Ao contrário do que muitas pessoas costumam fazer, a ingestão de café não deve ser feita com a bebida excessivamente quente, embora não haja uma temperatura considerada ideal.
Além da razão mais óbvia, que é a possibilidade de queimar a língua, há um motivo sensorial: a temperatura muito elevada impede que as papilas gustativas consigam efetivamente captar os sabores da bebida.
É claro que, para preparar o café, é preciso utilizar água bem quente, perto dos 100ºC –com exceção do cold brew, método de preparo por meio de extração a frio.
Mas, uma vez preparada, recomenda-se esperar um pouco antes de começar a beber.
Segundo a cientista de alimentos e avaliadora profissional de café Verônia Belchior, a degustação técnica nem é feita em temperaturas acima dos 80ºC, pois há risco de queimadura e o paladar só começa a perceber melhor os atributos da bebida a partir dos 70ºC.
"Quando o café está muito quente, a gente não percebe muito a acidez, nem textura, corpo ou sensação tátil", diz Belchior.
Mas não há uma temperatura considerada ideal. O que há é uma diferença nos sabores que o café revela à medida que esfria.
Em degustações profissionais, o protocolo determina que o café seja experimentado em três instantes diferentes:
Primeiramente, por volta dos 70ºC. Neste momento, os avaliadores conseguem perceber muito os aromas da bebida, mas, como ainda está bastante quente, muitos sabores passam despercebidos.
Depois, bebe-se em aproximadamente 50ºC, temperatura na qual já é possível perceber melhor as principais notas sensoriais, além da acidez e do corpo.
E, finalmente, experimenta-se novamente quase em temperatura ambiente, na casa dos 30ºC –aqui, a bebida pode revelar ainda mais sabores que estavam mascarados pelo excesso de calor.
Do mesmo modo que revela suas qualidades, o café também exibe mais seus defeitos à medida que esfria. "Se há problemas como amargor e adstringência, isso fica mais evidente quando a bebida não está tão quente", diz Belchior.
Segundo Boram Um, brasileiro eleito o melhor barista do mundo em 2023, quanto mais elevada a temperatura, mais ela inibe a percepção sensorial. Assim, diz Boram, o hábito que muitas pessoas cultivam de tomar café extremamente quente ocorre justamente por ser uma maneira de não perceber a baixa qualidade do grão.
Em cafeterias muito especializadas, é comum que a bebida não seja servida em temperaturas escaldantes.
Na cafeteria do norueguês Tim Wendelboe, considerada uma das melhores do mundo, o café chega à mesa com a sugestão de que se experimente aos poucos, à medida que ele esfria.
De fato, cafés de altíssima qualidade, como os que são servidos por Wendelboe, revelam notas sensoriais muito diferentes quanto alcançam temperaturas mais amenas.
"Pessoalmente, eu gosto de tomar café em diferentes temperaturas. Ele muda de sabor à medida que esfria e assim você tem diferentes experiências na mesma xícara", diz Wendelboe ao Café na Prensa.
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