O voto do ministro Kassio Nunes sobre a possibilidade de reeleição da cúpula do Congresso agradou o Palácio do Planalto, mas o deixou isolado dentro do STF (Supremo Tribunal Federal).
O magistrado se posicionou a favor da reeleição de Davi Alcolumbre (DEM-AP) na presidência do Senado e contra a recondução de Rodrigo Maia (DEM-RJ) no comando da Câmara.
O tribunal se dividiu sobre a interpretação da Constituição, que é clara ao proibir a reeleição, e o primeiro indicado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para a corte foi o único a votar de maneira distinta em relação à cada Casa Legislativa.
Integrantes do Supremo avaliam que o ministro mais perdeu do que ganhou ao não se alinhar a nenhuma das duas correntes. Ao adotar uma tese de agrado ao Planalto, enfrentou desgaste com a opinião pública e não compôs com nenhuma das correntes do Supremo.
Kassio foi o único que sustentou que a autorização de recondução não deveria valer para quem já foi reeleito, o que impediria Maia de buscar mais um mandato no comando da Câmara.
Os ministros Gilmar Mendes, relator do caso, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes defenderam a possibilidade de Maia tentar a recondução, mas afirmaram que, a partir da próxima legislatura, que começa em 2023, deveria haver o limite de uma única reeleição.
O voto de Kassio correspondeu exatamente à pretensão do Palácio do Planalto, que trabalhava para derrotar o chefe da Câmara e para viabilizar a manutenção de Alcolumbre, que tem uma atuação considerada mais alinhada aos interesses de Bolsonaro.
No final, seis ministros defenderam o veto à recondução de ambos nos cargos, e quatro foram favoráveis, enquanto Kassio se posicionou para que a reeleição não valesse para quem já está no segundo mandato de presidente de uma das Casas.
Para sustentar a tese, o ministro fez um paralelo com o Executivo.
"Se o presidente da República pode ser reeleito uma única vez —corolário do princípio democrático e republicano— por simetria e dever de integridade, este mesmo limite deve ser aplicado aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal”, argumentou Kassio.
Segundo o ministro, porém, liberar mais de uma reeleição, que seria o caso de Maia, iria “muito além da mutação constitucional, por exigir imperativamente revisão direta pelo legislador constituinte derivado”.
O ministro afirmou que autorizar Maia a concorrer a um novo mandato não seria adequado.
“Admitir que os cargos das Mesas Diretoras das Casas Legislativas da eleição vindoura pudessem ser ocupados por parlamentar que já disputou mais de uma reeleição, é olvidar tais princípios constitucionais e fazer tabula rasa de toda a jurisprudência construída por esta Excelsa Corte, sem base em experiência pretérita relevante”.
Na visão de Kassio, a tese defendida pelo relator “quebraria a integridade interpretativa que legitima o direito” e mitigaria o núcleo essencial dos princípios republicano e democrático”.
Para o ministro, a emenda constitucional que autorizou o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso (PSDB) a buscar um novo mandato tornou suscetível de releitura pelo próprio Congresso a possibilidade de recondução interna.
Kassio reconheceu que a liberação da reeleição seria uma “inovação interpretativa”, mas disse que isso faria parte “de um romance em cadeia, segundo o qual é possível nova eleição subsequente para o mesmo cargo na Mesa Diretora”.
Ele argumentou que o Supremo já lançou mão da “mutação constitucional” em outros casos e comparou esse julgamento ao que liberou a união homoafetiva.
Nesse processo, disse o ministro, “o tribunal considerou irrelevante a expressão ‘o homem e a mulher’ contida no artigo 226 da Constituição Federal, diante das notórias modificações ocorridas nos costumes sociais, para admitir a união entre pessoas do mesmo sexo”.
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