Ministério Público Eleitoral cobra partidos sobre erros que inflam negros na Câmara

Ofício ocorre após Folha mostrar irregularidades nas autodeclarações raciais de parlamentares no TSE

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São Paulo

O MPE (Ministério Público Eleitoral) notificou, nesta quinta-feira (7), os diretórios de todos os partidos políticos no estado de São Paulo e cobrou esclarecimentos sobre erros nos dados raciais no registro de candidatos a deputado federal.

Na ação, o MPE solicita que as legendas retifiquem dados de parlamentares com mandato em curso e adotem medidas para evitar a inserção errada de novos dados.

A ação do órgão ocorre após reportagem da Folha revelar que registros irregulares inflam o número de negros na Câmara dos Deputados. O caso foi representado no Ministério Público Eleitoral, com base no texto do jornal, pela Uneafro Brasil.

A reportagem mostra que ao menos 38 deputados que se autodeclararam negros (como pretos ou pardos) na eleição de 2018 teriam dificuldade de passar por uma banca de heteroidentificação, como as que avaliam se uma pessoa pode se inscrever como cotista num vestibular.

Deputados Jorge Solla, Fábio Mitidieri, Luiz Lima, Mariana Carvalho e Léo de Brito confirmaram erro no registro e disseram que irão alterar - Jorge Solla no Flickr - Billy Boss/Câmara dos Deputados - Paulo Sérgio/Câmara dos Deputados - Reila Maria/Câmara dos Deputados - Gabriel Paiva /Câmara dos Deputados

Oito deles confirmaram para o jornal que são brancos e que houve erro no registro da candidatura. Os demais não se manifestaram. Parlamentares negros, como o deputado Orlando Silva (PC do B-SP), avaliam que este número é bem maior.

"Evidente que na Câmara dos Deputados não tem 124 negros", afirma. "Na minha impressão de quem convive ali todo dia, pelo menos 70% [dos deputados registrados negros] não são."

Segundo o procurador regional eleitoral Paulo Taubemblatt, que encaminhou o ofício às legendas, a medida é uma recomendação, e as consequências vão depender do que ocorrer depois.

"Eu determinei que se aguarde por 15 dias e que se notificasse o representante, mas os partidos não precisam responder. Foram cientificados e notificados quanto aos novos efeitos jurídicos da autodeclaração", diz.

Na ação desta quinta, o órgão cobra que filiados recebam orientação para preencherem adequadamente os dados relacionados à autodeclaração de cor e raça no registro realizado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Outra medida solicitada pelo Ministério Público é que os diretórios orientem sobre as possíveis consequências de eventual constatação de fraude na autodeclaração de raça e cor submetida à corte eleitoral.

Essa disparidade entre a realidade e os dados oficiais existe porque a identificação racial ocorre por autodeclaração. Muitas vezes, contudo, o candidato não cuida da papelada para se registrar; isso fica a cargo da burocracia partidária, que pode cometer erros ao preencher a ficha no TSE.

A autodeclaração também abre espaço para fraudes em ações afirmativas.

Em nota, após oficiar os partidos, o Ministério Público Eleitoral lembra que os dados relacionados a cor e raça dos candidatos terão efeitos jurídicos e econômicos relevantes a partir das eleições deste ano.

"Portanto, caso seja constatada fraude na autodeclaração de raça e cor firmada pelos candidatos ao pleito de 2022, será possível investigação relativa à eventual prática de crime de falsidade ideológica eleitoral, sem prejuízo de compreensão futura que leve ao ajuizamento de outras modalidades de ações previstas na legislação eleitoral."

A emenda constitucional 111/2021 estabelece que a partir deste ano os votos dados a candidatas mulheres ou a candidatos negros para a Câmara dos Deputados serão contados em dobro na definição dos valores do fundo partidário e do fundo eleitoral distribuídos aos partidos políticos.

A medida será válida até 2030 e leva em conta a autodeclaração dos candidatos negros (pretos e pardos).

O tamanho da fatia do fundo partidário e do fundo eleitoral não é o único problema decorrente de distorções na base do TSE. A repartição do dinheiro dentro das próprias agremiações termina afetada, já que a lei estabelece distribuição proporcional à quantidade de candidaturas de pessoas negras e brancas.

Além disso, os dados oficiais inflados afetam a percepção sobre a representatividade política de pessoas negras e atrapalham estudos sobre o tema, dando a impressão de que a correção dos desequilíbrios raciais avançou mais do que a realidade mostra.

Um desses estudos é o "Desigualdade Racial nas Eleições Brasileiras" desenvolvido pelos economistas Sergio Firpo, Michael França, Alysson Portella e Rafael Tavares, pesquisadores do Núcleo de Estudos Raciais do Insper.

De acordo com o levantamento, o percentual de negros e de mulheres entre deputados é muito menor do que seu peso na população em todos os estados.

Como eles trabalharam com os dados oficiais do TSE que contêm erros nas autodeclarações, a disparidade deve ser ainda maior.

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