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Senador abastece carros da família com verba pública; gasto por mês daria para cruzar 4 vezes o país

OUTRO LADO: Giordano (MDB-SP) diz que despesas são legais e que usa veículos particulares para economizar

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São Paulo

O senador Alexandre Luiz Giordano (MDB) manteve perfil discreto desde que assumiu o cargo por ser suplente de Major Olímpio (do antigo PSL), que morreu em 2021 durante a pandemia vítima de Covid-19.

Ele tem chamado a atenção no meio político, porém, pela prestação de contas com combustíveis e seu périplo por restaurantes caros de São Paulo.

Levantamento da Folha mostra gastos de mais de R$ 336 mil com combustíveis —que abasteceram carros de Giordano, de seu filho e também de uma empresa da família.

Com os preços atuais nos postos, esse montante seria suficiente para dar 17 voltas na Terra. A média mensal de gastos com esse item, de cerca de R$ 9.000, possibilitaria cruzar o Brasil, em uma linha reta do Oiapoque (AP) ao Chuí (RS), quatro vezes por mês. O site Metrópoles também tratou do tema em reportagem recente.

O senador Alexandre Luiz Giordano (MDB-SP)
O senador Alexandre Luiz Giordano (MDB-SP) - Iara Morselli/Divulgação Esfera

O senador diz não haver irregularidade nos gastos e que não utiliza toda a verba disponibilizada. Ele ainda justifica o uso de veículos particulares para economia e afirma que o STF (Supremo Tribunal Federal) já arquivou questionamento sobre gasto de combustível.

A apuração, porém, não esmiuçava todos os detalhes dos gastos do senador ao longo de três anos.

Os dados no site do Senado apresentam limitações por misturar despesas com locomoção, hospedagem, combustível e alimentação –uma minoria de senadores traz um detalhamento ampliado, o que não ocorre nos dados relativos a Giordano.

Nessa categoria mais ampla, Giordano tem o sexto maior gasto desde que assumiu, com um total de R$ 515 mil. A reportagem localizou R$ 336 mil em despesas exclusivamente com postos de gasolina por meio da análise do nome dos estabelecimentos, que é de longe o maior entre senadores por São Paulo.

Pelo mesmo recorte, o senador Astronauta Marcos Pontes (PL), por exemplo, gastou por volta de R$ 10 mil em postos de gasolina e centros automotivos nos últimos três anos. Já Mara Gabrilli (PSD) gastou R$ 26 mil.

No caso de Giordano, a maioria das notas está concentrada no Auto Posto Mirante (R$ 183 mil), zona norte da capital paulista, região do escritório político e empresas da família do senador.

A reportagem localizou recibos com placas de veículos em nome do filho do senador, Lucca Giordano, de empresa da família e do próprio parlamentar —as notas citam o senador como cliente. A maioria dos comprovantes, porém, não especifica o carro abastecido.

Outro posto, o Irmãos Miguel, consta de reembolsos que somam por volta de R$ 122 mil. O estabelecimento fica na cidade de Morungaba, de menos de 14 mil habitantes, no interior de São Paulo.

O lugar abriga o Hotel Fazenda São Silvano, do qual Giordano é dono. O senador não detalhou por qual motivo concentra tamanho gasto em combustível na cidade.

A Folha também encontrou gastos em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo.

Todas registradas em finais de semana, quatro notas totalizam gastos de R$ 1.200 no Auto Posto Ipiranguinha, que fica na rodovia Oswaldo Cruz –a reportagem localizou ação judicial do ano passado que cita um imóvel do filho de Giordano, Lucca, em condomínio a cerca de 2 km do local.

Em um dos domingos em Ubatuba, em janeiro de 2023, também foi registrado um gasto R$ 255 com um pedido de um abadejo para dois.

Na época desse gasto, o Senado estava em recesso. A reportagem encontrou diversos gastos com refeições aos finais de semana, mesmo durante a pausa do Legislativo.

