fórmula "sou popular, mas autêntico", antiintelectual e antielite brasileira. Mas terminou seduzido pelo apelo carnavalizante do teatrólogo.
Talvez a reivindicação esteja
deslocada. Se os palhaços Sílvio e
Ratinho têm seus programas de
auditório, o palhaço Zé Celso merece ter o seu. No palco televisivo,
poderá falar não para 15 mil, mas
para 15 milhões.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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