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Aula de basquete, oportunidade brasileira, mudanças nos Suns, reação dos Kings: o que rolou e no que ficar de olho na NBA

Beal melhor nos Suns, Cavs superando Thunder, cravada de White em Bemby, Sabonis recordista e Gui Santos roubando a cena nos Warriors Arte ESPN com Getty Images

Às vezes a gente fica esperando ansiosamente por alguma coisa e depois acaba se decepcionando, ao se dar conta de que a realidade não ficou à altura de tudo o que se imaginou antes do evento em questão. Quem nunca passou por isso, não é mesmo? Mas há casos também em que a sorte nos sorri e nos permite viver uma experiência tão legal quanto tudo o que nossa cabeça foi capaz de fantasiar. Ou até mais.

O fã de NBA que o diga.

A história da última semana

Não é difícil entender por que havia tanta expectativa em torno da visita do Oklahoma City Thunder ao Cleveland Cavaliers na última quarta-feira (8). Além de serem líderes em suas respectivas conferências, os dois times carregavam invencibilidades impressionantes. O Thunder chegou ao duelo com 15 vitórias consecutivas. Os Cavs, 10. Corríamos o risco de ver uma partida modorrenta, incapaz de empolgar quem estivesse assistindo, seja lá por qual motivo? É claro. Mas demos sorte. O que se viu no fim das contas foi um grande espetáculo. Nível altíssimo. Uma aula de basquete.

Foram 30 mudanças de liderança ao longo da noite, com placar apertado e indefinido até o fim, o que manteve o nível de entretenimento para o grande público lá em cima. Para aqueles fãs de basquete que gostam de se atentar um pouco mais às nuances táticas de uma partida, as incontáveis variações de defesa e de estratégias ofensivas dos dois lados foram um prato cheio.

Donovan Mitchell deu uma amassada no aro, errou 13 dos 16 arremessos que tentou. Fez só 11 pontos, mas não significa que foi um peso morto para os Cavs. Pelo contrário. Cumpriu, como sempre faz, o papel de motor do sistema ofensivo da equipe. Iniciou jogadas, criou espaços a partir dos dribles e envolveu os companheiros. Ele tem uma habilidade interessante de infiltrar no garrafão depois de driblar pelo lado oposto ao bloqueio do "pick and roll". É um tipo de improviso que costuma bagunçar os planos de cobertura dos adversários e abre alguns buracos na marcação.

Max Strus e Ty Jerome se aproveitaram bastante desse tipo de coisa e têm muito o que agradecer. Mas seria uma injustiça falar do brilho do ataque dos Cavs sem exaltar a constante movimentação e inteligência da dupla Evan Mobley e Jarrett Allen. A ideia de os ter os dois jogando juntos causava uma certa estranheza na maioria das pessoas até pouco tempo atrás, e era totalmente natural que fosse assim. Afinal de contas, trata-se de uma formação bem diferente do que o resto da NBA vinha experimentando. Mas esse comportamento deles tem demonstrado cada vez mais que essa aposta é viável.

Allen virou um jogadorzaço. Bem mais versátil e participativo do que um mero completador de ponte área, que era o que grande parte do público e da crítica especializada viam como futuro possível para ele nos tempos de Brooklyn Nets. Demonstra muita inteligência e visão de jogo para reconhecer o que a defesa adversária está colocando como obstáculo e tirar uma solução da cartola, seja um passe para alguém aberto ou até mesmo movimentos com o corpo para se livrar da marcação e finalizar.

O jogo foi parelho, então é claro que o Thunder fez uma série de coisas boas também. Shai Gilgeous-Alexander fez 31 pontos, pegou cinco rebotes, deu quatro assistências, teve três roubos de bola e deu dois tocos. Jalen Williams somou 25 pontos, nove assistências e três roubos. Mas deu para ver um elemento na reta final que acabou pesando para o desfecho da partida: a dificuldade em se criar diante de defesa por zona dos Cavs.

Shai até tentou atacar pelo meio de uma zona 2-3 que se formou na frente dele durante o último quarto, o que em tese parece ser uma boa ideia contra esse tipo de marcação. Só que os Cavs pareciam orientados a justamente congestionar esse corredor, causando desconforto para o armador rival e o forçando a se livrar da bola antes do que gostaria, quebrando o ritmo do ataque do Thunder.