As despesas do senador com alimentação chamam a atenção pela predileção por restaurantes caros, conforme foi revelado pelo Metrópoles.

Em março, há uma nota fiscal de R$ 681 da churrascaria Varanda Grill, na região da Faria Lima, que incluiu dois carrés de cordeiro por R$ 194 cada. Em 2022, o ressarcimento foi de R$ 810 na churrascaria Rodeio, em Cerqueira Cesar, com direito a uma picanha para dois no valor de R$ 385.

A lista traz locais como Fogo de Chão, Outback, Jardim Di Napoli e Almanara.

Uma nota fiscal do restaurante Cervantes traz R$ 144 apenas em seis unidades de água, das marcas premium San Pellegrino e Panna.

Em 2018, Giordano declarou R$ 1,5 milhão em bens à Justiça Eleitoral. Desafeto de Ricardo Nunes (MDB), Giordano levou para Guilherme Boulos (PSOL) seu apoio, mas também um histórico de polêmicas na política.

O caso mais ruidoso veio à tona em 2019, quando Giordano foi personagem de uma crise política no Paraguai envolvendo a usina hidrelétrica binacional de Itaipu.

Segundo as investigações, o então suplente usou o nome da família Bolsonaro para se credenciar na negociação da compra de energia. Ele nega ter falado em nome do governo ou do clã Bolsonaro.

O senador Giordano (MDB-SP) e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) em encontro no Congresso em 2023
O senador Giordano (MDB-SP) e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) em encontro no Congresso em 2023 - Reprodução/Instagram @senadorgiordano

Senador diz que usa carros particulares para economizar

O senador Giordano afirma que os gastos já foram analisados pelo Senado, pela Procuradoria-Geral da República e pelo STF, sendo que os dois últimos arquivaram procedimento preliminar "por entenderem que não há qualquer ilegalidade nos apontamentos realizados".

O MPF havia pedido à corte que intimasse o senador após apurar gasto de R$ 3.900 em gasolina e diesel em um só dia. O arquivamento aconteceu após explicação de que esse tipo de gasto se referia a 15 dias ou mais, e não a uma única visita.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, aceitou o argumento e ressaltou que os gastos não ultrapassam o limite mensal de R$ 15 mil para esse tipo de item.

Giordano diz que cota parlamentar contempla também gastos de sua assessoria quando em atividade e afirma que "utiliza e disponibiliza para seus assessores, quando em apoio à atividade parlamentar, os veículos que possui". Ele afirmou ainda que assessores utilizam, se necessário, os próprios veículos para deslocamentos no âmbito da atividade também.

A resposta foi dada após a reportagem enviar quatro placas de veículos à assessoria de Giordano, no nome dele, do filho e de empresa da família, que constavam das notas.

Ele justifica o uso dos automóveis para "evitar a ampliação do uso da verba de gabinete com aluguéis de veículos" e que os gastos nos postos citados ocorrem por questões logísticas. "Vale ressaltar que este parlamentar não utiliza toda a verba disponibilizada, tendo mensalmente sobras acumuladas", afirma, em nota.

O senador ainda disse que atividade parlamentar não se restringe a dias úteis, "estando o parlamentar em contato constante com sua base para atender às demandas postas".

Giordano também afirmou que os gastos com alimentação ocorrem no exercício de atividades parlamentares e que as refeições mencionadas estão ligadas ao cumprimento do mandato, estando em conformidade com a lei.

Após a publicação desta reportagem, o senador Giordano enviou nota em que afirma que sua atividade se destaca como uma das mais econômicas do Senado, citando dados dos últimos anos. Ele também afirmou que é o senador paulista que menos utilizou a cota parlamentar.

A afirmação traz dados em referência aos gastos gerais da cota, e não apenas aos tratados nesta reportagem com recorte sobre combustíveis e alimentos. Ele também afirmou que as prestações de contas "estão perfeitamente de acordo com as normas vigentes".

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