O eucalipto é a base de toda a produção da Suzano, maior fabricante de celulose do mundo. A empresa, que comemora seu centenário em 2024, tem 2 milhões de hectares plantados. Usa a produção extraída daí e compra de terceiros. A árvore é uma espécie de origem exógena. Não é possível precisar a data, mas em meados do século XIX chegaram ao país as primeiras mudas, e seu plantio extensivo serviu, já na década de 1930, à produção de combustíveis para trens.
Menos de 30 anos mais tarde, a Suzano foi a primeira a fabricar papel branco com 100% de fibras de eucalipto em escala industrial na cidade onde instalou sua primeira fábrica de celulose - Suzano, região metropolitana de São Paulo. Com um portfólio diversificado, seu slogan é uma linha de continuidade na sua história: “Nós plantamos o futuro”. Campeã de Papel e Celulose pela terceira vez seguida, a Suzano é a empresa do ano do “Época Negócios 360º”.
A partir de seu nascimento, em 1924, a empresa teve à frente a família Feffer: foi fundada pelo patriarca Leon Feffer, recém-chegado da Ucrânia. Mais tarde, o filho, Max Feffer, assumiu o comando, numa gestão marcada por ampla atividade de pesquisa. Empresa de capital aberto desde 1982, a Suzano mantém-se vinculada à família fundadora, com representantes da terceira geração como acionistas minoritários e membros do conselho administrativo da holding. “Os Feffer tiveram uma incansável disposição de investir no Brasil; não houve ano em que a Suzano não tenha crescido e reinvestido”, diz o presidente da empresa, Walter Schalka, há dez anos no cargo.
Também nunca houve anos tão rentáveis para a Suzano como 2021 e 2022, apesar do aumento de custos e da inflação. Foi a campeã também no desafio desempenho financeiro entre todas as 410 empresas participantes da pesquisa. Schalka atribui a conjunção de fatores favoráveis a “um alinhamento de planetas”: preço alto da celulose e valorização do dólar, dois aspectos ideais para uma empresa cujo mercado externo responde por cerca de 80% da receita total, com vendas a 110 países. Alocações de capital favoreceram as operações internas. A Suzano acrescentou, em 2022, 400 mil ha a suas plantações e planta agora 1,2 milhão de árvores por dia.
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Com a geração de caixa de 2022, a Suzano fez de maio a julho deste ano um programa de recompra de ações que, isoladamente, remunerou os acionistas em R$ 2,8 bilhões. Ainda foram adquiridos ativos da americana Kimberly-Clark, - uma ampliação do segmento de tissues (papéis para higiene pessoal) -, operação concluída em 2023. A Suzano também finalizou a construção do berço e do terminal do Porto de Itaqui (MA) e fez investimentos importantes nas fábricas de Aracruz (ES) e Jacareí (SP).
“Temos uma filosofia de reinvestimento de 90% da nossa geração operacional de caixa, e uma parte importante desses recursos está sendo aplicada no Projeto Cerrado, um marco transformacional na história da produção de celulose”, diz Schalka.
O projeto, em Ribas do Rio Pardo (MS), é o maior investimento privado do Brasil: são R$ 22 bilhões em capital próprio e recursos do mercado e inauguração prevista para junho de 2024. “É uma fase mais demandante, mas a empresa está muito bem preparada para operar a nova unidade em seus primeiros tempos.” Com a operação, o total da produção de celulose da Suzano será de 13,4 milhões de toneladas por ano, cerca de 25% superior à capacidade atual.
“A árvore plantada é o nosso core, e a partir dessa biomassa extremamente competitiva temos entrado em diversos segmentos”, diz Schalka. A madeira da Suzano tem três origens: produção própria, de terceiros e de pequenos fazendeiros com área disponível e próxima de uma das 11 fábricas da empresa. Para eles, a Suzano fornece mudas, tecnologia e ajuda no cultivo.
Maior investimento privado do país, o Projeto Cerrado vai reduzir o custo de produção da empresa em 44,5%
Segundo Schalka, com o projeto, o custo de produção da tonelada cairá de US$ 180 para US$ 100, principalmente pela redução da distância entre árvore e indústria. O raio médio em Ribas do Rio Pardo será de 65 km. Hoje, na empresa toda, é de 200 km. Outros fatores de otimização de custos serão o aumento da produção de energia para venda, a geração de gás a partir da biomassa para a operação e a fabricação de insumos químicos nos arredores.
