China envolve América Latina em 'armadilha de dinheiro', diz comandante americano

Para chefe do Comando Sul, Pequim e Moscou se aproveitam de estruturas democráticas frágeis

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São Paulo

A China está envolvendo a América Latina com uma “armadilha de dinheiro” e, em conjunto com a Rússia e outros países, faz parte de um “círculo vicioso de ameaças” que ameaça a segurança e a estabilidade da região.

As afirmações foram feitas pelo almirante Craig Faller, chefe do Comando Sul das Forças Armadas dos Estados Unidos, durante seu depoimento anual sobre a região ao Congresso americano nesta segunda (30).

“Quando o Departamento de Defesa priorizou a região do Indo-Pacífico [desde o governo de Barack Obama], Pequim virou sua atenção agressivamente para o hemisfério ocidental, exportando práticas comerciais corruptas para países que já lutavam com corrupção do governo e má gestão”, afirmou o militar.

O chefe do Comando Sul dos EUA, almirante Craig Faller, durante fala no Congresso
O chefe do Comando Sul dos EUA, almirante Craig Faller, durante fala no Congresso - Saul Loeb - 7.fev.2019/AFP

O quadro sombrio da apresentação de Faller tinha um objetivo: evitar o previsto corte de pessoal que o Pentágono está estudando para o Comando Sul, responsável pelos interesses americanos na América do Sul, Central e no Caribe.

A mesma tarefa coube ao chefe do muito mais atribulado Comando África, general Stephen Townsend, igualmente sabatinado na sessão.

Hoje com cerca de 1.200 servidores civis e militares, inclusive um general brasileiro, o órgão está na mira para fornecer recursos para a região do Pacífico —ou seja, para conter a China em seu quintal.

Para o almirante, isso é um contrassenso, dado que a presença chinesa e russa cresceu em 2019 na região.

Ele estimou em US$ 180 bilhões os investimentos diretos de Pequim em países latinos, notadamente em infraestrutura e no setor de telecomunicações, campo de uma disputa particular com Washington acerca da tecnologia 5G.

A ditadura chinesa dá “presentes significativos” para os países, tornando-os alvos da “armadilha do dinheiro”, disse.

Na região, 19 países aderiram ao plano estratégico de infraestrutura de Pequim, a Iniciativa Cinturão e Rota, e 25 das 31 nações latino-americanas sediam projetos chineses. O Brasil tem na China seu maior parceiro comercial, por exemplo.

Brasília, que já na gestão Michel Temer (MDB) havia se aproximado do comando ao aceitar o envio inédito de um general para um cargo de integração de operações, definiu o alinhamento com os EUA como prioridade estratégia sob Jair Bolsonaro.

Essa mudança política não foi citada por Faller, que no entanto só fez elogios ao país, citando o aprofundamento das relações na área militar com operações conjuntas e a concessão do status de aliado preferencial dos EUA fora do escopo da Otan (aliança militar do Ocidente).

Sem nomear o acordo para o uso da base de Alcântara (MA) pelos EUA, disse que a “cooperação espacial” com o Brasil é um exemplo de como se pode conter a influência da China na região.

Tanto o acordo como a ida do general foram alvos de críticas à esquerda no Brasil. A desconfiança latino-americana em relação aos EUA remonta à Doutrina Monroe, que no século 19 priorizava a região, com a visão de quintal explicitada no começo do século 20 —isso para não falar ao longo apoio a golpes.

Faller fez uma análise nada elogiosa ao ambiente político. “Devido aos altos níveis de insegurança e frustração com a corrupção dos governos, o apoio à democracia na região está no pior nível em 15 anos, permitindo que atores estatais malignos aumentem sua influência.

Alguns países estão experimentando retrocessos, outros indo direto ao autoritarismo”, disse, dando como exemplos pontuais a Venezuela e a Nicarágua.

Já sobre a Rússia, a acusação do Comando Sul é mais ao estilo Guerra Fria. Ele citou a presença de navios avançados russos em portos venezuelanos ao longo de 2019, ano em que ficou aguda a crise do governo do ditador Nicolás Maduro, inimigo declarado dos EUA.

Faller reuniu diversas acusações que já fizera ao longo do ano passado acerca da presença de elementos radicais do Hizbullah libanês e da Al Qaeda na região, citando a colaboração com o Brasil na busca e identificação de um suspeito de pertencer à rede terrorista fundada por Osama bin Laden.

Ele também citou a influência do Irã, país com quem os EUA quase travaram uma guerra no começo de janeiro, junto a Maduro.

“Esses atores estatais malignos são parte de um círculo vicioso de ameaças que deliberadamente erode a estabilidade e a segurança da região”, disse.

O comandante completou afirmando que “questões sistêmicas de democracias jovens, usualmente com governança fraca e arcabouços legais porosos” são aproveitadas por países, organizações criminosas e grupos terroristas.

Tudo isso, disse, “impacta negativamente” os interesses americanos. O Comando Sul, disse, perdeu 25% de seu pessoal e 10% de sua verba de exercícios nos últimos cinco anos.

Há dez comandos americanos no mundo, seis deles dedicados a áreas específicas de atuação e quatro, ao apoio aos outros.

Tanto Townsend como Faller foram questionados se as regiões sob seus comandos estão prontas para lidar com a epidemia do coronavírus.

O general foi pessimista em relação à África, e o almirante focou a Venezuela, dizendo-se "extremamente preocupado" com a degradação dos serviços de saúde do país.

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