Depois que a partida acabou, foi interessante ver como alguns dos personagens reagiram. Shai foi questionado se incomodava o fato de seu time ter perdido novamente em um duelo importante, uma vez que o Thunder também foi superado na decisão da Copa NBA. Ele disse que não, rebateu lembrando que foram só duas derrotas em um mês e meio.

Pelos lados dos Cavs, Mitchell deu uma reforçada em um certo discurso de “nós contra o resto do mundo”. Falou que nem mesmo essa vitória fazia as pessoas acreditarem neles como campeões em potencial.

Vai entender quem são “as pessoas” às quais ele se refere. Mas se o elenco dos Cavs tem usado isso como motivação para construir o que tem sido visto até agora na temporada, quem é que vai contestar? Não dá para dizer que não tem funcionado.

Olha o que ele fez

Coby White anotou 23 pontos, deu quatro assistências, roubou quatro bolas e pegou dois rebotes na vitória do Chicago Bulls sobre o San Antonio Spurs, na segunda (6), pelo placar de 114 a 110. Acertou nove dos 18 arremessos que tentou, e o time anotou sete pontos a mais do que o adversário durante os 31 minutos em que o armador esteve em quadra. Mas o que o tornou um personagem importante neste duelo e um sucesso nas redes sociais foi uma jogada impressionante e decisiva na reta final.

Restavam cerca de 20 segundos quando Zach LaVine tinha a bola nas mãos e tentou infiltrar diante da marcação de Chris Paul. Àquela altura, os Bulls venciam por um ponto, depois de terem passado o jogo inteiro atrás no marcador, e uma cesta naquela posse de bola deixaria a vitória muito mais próxima.

LaVine não teve tanto sucesso em sua investida e resolveu fazer um passe para o perímetro, em uma tentativa de fazer alguém reconstruir a jogada. A bola então chegou às mãos de White, que recebeu na linha dos três pontos, fingiu um arremesso para driblar Jeremy Sochan e aproveitou o espaço que se abriu para invadir o garrafão. Assim que começou a passada da bandeja, viu Victor Wembanyama chegar para fazer a cobertura. O risco de ser rejeitado por um sujeito que é praticamente uma máquina de tocos não o intimidou. Sem demonstrar qualquer hesitação, saltou e enterrou por cima do gigante francês, que nada conseguiu fazer desta vez para evitar a cesta.

É claro que White foi questionado sobre a jogada pelos jornalistas que o entrevistaram depois da partida. Ele lembrou que havia tomado alguns dos oito tocos que Wembanyama deu no confronto e que, por isso, tinha prometido a si mesmo que partiria para a enterrada se tivesse a oportunidade de encarar o francês novamente em uma infiltração. Não para se vingar dos tocos ou qualquer bobagem do tipo motivada por vaidade, mas porque entendia que esse nível de agressividade era necessária para aumentar as chances de conseguir os dois pontos. "Se fizesse uma bandeja, tentando jogar a bola por cima dele, ele teria dado toco", afirmou.

O lance por si só já foi deslumbrante. Afinal de contas, é sempre impressionante quando se vê um jogador enterrando na cabeça de alguém muito maior, especialmente por se tratar de um protetor de aro tão implacável feito Wembanyama. Mas essa leitura do que o jogo pedia naquele cenário específico só melhora a jogada.

Abre aspas

“Nós conversamos com os jogadores antes da partida sobre quantas pequenas batalhas dentro de quadra eles podem ser capazes de vencer. O Gui ganhou um milhão de batalhas assim. E é isso o que vence jogos. Ele andou esperando por essa oportunidade ao longo de toda temporada e, quando recebeu, correspondeu. Ron Adams (assistente técnico do Golden State Warriors) fala sobre isso o tempo todo para os jogadores. Que quando você recebe uma chance, precisa aproveitá-la. E o Gui foi brilhante. Muito mais do que acertar um chute ou não, esse esporte é sobre defesa, posicionamento na disputa de rebotes, brigas por bolas perdidas. Por isso que ele foi recebido com festa pelos companheiros no vestiário depois do jogo. Os caras reconhecem que ele foi fantástico.”

A declaração foi de Steve Kerr, técnico do Golden State Warriors, elogiando o que o ala brasileiro Gui Santos fez na vitória sobre o Detroit Pistons na quinta-feira (9), por 107 a 104.

Até então, Gui não vinha participando da rotação dos Warriors em condições normais. Suas participações se davam basicamente em alguns poucos minutos finais de partidas já definidas, quando os técnicos de ambos os lados sacam os principais jogadores e ninguém mais se importa com o que acontece no jogo.

