O Supremo Tribunal Federal deve decidir pela redução do alcance do foro especial, disse o ministro Gilmar Mendes na manhã desta terça-feira (24). Ele participou de debate promovido pela revista Veja, em São Paulo.
"Acho que irá cair o foro, mas haverá nuances. Casos funcionalmente relevantes, referentes a crimes praticados no exercício do mandato, ficarão no STF", disse Gilmar.
A Constituição de 1988 estabeleceu que autoridades da administração pública têm tratamento diferenciado na Justiça. Casos referentes a essas pessoas são enviados para instâncias superiores. Segundo levantamento feito pela Folha, ao menos 58 mil pessoas se encontram nesta situação.
O debate deve ser retomado no STF no dia 2 de maio. Oito dos 11 ministros já votaram de forma favorável à restrição do alcance do foro para deputados e senadores. Faltam apenas três votos para a conclusão do julgamento: dos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.
Em evento cujo tema era a proliferação de notícias falsas, Gilmar disse que no Judiciário também há algumas lendas a combater. Deu como exemplo a ideia de que o foro especial e a prisão apenas após o esgotamento de recursos em todas as fases da Justiça, o chamado trânsito em julgado, contribuem para a impunidade no país.
"Dizem que o grande problema é o trânsito em julgado. Isso num país em que apenas 8% dos homicídios são esclarecidos. Deveríamos discutir mais a fundo essas questões", disse.
Em 2016, no STF, Gilmar votou favoravelmente pela execução da pena após condenação de segunda instância. O ministro mudou de posição nos últimos julgamentos na corte.
"Em 2016, dissemos que era razoável que a partir da condenação em segunda instância já possa ocorrer a prisão. Mas o que pensamos como possibilidade virou um imperativo categórico. Então deveríamos analisar de forma crítica essas questões. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra", afirmou.
"Hoje é impossível ter um trânsito em julgado no STF, por conta da repercussão geral [quando a solução de um caso serve de base para todos os demais casos de mesma natureza]. Fica-se esperando um julgamento que dificilmente corre num prazo certo. Por isso o ministro Toffoli propôs, e eu subscrevi, a tese de ida pelo menos ao STJ. Para termos assim um referencial muito mais seguro. Hoje, no Supremo, exigir o trânsito em julgado, me parece demasiado."
No STF, por exemplo, votou para conceder o habeas corpus pedido pela defesa do ex-presidente Lula.
"Se vocês quiserem encontrar um petista hoje, vão ao meu gabinete. O pessoal tem brincado que ali é o pátio dos milagres dos petistas atualmente", disse o ministro, aos risos.
Perguntado a respeito do caso do ex-presidente Lula, Gilmar avaliou que houve precipitação na prisão.
"Acho que não deveria ter havido a prisão antes do exaurimento do caso no TRF 4." Disse não concordar, porém, com a tese de que houve perseguição política contra Lula.
O ministro comentou também que os tribunais superiores podem reduzir a pena do ex-presidente. Lula foi condenado pelo TRF-4 a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.
Segundo Gilmar, em alguns casos o STF enquadrou esses dois crimes como um só, sendo a lavagem de dinheiro considerada parte da corrupção. "É preciso discutir se os dois crimes a que ele foi condenado realmente são dois crimes”, destacou.
Gilmar também voltou a criticar o que chama de "alongadas prisões provisórias" em Curitiba, pela Operação Lavo Jato.
"Usar a prisão provisória para obter delação é um problema. Se é que não transformaram a prisão provisória numa espécie de tortura."
CANDIDATURA DE LULA
No mesmo evento, o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o ministro Luiz Fux, afirmou que uma liminar do STF pode possibilitar a candidatura de Lula à Presidência.
"A lei prevê que o acesso ao judiciário é cláusula pétrea, é uma garantia fundamental de todo cidadão. Evidentemente, se o Supremo Tribunal Federal deferir uma liminar, o TSE vem abaixo dele. Se o STF emitir uma ordem, eu terei, necessariamente, que cumprir. Ou seja: existe a possibilidade."
Fux, entretanto, declarou que a Lei da Ficha Limpa é clara ao dizer que condenados em segunda instância, como Lula, são considerados inelegíveis.
"Hoje, o candidato condenado em segunda instância é considerado inelegível. Me fizeram essa pergunta recentemente. Aí eu pergunto o seguinte: o Barack Obama resolveu se tomar de amores pelo Brasil, e aí veio aqui e quer se inscrever como candidato a presidente da República. O TSE pode receber esse pedido de registro de candidatura, muito embora dentro do nosso coração palpite o desejo de ter um candidato parecido com ele? É claro que não."
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