Após mais de 90 anos produzindo celulose e papel, a Suzano passou também a extrair lignina do eucalipto, substância geradora de energia limpa, uma inovação turbinada pela compra da Fibria, em 2019. O excedente é vendido para produção industrial no mercado e representa mais um setor superavitário da empresa. De olho em avanços tecnológicos, a empresa criou em 2022 a Suzano Ventures, e com ela apoia startups em áreas de interesse, como reflorestamento e produção de energia.
Além da celulose, do papel e da lignina, a Suzano atua no mercado de fluffy, material utilizado na confecção de fraldas, absorventes, tapetes para pets e utilidades hospitalares. Quanto aos tissues, respondem a uma estratégia da Suzano de diversificar para chegar mais perto do consumidor final. Sua inclusão no portfólio da empresa ocorreu há cinco anos. A participação mais relevante nesse setor de negócios da companhia se concentrava no Norte e no Nordeste. Com a compra dos ativos da Kimberly-Clark, abriu-se a possibilidade de atuar em todo o país. A Suzano se tornou líder na produção de tissue e detém a principal marca de papel higiênico, a Neve.
A atividade da empresa tem contrapartida interna no sistema de governança. “É um processo de evolução ao longo do tempo, e o da Suzano mostra um grande dinamismo”, afirma Schalka, com entusiasmo. “Temos um conselho que está sempre inovando, com maioria independente e 33% de participação feminina.” A estrutura se organiza em torno de um conselho de administração sustentado por diversos comitês, entre eles, os de sustentabilidade, auditoria, gestão de finanças e estratégia e inovação. São formados por membros externos, “pessoas absolutamente competentes em suas áreas”, segundo o presidente.
Para uma empresa com base vegetal, a sustentabilidade se impõe. Por características de produção, a Suzano é negativa em carbono e vende energia gerada pela lignina. “A sustentabilidade é prioritária na empresa e no setor há décadas”, diz Schalka. A Suzano tem como meta oferecer, até 2030, 10 milhões de toneladas de produtos renováveis capazes de substituir plásticos e derivados de petróleo.
Em fomento à biodiversidade, cerca de 500 mil hectares das terras da Suzano são cobertos por corredores plantados com mudas nos biomas Cerrado, Amazônia e Mata Atlântica. O presidente destaca ainda as ações estruturantes, e não filantrópicas, que tiraram 200 mil pessoas da pobreza. E, numa extensão natural da atividade da companhia, o instituto Ecofuturo incentiva a leitura e reúne mais de cem bibliotecas em todo o Brasil. “Estamos o tempo todo trabalhando nesses dois pilares, o da inovação e o da sustentabilidade”, diz Schalka.
Paralelamente, a Suzano tem uma política de diversidade ampla e capilar por meio de metas bem definidas. O objetivo de contar com 25% da participação de mulheres em cargos de liderança até 2025 já bateu nos 24,3%. Para a mesma data é prevista uma fatia de 30% para pessoas negras na totalidade da empresa (20,9% hoje). Há uma intenção de ser mais inclusiva em relação às pessoas LGBT+, e persegue-se uma diversidade etária nas contratações, além de investimentos em acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência. “Todas essas metas são traduzidas em benefícios para a empresa e para a sociedade”, afirma o presidente. “Não é moda; é uma visão de longo prazo.”
Schalka responde a algumas previsões negativas para o mercado de papel e celulose. Elas partem do argumento de que as atividades de escrever e imprimir estão em baixa. “Estatisticamente, isso não é verdade”, diz. “Ademais, esse ramo é apenas um submercado da totalidade de produtos do setor.” Ele menciona outros em expansão em todo o mundo, devido a fatores demográficos, entre eles o submercado de tissues, com crescimento de 4% ao ano na empresa. “Nesse aspecto, dada a competitividade e a replicabilidade, a Suzano está muito bem posicionada.”
Com o eucalipto, a empresa se especializou em fibra curta de celulose - a fibra longa tem origem no pinus -, num processo tecnológico com cerca de 60 anos, para espanto dos especialistas. Baseado nessa ousadia, Schalka vê um futuro múltiplo, com a inclusão de uma ampla variedade de produtos além dos atuais. Ele vislumbra a conquista de um naco do mercado de tecidos, por exemplo. Com o reinvestimento quase total do resultado operacional de caixa, segundo Schalka, a Suzano segue rigorosamente a estratégia definida. “É isso que faz a companhia ter robustez de um lado e, de outro, ter empreendedorismo.”