Só que os Warriors chegaram a Detroit com uma lista volumosa de desfalques, e aí surgiu uma oportunidade que acabou sendo devidamente agarrada. O brasileiro saiu do banco e atuou por 26 minutos. Significa que passou mais da metade do tempo dentro de quadra, o que é ótimo sinal. Foram 13 pontos, com quatro bolas de três certeiras em seis tentativas, além de cinco rebotes, três assistências e dois roubos de bola. Além, é claro, de todas as outras colaborações que Kerr citou e que nem sempre aparecem nas estatísticas.

No dia seguinte, foi a vez de visitar o Indiana Pacers, que atravessa ótima fase. Gui jogou por 24 minutos. Fez 11 pontos, acertando quatro das cinco finalizações que tentou, pegou três rebotes, deu três assistências e roubou duas bolas. Os Warriors foram derrotados por 108 a 96, mas anotaram nove pontos a mais do que o adversário durante o tempo que o brasileiro permaneceu em quadra. O que, obviamente, conta a favor do brasileiro na disputa por espaço na equipe.

É muito difícil imaginar o que tem se passado dentro da cabeça de Steve Kerr neste momento e tentar o futuro de Gui depois que os desfalques voltarem a jogar. Mas estar pronto e responder à altura quando uma oportunidade surge diz muita coisas boas sobre ele. O brasileiro fez tudo o que estava ao alcance e mostrou seu valor.

Uma estatística

Uma notícia que chamou bastante a atenção nos últimos dias foi a decisão de Mike Budenholzer, técnico do Phoenix Suns, de fazer duas mudanças no time titular. Um dos escolhidos para rodar foi Bradley Beal, que passou a ser substituído pelo calouro Ryan Dunn. O outro foi o pivô Jusuf Nurkic, que perdeu a vaga para Mason Plumlee.

Não tem como não encarar essa ida de Beal para o banco como uma espécie de sonho frustrado. Quando os Suns foram atrás de Beal, um “all-star”, para colocá-lo ao lado de Kevin Durant e Devin Booker, certamente não esperavam que chegariam ao ponto de que um deles precisaria virar reserva. As expectativas eram bem mais ousadas, naturalmente. Mas do jeito que as coisas estão no momento, alguma mudança precisava ser feita. Mais do que simplesmente ampararem a decisão de Budenholzer, os números mostram que ele precisava agir com urgência.

O quinteto composto pelos três astros, Nurkic e Tyus Jones, que vinha sendo a escalação titular e ainda é a formação dos Suns com mais minutos na temporada até o momento, tem um saldo negativo de 17,1 pontos a cada 100 posses de bola. É um resultado desastroso para qualquer equipe, sobretudo para uma que iniciou o campeonato ambicionando o título.

Vale dar uma mergulhada um pouco mais nisso para entender o tamanho da catástrofe que esse quinteto representa. A média de pontos anotados a cada 100 posses de bola é de apenas 103,9 pontos. Para se ter uma ideia de quanto essa marca é baixa, o Washington Wizards, último colocado no ranking de eficiência ofensiva da liga, produz 105,5 pontos a cada 100 ataques.

Na defesa, o quinteto em questão dos Suns sofre em média 120,9 pontos por 100 posses de bola dos adversários. Trata-se de um número ainda mais alto do que os 118,4 dos Wizards, que também têm a defesa menos eficiente da liga.

Talvez as entradas de Dunn e Plumlee não transformem a água dos Suns em vinho. Pode até ser que Budenholzer continue fazendo experiências na busca pelo melhor encaixe possível das peças que tem em mãos. Só não dava para continuar colocando em quadra, com o nível de talento individual que existe no elenco, uma equipe mais ineficiente que os Wizards.

Será que é para valer?

Quando o técnico Mike Brown foi demitido há algumas semanas, não era exagero imaginar que a temporada do Sacramento Kings parecia perdida. Mas não é que o time emplacou sete vitórias consecutivas sob o comando de Doug Christie e voltou a ter campanha acima dos 50% de aproveitamento, o que já é o bastante para se enfiar na disputa de pelo menos uma vaga no play-in do Oeste?

