O deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou neste domingo (27) que o Ministério da Saúde cortou o acesso de seu irmão, o servidor Luis Ricardo Miranda, ao sistema da pasta.
Segundo imagem publicada nas redes sociais pelo deputado, o servidor não consegue entrar no SEI (Sistema Eletrônico de Informações), canal em que tramitam os processos do órgão público.
O deputado e seu irmão levaram o presidente Jair Bolsonaro ao centro das apurações da CPI da Covid no Senado. Eles afirmam que alertaram Bolsonaro sobre supostas irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.
O mandatário teria atribuído o caso ao líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), segundo o deputado Miranda.
Procurado, o Ministério da Saúde não se manifestou sobre o bloqueio. Também não informou se será aberto processo administrativo contra Luis Ricardo.
Fora do SEI, o servidor perde o acesso a documentos relacionados à compra da Covaxin, entre outros papéis que passam pela divisão de importações da Saúde. A área é chefiada por Luis Ricardo.
A existência de denúncias de irregularidades em torno da compra da vacina indiana foi revelada pela Folha no dia 18, com a divulgação do depoimento sigiloso ao MPF (Ministério Público Federal).
Já o alerta ao presidente teria ocorrido em 20 de março, quando os irmãos foram recebidos no Palácio da Alvorada.
Nesta reunião, o servidor afirma que apresentou documentos retirados do processo de compra da vacina. Papéis deste tipo ficam registrados no sistema SEI.
O canal é acessado por servidores da Saúde. Os documentos costumam ser fornecidos também via Lei de Acesso à Informação, mas o processo de compra da Covaxin é sigiloso, sob alegação de conter papéis ainda preparatórios.
"Aos defensores de bandidos, meu irmão acaba de descobrir que bloquearam ele do sistema do Ministério da Saúde", escreveu o deputado Miranda em redes sociais.
"Vale ressaltar que ele é funcionário de carreira! Isso é ilegal, perseguição e só comprova que eles tem muito para esconder", disse.
Mais tarde, o deputado enviou à Folha vídeo que mostraria outros funcionários ainda tendo acesso ao sistema. Membros da CPI avaliam questionar o ministério sobre o bloqueio ao servidor.
O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) vai enviar representação ao Ministério Público Federal e ofício ao Ministério da Saúde questionando o suposto bloqueio de acesso do servidor.
O presidente Bolsonaro mandou a Polícia Federal investigar o deputado e o servidor, mas não explicou o que fez ao ser alertado por eles sobre as supostas irregularidades.
Segundo Miranda, ao avisar Bolsonaro das supostas irregularidades, o presidente teria prometido acionar a PF para investigar a compra, mas não há registro de inquérito aberto.
Pressionado, Bolsonaro disse no sábado (26) que a CPI não vai atingi-lo no "tapetão".
"Lamentavelmente o Supremo decidiu pela CPI e decidiu que governadores são desobrigados a comparecer. Querem apurar o quê? No tapetão não vão levar", afirmou durante visita a Santa Catarina.
Vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirma que acionará a PGR (Procuradoria-Geral da República) para que o órgão investigue o presidente Jair Bolsonaro por crime de prevaricação. Ele pretende protocolar o pedido na segunda-feira (28).
Na leitura da cúpula da CPI, as investigações, após o depoimento de sexta, entram em novo patamar devido às declarações sobre Ricardo Barros. Os parlamentares consideram que atingiram o discurso de combate à corrupção do governo Jair Bolsonaro.
Os senadores ainda avaliam que há fortes indícios de que Bolsonaro cometeu crime de prevaricação, por não ter acionado a PF. A oposição ao governo diz que a omissão do presidente mostra que ele agiu de acordo com os interesses pessoais e políticos.
O governo fechou contrato para compra de 20 milhões de doses da Covaxin em 25 de fevereiro, por R$ 1,6 bilhão, no momento em que tentava aumentar o portfólio de imunizantes e reduzir a dependência da Coronavac, que chegou a ser chamada por Bolsonaro de "vacina chinesa do João Doria".
Fabricada pela Bharat Biotech, a vacina é negociada no Brasil pela Precisa Medicamentos, empresa que tem no quadro societário a Global Gestão em Saúde S. A.
A Global responde a uma ação de improbidade por contrato de R$ 20 milhões assinado em 2017 com o Ministério da Saúde, para importação de medicamentos para doenças raras. À época, Barros era o chefe da pasta, e produtos não foram entregues.
Ricardo Miranda disse aos senadores que havia erros na documentação apresentada pela Precisa Medicamentos à Saúde.
Segundo o servidor, a invoice (fatura) exigida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para liberar a importação estava no nome da Madison, uma empresa de Singapura, ligada à Bharat, que não é citada no contrato da Covaxin.
O documento ainda citava pagamento antecipado de US$ 45 milhões pelas doses, que estariam próximas do fim da validade. Estes dados eram diferentes do que havia sido registrado no contrato do governo federal com a Precisa, disse o servidor.
O documento com supostas falhas foi levada ao presidente Bolsonaro no dia 20, segundo os depoentes. Entre 23 e 24 de março, o papel foi retificado duas vezes pela Precisa, a pedido dos técnicos do ministério, e passou a registrar que o desembolso só ocorreria após a chegada das doses.
Ricardo Miranda disse que mesmo assim não quis assinar os papeis exigidos para a importação. O documento ainda estava no nome da Madison e tinha erro no volume de doses que embarcaria ao Brasil, segundo o servidor.
Ele disse que o pedido de importação, que seria negado, só prosseguiu após o aval fiscal do contrato Regina Célia Silva Oliveira, servidora da Saúde.
O embarque das doses só foi liberado no último dia 4, sob restrições. As doses, porém, ainda não chegaram, e o governo avalia anular o contrato da Covaxin.
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