Jornais erram por arrog�ncia e falta de curiosidade, dizem pesquisas
Deus criou a mulher, de quem tirou uma costela, e dessa costela fez o homem.
A releitura da B�blia faria sucesso entre os coletivos feministas de 2016, mas teria o mesmo destino do ano 2000, quando foi publicada: virar uma das 2.000 notas que a Folha reproduz em m�dia na se��o "Erramos" todo ano.
N�o foi a primeira heresia deste jornal, em cujos textos Jesus foi enforcado e continua sepultado, Mois�s recebeu de Deus a Tor� (em vez dos Mandamentos) e as sete pragas do Egito viraram dez.
Em 1983, come�aram a ser publicadas corre��es sistem�ticas, parte do projeto de moderniza��o concebido pela nova dire��o do jornal, o Projeto Folha.
Publicadas de in�cio nos cadernos que haviam cometido os erros, as notas foram reunidas na p�gina 3 em 1991, na reforma gr�fica que marcou os 70 anos do jornal.
De l� para c�, j� houve ratos chamados de insetos, aranhas descritas com sete patas, a Mal�sia se localizou na �frica, um beb� teve o peso estimado em 3.650 kg, e o di�metro de uma bola de futebol chegou a 70 cm.
Ao todo, corrigiram-se nestes �ltimos 25 anos cerca de 50 mil erros –e foi pouco.
Uma checagem posterior das 6.000 informa��es de uma edi��o de domingo, nos anos 1990, identificou 60 casos que exigiam retifica��o. S� 6 haviam sido reparados na se��o da p�gina 3.
Embora baixo, o �ndice de 10% supera a m�dia encontrada pelo professor Scott Maier, da Universidade de Oregon (EUA) –sua pesquisa em jornais americanos apontou que somente 2% dos erros s�o corrigidos.
Os canais para detectar informa��es erradas e corrigi-las s� cresceram nas �ltimas d�cadas: al�m da checagem interna, a Folha tornou-se o �nico grande ve�culo do pa�s a ter um profissional pago para criticar o jornal e descobrir problemas, o ombudsman.
A internet potencializou a faxina: por meio dela, por exemplo, o jornal "The New York Times" soube em 2011 de um engano cometido em 1899. O nome do personagem de um obitu�rio era Milton, e n�o Melton, avisou um sobrinho-bisneto –a corre��o foi publicada 112 anos depois.
DOIS TIPOS
Afinal, com tantos instrumentos e tantas corre��es, por que ainda erramos tanto?
Autora de um livro cujo t�tulo � a pergunta acima, a jornalista americana Kathryn Schulz apontou em entrevista ao Instituto Poynter dois tipos b�sicos de incorre��es.
Os mais simples –erros de grafia, contas malfeitas, trocas de nome– s�o em geral efeito colateral nocivo da correria das Reda��es e da falta de concentra��o. Podem ser inofensivos, quando n�o c�micos, como os desta p�gina.
O c�nsul e ditador romano J�lio C�sar (101-44 a.C.) � testemunha involunt�ria de que corre��es s�o in�cuas para prevenir reca�das: entre 1997 e 2011, foram publicados dez Erramos reafirmando que, n�o, ele jamais foi imperador.
A situa��o � mais grave quando jornalistas incorrem no que tanto Schulz quanto Maier chamam de enganos "subjetivos" –aqueles em que a informa��o pode estar tecnicamente correta, mas levar a uma conclus�o errada.
S�o esses os que mais afetam a credibilidade de um ve�culo de comunica��o, dizem os dois pesquisadores, que apontam a arrog�ncia e a falta de curiosidade como principal causa das falhas e sugerem o mesmo rem�dio se o leite est� derramado: humildade e transpar�ncia.
"A rotina jornal�stica facilita erros, mas isso n�o tira nem ameniza a responsabilidade dos jornalistas", afirmou Maier ao Poynter.
"Quem admite e corrige erros inspira confian�a", defendeu Schulz. � o princ�pio que est� por tr�s da decis�o da Folha de, num neg�cio em que a credibilidade � fundamental, emendar com visibilidade seus enganos.
Em outras palavras, diz a letra de Ataulfo Alves na can��o de 1938 que inspirou o nome da se��o da p�gina 3: "Venho ao tribunal da minha consci�ncia/ Como r�u confesso pedir clem�ncia/ O meu erro � bem humano/ � um crime que n�o evitamos/ Esse princ�pio algu�m jamais destr�i/ Errei, erramos".
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