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Por — De São Paulo


Rodrigo Agostinho: “Não me sinto pressionado. É natural que em um país republicano grandes empreendimentos sejam debatidos na sociedade” — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo
Rodrigo Agostinho: “Não me sinto pressionado. É natural que em um país republicano grandes empreendimentos sejam debatidos na sociedade” — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo

O biólogo e advogado Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama, diz que apenas neste ano foram emitidas 26 licenças e autorizações ao setor de petróleo e gás, a maioria para a Petrobras, inclusive de pesquisas sísmicas na Margem Equatorial. O órgão ambiental está licenciando o pré-sal fase 3 e o pré-sal fase 4 - ou seja, mais de 2.000 poços de petróleo e gás. “A Petrobras é a principal cliente do Ibama no licenciamento. Ela é uma empreendedora hoje no Brasil com o maior número de licenças, tanto vigentes quanto novas.”

O Ibama está sob intensa pressão desde que indeferiu o pedido da Petrobras de perfurar o bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, nome dado pela Agência Nacional de Petróleo a uma das cinco regiões da Margem Equatorial, a nova fronteira de exploração da Petrobras. O poço seria para pesquisar se há petróleo ou não -de exploração, no jargão do setor. “É um poço de exploração, mas com características iguais às de um poço de produção. É uma perfuração no subsolo. E assim, em um eventual acidente, tanto no caso de pesquisa quanto de produção, as medidas de precaução são muito parecidas”, explica Agostinho.

A Petrobras, diz, tinha montado uma estrutura de emergência “muito boa”, mas a 800 quilômetros de distância. “É uma região pouco desbravada, com altíssima biodiversidade, muita pesca artesanal e industrial. E é uma região com pouca estrutura física para o atendimento de um eventual acidente.” O Ibama, defende, dará uma decisão técnica à polêmica.

Agostinho reforça que o órgão “não discute a transição energética do país” e que as equipes do Ibama e da Petrobras têm dialogado para resolver o impasse. Refuta a especulação que a decisão está tomada e diz que não se sente pressionado. “É natural que em um país republicano grandes empreendimentos sejam debatidos na sociedade.” A seguir trechos da entrevista que concedeu ao Valor:

Valor: Há muita confusão sobre Margem Equatorial e foz do Amazonas. O senhor pode explicar?

Rodrigo Agostinho: A Margem Equatorial é a costa brasileira situada mais ou menos na latitude zero, que é a linha do Equador. Vai do norte do Rio Grande do Norte ao Amapá. Naquela região, no passado, houve muitas tentativas de se encontrar petróleo. Ali na costa do Pará e na região da foz foram mais de cem tentativas, em uma área mais próxima da costa e em anos em que não existia toda a preocupação ambiental que existe hoje. Na Margem Equatorial existem poços perfurados no Ceará, com plataformas, em que, por alguma decisão técnica da Petrobras, esses poços não estão produzindo.

Em 2023 a Petrobras conseguiu licenças para procurar petróleo, para exploração, no Rio Grande do Norte, também na Margem Equatorial. Ou seja, naquela região também foram emitidas autorizações. A Petrobras está pedindo para perfurar novos poços, então não sei se a empresa conseguiu encontrar petróleo na quantidade que gostaria. Pediu novas licenças nessa mesma região, no Rio Grande do Norte, para postos de pesquisa, os chamados poços de exploração.

Valor: E a foz do Amazonas?

Agostinho: Trata-se de um trecho da Margem Equatorial que inclui a foz do Amazonas, mas é uma região mais ampla e que, mesmo distante, está sob influência da foz do maior rio do mundo, um volume gigantesco de água doce.

A Margem Equatorial foi dividida em cinco grandes regiões - a primeira bacia é a Potiguar (no Rio Grande do Norte), depois vêm a Ceará (no Piauí e Ceará), a Barreirinhas (no Maranhão), a Pará-Maranhão e a Foz do Amazonas (Amapá e Pará).

Valor: Quantas licenças o Ibama já concedeu neste ano, e para a Margem Equatorial?

