Personagem central no episódio em que a deputada estadual Isa Penna (PSOL) foi apalpada pelo colega de plenário Fernando Cury (Cidadania), o deputado Alex de Madureira (PSD) faltou à reunião do Conselho de Ética da Assembleia de São Paulo, nesta segunda-feira (1°), e não prestou depoimento.
Alex é membro do conselho, então comparece às reuniões normalmente. Além disso, havia sido apontado por Isa como um dos deputados a serem ouvidos nesta segunda para relatar o que testemunhou na sessão em dezembro, quando Cury se aproximou por trás da deputada e a tocou.
Pouco antes de se aproximar de Isa, Cury conversa com Alex ao pé do ouvido. Em seguida, Cury se dirige à deputada, e Alex tenta segurá-lo sem sucesso. O gesto de Alex pode fazer crer que a aproximação foi premeditada, mas só a revelação do teor da conversa entre ambos poderia trazer esse esclarecimento.
Alex não deu a sua versão sobre essa conversa publicamente. Já Cury afirmou ao conselho que ambos falavam sobre a demora na sessão e quais projetos seriam votados.
À Folha Alex afirmou que, se tivesse participado da sessão desta segunda e fosse questionado sobre o tema, responderia o mesmo que Cury. "Eu iria corroborar o que ele falou, porque é a verdade", disse.
Cury é alvo de um processo no Conselho de Ética, que pode recomendar desde uma advertência até sua cassação por quebra de decoro parlamentar. As punições de cassação e suspensão —hoje considerada a mais provável— precisam do aval do plenário da Assembleia.
A sessão desta segunda foi a última dedicada a oitivas. O relator do caso, Emidio de Souza (PT), entregará seu parecer na quarta-feira (3). A votação do relatório está prevista para a mesma sessão, mas pode haver pedido de vistas de outros deputados.
A acusação de Isa é investigada ainda pelo Ministério Público de São Paulo. O depoimento de Cury ao MP havia sido marcado para terça (2), mas foi adiado para o dia 17 a pedido dele.
Questionado pela Folha, Alex afirmou que faltou não porque quis, mas porque não pôde participar da sessão por causa de um evento marcado pelo governador João Doria (PSDB) no Palácio dos Bandeirantes. A sessão foi marcada na quinta (25), enquanto o evento surgiu na sexta (26), segundo o deputado.
Na manhã desta segunda, Doria reuniu a bancada evangélica da Assembleia para assinatura de um decreto que reconhece a atividade religiosa como essencial na pandemia. Alex faz parte da bancada evangélica e também compõe a base do governo Doria. Cury também integra a base governista.
Depois que as testemunhas de defesa de Cury foram ouvidas pelo conselho na última quarta (24), Isa solicitou que o colegiado também ouvisse testemunhas indicadas por ela —no caso quatro deputados, que foram convidados e não convocados a dar depoimento.
Teonílio Barba (PT) e Coronel Telhada (PP) atenderam ao chamado e participaram da sessão. Além de Alex, Gilmaci Santos (Republicanos) também se ausentou, pois estava no evento de Doria. Membro do colegiado, Wellington Moura (Republicanos) tampouco compareceu —estava no Palácio dos Bandeirantes com os demais.
Procurado pela Folha, Alex afirmou não ter sido convidado para prestar depoimento. "Eu sou membro do conselho, não sou testemunha", disse. A equipe do Conselho de Ética afirma, porém, que enviou o convite ao deputado por email.
Gilmaci, por exemplo, afirmou ter recebido o convite, mas disse que acabou escolhendo participar do evento de Doria.
Para deputados próximos a Isa, pode ter havido ação coordenada nos bastidores para esvaziar a sessão. A deputada Erica Malunguinho (PSOL), membro do conselho, lamentou a ausência dos colegas.
"Quero deixar registrada a frustração, para esse processo, da perda de dois depoimentos extremamente relevantes, do deputado Alex de Madureira e do deputado Gilmaci. [...] Notadamente, pelos vídeos, o deputado Alex de Madureira está dentro da cena, da situação, seria muito importante ouvi-lo nessa sessão. Me assusta muito um deputado tão assíduo quanto o deputado Alex logo hoje estar ausente", disse Malunguinho.
Alex afirmou à reportagem considerar que o depoimento de Cury, na semana passada, deixou o episódio claro. Na ocasião, Alex estava presente na sessão, mas não se manifestou.
Segundo Cury, a conversa com Alex não foi sobre Isa, mas sobre a sessão em andamento, que, de acordo com ele, se alongava. Por isso, afirmou Cury, ele decidiu ir ao presidente da Casa, Cauê Macris (PSDB), que conversava com Isa, para pedir que a votação não se delongasse e para questionar sobre votações de projetos de deputados.
Ainda na versão de Cury, Alex tentou segurá-lo no sentido de que não valia a pena conversar com Macris porque a sessão já se encaminhava para o fim. A versão é parecida, mas não totalmente semelhante à que o deputado Estevão Galvão (DEM), corregedor da Casa, contou no conselho com base no que ele apurou.
A Folha apurou que Emidio tem trabalhado com o entendimento de que o gesto foi premeditado, o que poderia ensejar a cassação. Mas o petista considera difícil que a cassação seja aprovada no Conselho de Ética e, por estratégia, costura, em seu relatório, uma punição de suspensão longa, para que outra tese ainda mais branda não prospere no colegiado.
Nesta segunda, em seu depoimento, Barba afirmou ter visto a cena no plenário. "Abraço só é considerado abraço quando é permitido, quando a pessoa está vendo.[...] Entendo que não houve permissão da deputada Isa Penna", disse.
Telhada, por sua vez, afirmou não ter visto o episódio por estar de costas. Por fim, os advogados de Isa e Cury fizeram suas alegações finais.
O defensor da deputada, Francisco Almeida Prado, afirmou que o que está em julgamento é um ato específico e não toda a vida de Cury. O advogado argumentou que cabe ao conselho avaliar se a aproximação, por trás, de surpresa e sem o consentimento, é um comportamento adequado no ambiente de trabalho.
Roberto Delmanto Junior, que defende Cury, voltou a dizer foi apenas um abraço, ainda que errado e inadequado, sem conotação sexual e pelo qual o deputado já se desculpou, e que não houve apalpação ou toque intencional no seio da deputada.
"Dizer que uma pessoa apalpou o seio de ou tra é de uma gravidade brutal. Agora, você dizer que uma pessoa abraçou por trás, mesmo sem o consentimento, mas tocou nas costelas e, muito de leve, muito rápido, teria tocado na base do seio, mas de resvalo, a situação é menos grave", disse.
À Folha o advogado esclareceu que jamais admitiu a hipótese do toque no seio, apenas usou as palavras de Isa ao Ministério Público, em que a deputada afirma que houve toque de leve.
O advogado pediu que o julgamento seja feito sem politização e com punição proporcional ao que chamou de "infelicidade".
"Como se não se puni-lo com gravidade absurda significaria passar a mão na cabeça dos machistas do Brasil, significaria alimentar a cultura do estupro. Isso não tem nada a ver com cultura do estupro. [...] Essa politização traz um colorido, um exagero", afirmou.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.