É verdade que o começo desta corrida se deu diante de oponentes desfalcados. O Dallas Mavericks estava sem Luka Doncic e Kyrie Irving, o Philadelphia 76ers não contou com Joel Embiid, e o Memphis Grizzlies não teve Ja Morant à disposição. Mas se as circunstâncias destes duelos poderiam frear qualquer tipo de otimismo, a reação continuou a se desenhar com vitórias depois sobre Golden State Warriors e Boston Celtics fora de casa.

Os atuais campeões estavam com força máxima e, nem assim, deram conta de Domantas Sabonis. O pivô lituano fez 23 pontos e quebrou o recorde de rebotes da temporada com os 28 que pegou. Números construídos punindo praticamente toda troca de marcação que a defesa dos Celtics fazia e acaba o deixando acompanhado por alguém bem mais baixo perto da cesta. Como resultado disso, o que se viu foram “pick and rolls” que a bola o encontrou com alguma facilidade, além de ações individuais de costas para a cesta e de muitos rebotes sem que alguém fosse capaz de incomodá-lo.

Vale lembrar que essa vitória sobre os Celtics em Boston aconteceu sem De’Aaron Fox. O armador estava lesionado, mas voltou no jogo seguinte, quando os Kings derrotaram o Chicago Bulls, também fora de casa. Foi o cestinha do time com 26 pontos. Sabonis fez 22, apanhou 16 rebotes e distribuiu oito assistências. O cara está voando.

De repente, os Kings não só voltaram ao bolo competitivo do Oeste como se tornaram uma equipe interessantíssima para se ficar de olho. Por se mostrarem capazes de vencer qualquer um e pela história de redenção que ensaiam escrever.

Mesmo na época da demissão de Mike Brown, havia quem defendia a tese de que eles eram melhores do que a campanha sugeria àquela altura, já que o ataque aparece entre os dez mais eficientes da liga e a defesa também está acima da média. Talvez só faltava mesmo um pouco da confiança que uma sequência invicta como essa pode proporcionar.

O que vai ter na tela da ESPN

Quarta-feira (15):

New York Knicks x Philadelphia 76ers - 21h30

Por que assistir: o Knicks tem o terceiro ataque mais eficiente da liga. Quando Jalen Brunson e Karl-Anthony Towns estão em quadra, há sempre a chance de algo especial acontecer. Com relação aos Sixers, fica a expectativa para saber se vão contar com força máxima. Se tiverem as principais estrelas, podem fazer jogo duro e continuar alimentando o sonho de darem uma guinada na temporada.

Miami Heat x Los Angeles Lakers - 0h

Por que assistir: no último encontro, em Miami, o Heat atropelou. A coisa foi tão feia que rendeu até uma reclamação pública de JJ Redick, técnico dos Lakers. É claro que a crise acabou passando e o time de Los Angeles fez algumas boas apresentações ao longo das semanas seguintes. Mas ainda que muita coisa tenha mudado desde então, será curioso observar como será a resposta dos Lakers diante do adversário que proporcionou um dos seus momentos mais embaraçosos na temporada até agora.

Sexta-feira (17):

Orlando Magic x Boston Celtics - 21h

Por que assistir: depois de alguns meses machucado, Paolo Banchero voltou ao Magic na última sexta-feira. Não conseguiu evitar a derrota para o Milwaukee Bucks, mas teve grande atuação. Anotou 34 pontos, com direito a cinco arremesos de três em oito tentativas, pegou sete rebotes, deu três assistências e roubou duas bolas. Foi um retorno promissor de um jovem que tinha sido “all-star” na temporada passada a uma equipe que vinha, sabe-se lá como, conseguido segurar bem as pontas sem ele. Será curioso acompanhar este Magic reforçado contra os atuais campeões. Vale lembrar que os dois times chegaram a se enfrentar pouco antes do Natal, também em Boston, e o time de Orlando saiu-se vitorioso, apesar de todos os desfalques que tinha. É uma recordação que dá um tempero a mais para este duelo.

Memphis Grizzlies x San Antonio Spurs - 23h30

Por que assistir: os Grizzlies lutam no topo da Conferência Oeste e têm um ataque muito interessante de se observar. Não só porque é o quinto mais eficiente da liga, mas também pela maneira como constroem suas jogadas, com menos bloqueios e intensas movimentações sem bola. O fato de que fazem isso tudo com uma rotatividade notável de peças os tornam uma equipe ainda mais curiosa de se observar. Já os Spurs andaram sofrendo umas derrotas em sequência e precisam reagir se quiserem continuar bem posicionados na briga por play-in.