Rumos 2024
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Por — De São Paulo


 — Foto: Nelson Provazi
— Foto: Nelson Provazi

Com surpresas positivas no crescimento econômico, na queda da inflação, nas contas externas e na execução orçamentária mais imediata, o presidente Lula avança no segundo ano de seu terceiro mandato com o desafio de derrubar os juros de longo prazo e dissipar dúvidas sobre a direção da política econômica para convencer o setor privado a retomar os investimentos.

Confiança e custo de capital baixo são fundamentais para ampliar os investimentos na transição energética e na economia sustentável, áreas em que o Brasil tem vantagens comparativas, de acordo com a visão predominante nos debates do evento Rumos 2024, promovido no dia 8 pelo Valor, no hotel Rosewood, em São Paulo.

“Estamos num cenário de crescimento robusto, de inflação controlada, que nos permite, olhando para o ambiente externo e respeitada a autonomia do Banco Central, esperar que a trajetória do juro siga caindo até o fim do ano”, disse o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, no evento. “Não estamos deixando de dar mostras de que vamos perseguir uma recomposição fiscal a todo custo.”

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Segundo ele, o governo trabalha com uma agenda dupla de desenvolvimento: consolidação fiscal e ecológica. “Para que o país cresça com desenvolvimento social e ambiental, precisamos das duas agendas.”

Em paralelo, segue o desafio de, em período eleitoral, avançar com a agenda de reformas econômicas no Executivo e no Congresso, para garantir que os ganhos de produtividade de 2023, que foram muito concentrados no setor agrícola, espalhem-se para outros setores.

“O Brasil não vai conseguir crescer de forma sustentável sem atacar o problema da produtividade”, disse Marcos Barbosa Pinto, secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda. Ele citou iniciativas aprovadas no Congresso para reduzir o spread bancário, como o marco de garantias, e editadas pelo governo para melhorar a educação e a produtividade do trabalho, como o programa Pé-de-Meia, que faz uma poupança para os jovens não abandonarem o ensino médio.

Nos últimos meses, o mercado financeiro aumentou de 1,2% para 1,9% a projeção para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 2024, mas a economia chega ao limite, também de 1,9%, que os analistas acreditam que possa crescer sem gerar desequilíbrios, tecnicamente conhecido como PIB potencial.

A chefe de pesquisa econômica para a America Latina do J.P. Morgan, Cassiana Fernandes, estima essa taxa em 1,5%, apesar das reformas econômicas aprovadas desde o governo Temer. “Para ter crescimento sustentável acima de 2% com a mudança demográfica que a gente teve, preciso esperar mais dados” que comprovem que a tendência realmente mudou, disse.

No curto prazo, a situação tem surpreendido favoravelmente, com queda da inflação a 3,93% no período de 12 meses até março. O retorno aos níveis inferiores a 4% ocorre, desta vez, sem os truques de cortes de impostos sobre energia feitos pelo governo Bolsonaro na pandemia, que deram alívio apenas temporário. Resta, porém, o desafio de levá-la à meta de 3%, num ambiente de expectativas de inflação desancoradas e de muitas dúvidas se o novo chefe do Banco Central que Lula deve indicar terá a mesma perseverança para persegui-la.

O saldo da balança comercial mudou de patamar e caminha para um superávit de R$ 80 bilhões em 2024, graças ao bom desempenho da agricultura e aos crescentes recordes na produção e na exportações de petróleo. A volatilidade da cotação do dólar está nos seus menores níveis em muitos anos, mas pode ser afetada pelo atraso no início dos cortes de juros nos Estados Unidos pelo Federal Reserve (Fed).

Puxada pela atividade econômica mais forte, a arrecadação de impostos segue surpreendendo neste início de ano. Não foi necessário o gigantesco contingenciamento de gastos que muitos analistas temiam para março, que poderia desencadear uma crise caso fosse barrado pelo presidente Lula. O problema não foi resolvido: a trajetória prevista de superávits primários dos próximos anos está sob risco permanente de mudança, e os especialistas ainda não veem um horizonte para a queda da dívida bruta do governo geral.

A combinação de riscos externos, fiscais e monetários colocam forte pressão na curva de juros futuros, com as taxas reais de longo prazo próximas a 6% ao ano. Junto com as incertezas criadas pelo ambiente internacional e pelo próprio governo, com ataques ao Banco Central e interferência em empresas públicas e privadas, esse cenário vem retardando investimentos na economia, que caíram 3% em 2023 e devem se expandir em 1,5% neste ano, segundo previsões do boletim Focus.

“Se tivermos condições de reduzir o custo de financiamento, abre-se espaço para o setor privado”, disse a economista-chefe do Banco Santander e ex-secretária-executiva da Fazenda, Ana Paula Vescovi. “Temos que abrir espaço e dar os incentivos corretos para a iniciativa privada.” Vescovi também estima o PIB potencial em 1,5%, mas diz que a reforma tributária poderá puxar esse número para cerca de 1,8%.

O diretor de Programa da Secretária Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Daniel Loria, adiantou a intenção de enviar dois textos complementares para regulamentar a emenda constitucional aprovada no ano passado. “Estamos empenhados numa construção coletiva da regulamentação para que chegue ao Congresso um projeto único, alinhado.”

O relator da proposta no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), disse que a reforma sobre consumo “é uma prioridade nacional” para o Congresso este ano. “A tramitação tanto na Câmara quanto no Senado terá um complicador que são as eleições municipais”, reconheceu.

O cenário nos permite esperar que a trajetória do juro siga caindo”
— Dario Durigan

A ex-secretária da Fazenda de Goiás, Cristiane Schmidt, disse que a reforma tributária é a “grande reforma”, mas que o Brasil precisa também de uma reforma administrativa e, talvez, uma nova reforma previdenciária. “Se queremos, como sociedade, diminuir a desigualdade, precisamos de fato fazer o ajuste fiscal, porque sem dinheiro no caixa ninguém faz nada.”

Um dos pontos que vem preocupando o setor privado é a repetição de iniciativas que já deram errado no passado, como a reedição da velha política industrial e uso das estatais para fazer investimentos com taxa de retorno duvidosa que interessam mais ao governo que às empresas.

O secretário de Monitoramento de Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, Sergio Firpo, disse que acompanhamento constante será fundamental, incluindo investimentos públicos. “É preciso garantir que as políticas públicas sejam avaliadas e corrigidas em um curto período”, defendeu. “Não dá para esperar tempo demais para fazer a correção de rota.”

Rumos 2024 foi uma realização do Valor, com patrocínio master da Suzano e apoios do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

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