Agostinho: Apenas neste ano foram emitidas 26 licenças e autorizações ao setor de petróleo e gás (entre atividade de perfuração marítima, exploração e produção, pesquisa sísmica e outras).

Há dez anos atrás ocorreu um caso muito emblemático. A Petrobras tentou perfurar um poço nessa região e, com a força das correntes marinhas, o navio sonda se deslocou, quebrou a broca de perfuração e poderia ter se transformado em um grande desastre. A Petrobras demorou dias para recuperar essa sonda. Foi um incidente que, na época, assustou muito as equipes que trabalhavam no setor de emergências. Foi na região da Foz do Amazonas.

Hoje a Petrobras conhece e domina a perfuração em águas profundas, então a busca por petróleo naquela região, que era em águas rasas, está hoje mais distante da costa. Ali se está a cerca de 100 quilômetros do Oiapoque e 800 quilômetros de Belém.

Valor: Toda essa pressão é por causa de uma licença negada? A de maio de 2023, quando o Ibama indeferiu o pedido da Petrobras de perfurar o bloco FZA-M-59?

Agostinho: É o primeiro poço de um bloco. Naquela região existem muitos outros pedidos, porque foram feitos leilões. Existem blocos privados, existem blocos da Petrobras.

No caso, trata-se de um poço de exploração, mas com características iguais às de um poço de produção. É uma perfuração no subsolo. E assim, em um eventual acidente, tanto no caso de pesquisa quanto de produção, as medidas de precaução acabam sendo muito parecidas.

É uma região pouco desbravada, com altíssima biodiversidade, muita pesca artesanal e industrial. Também vem sendo procurada por grandes empresas para instalação de complexos eólicos. E é uma região com pouca estrutura física para o atendimento de um eventual acidente.

A estrutura que a Petrobras colocou na época à disposição está em Belém, a 800 quilômetros de distância. Este foi um dos pontos que o Ibama considerou que não havia condições de segurança naquele local para conceder a licença. A estrutura para atendimento à fauna que pode ser afetada em eventual acidente foi um dos motivos técnicos. As pessoas acham que o Ibama está querendo influenciar na transição.

Valor: Não está?

Agostinho: Não. Esse não é o papel do Ibama. Não é o Ibama que vai dizer quando o Brasil vai parar de investir em um setor ou no outro. O Ibama vai apenas analisar a segurança e as questões ambientais de cada empreendimento.

De maneira clara: o Ibama não está sendo o empecilho na exploração de petróleo”

Valor: Em que ponto se está agora, no processo de licenciamento do poço da foz do Amazonas?

Agostinho: A Petrobras, na ocasião, pediu logo em seguida uma reconsideração. A empresa apresentou a possibilidade, nessa reconsideração, de colocar mais lanchas e embarcações para uma situação de risco. Ao longo desse período, comunidades indígenas daquela região procuraram a Funai, que solicitou informações à Petrobras. Isso consta do processo.

A equipe continua analisando todas essas questões. As equipes da Petrobras e as equipes técnicas do Ibama continuam dialogando. A gente diz que a Petrobras é a principal cliente do Ibama no licenciamento. De fato, a Petrobras é uma empreendedora hoje no Brasil com o maior número de licenças, tanto licenças vigentes quanto licenças novas. Estamos licenciando o pré-sal fase 3 e o pré-sal fase 4. Estamos falando de mais de 2.000 poços de petróleo. A Petrobras tem investimentos em várias regiões do país.

Valor: Mais de 2.000 licenças para exploração de petróleo e gás?

Agostinho: São mais de 2.000 poços de petróleo. Acabamos de emitir a licença prévia da fase 3 do pré-sal. As licenças, no caso do pré-sal, são licenças guarda-chuva. Compreendem a possibilidade de até 2.000 perfurações. Então de maneira muito clara: isso mostra que o Ibama não está sendo o empecilho. Na semana passada saiu uma licença importante do projeto Pau Brasil, da BP, na costa da região Sudeste. É gigantesco.

Valor: É nessa medida que a Petrobras é a maior cliente do Ibama?

Agostinho: Estamos licenciando mais de cem projetos para a Petrobras. Apesar de todos os ruídos que existem hoje, as equipes dialogam o tempo todo. Não tem nenhum projeto da Petrobras que não passe pelo Ibama. Todos os projetos offshore passam pelo Ibama. Estamos inclusive licenciando os projetos de energia limpa da Petrobras agora. Existem vários projetos protocolados no Ibama no ano passado que estão em análise hoje pelas equipes técnicas. O setor de petróleo também vem mudando seus investimentos.

Valor: Em que sentido?

Agostinho: O Ibama está licenciando agora 60 projetos de descomissionamento no mar. Trata-se de desmontar estruturas antigas em áreas que não produzem mais, para se investir em outras.

Valor: Do jeito em que a coisa está posta pelo lobby do setor de petróleo, a negação da licença na foz do Amazonas para a Petrobras parece um capricho do Ibama.

Agostinho: Não vejo dessa forma. A equipe é muito técnica, extremamente dedicada e muito reduzida. Estamos falando hoje de 3.800 empreendimentos no Brasil em licenciamento no Ibama para uma equipe de 200 servidores. São 200 servidores no Brasil olhando para todos os empreendimentos de portos, aeroportos, linhas de transmissão, termelétricas, estradas, o PAC inteiro.

A região da foz do Amazonas é de fato muito sensível, existem poucas informações sobre as correntes marinhas, é uma região pouco estudada pela ciência. Concentra 70% dos manguezais do país. Tem muitos atributos ambientais, muitas comunidades tradicionais, tem povos indígenas. É uma região complexa por si só independentemente da questão do setor que tem interesse em descobrir se de fato existe petróleo ali, sua quantidade e sua qualidade. O Ibama avalia a viabilidade ambiental disso. Se ficar comprovado que, de fato, aquela região tem a estrutura necessária para que essa produção aconteça, as licenças acabam sendo emitidas. Não é decisão política. Tenho dito desde o começo que é decisão técnica.

Valor: A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, quer levar a exploração do petróleo da foz do Amazonas para o Conselho Nacional de Política Energética. O CNPE é presidido pelo ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, um entusiasta do petróleo. Mas, pela lei, quem decide sobre licenciamento ambiental federal é o Ibama, não?

Agostinho: De fato, pela lei complementar 140 de 2011, a atribuição de licenciamento nesse caso é do Ibama. Isso não quer dizer que discussões sobre a matriz energética brasileira não possam acontecer dentro do Conselho Nacional de Política Energética. Isso não quer dizer que a gente não possa ter um debate lá. Não tem problema nenhum. Debate e discussão são importantes para o país.

Valor: Pessoas que não se identificam fazem lobby na imprensa dizendo que a decisão já está tomada. O senhor se sente pressionado?

Agostinho: Não está tomada. É prioridade da equipe, mas não está tomada. Tenho expectativa que se resolva logo, mas é uma decisão técnica, não política. Neste ano já emitimos várias licenças, quase todas para a Petrobras, até de pesquisa sísmica na Margem Equatorial. Não me sinto pressionado. É natural que em um país republicano grandes empreendimentos sejam debatidos na sociedade.

Valor: Ficando no mesmo assunto, de clima, petróleo e desafios, mas mudando de bioma: qual é a situação do Pantanal?

Agostinho: O bioma mais afetado hoje, dos seis brasileiros, sem sombra de dúvida, é o Pantanal. É a planície inundável mais rica em biodiversidade do mundo, só que faz dois anos que não enche de água. Está extremamente suscetível, o ar quente do El Niño desidratou o Pantanal. O período em que tínhamos fogo no bioma antecipou quatro meses, hoje temos 15 grandes incêndios ali. O governo federal criou uma sala de situação para a Amazônia, tentando antecipar o atendimento aos ribeirinhos, e combater o fogo no Pantanal. É a primeira vez que temos fogo no bioma no primeiro semestre.

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