AN�LISE
Internet inverteu l�gica econ�mica que premiava qualidade dos ve�culos
H� quase dez anos chegava ao Brasil um livro cujo t�tulo, editado por aqui em forma de pergunta, mostra-se cada vez mais atual: "Os Jornais Podem Desaparecer?".
Seu autor, o experimentado Philip Meyer, professor em�rito da Universidade da Carolina do Norte (EUA), analisa caminhos que poderiam "salvar o jornalismo na era da informa��o", como promete o subt�tulo da obra.
Baseando-se em not�vel conjunto de evid�ncias, Meyer demonstra uma correla��o entre qualidade e sucesso comercial e, embora lembre que n�o se pode identificar ao certo o que � causa e o que � consequ�ncia, aposta suas fichas na qualidade.
O racioc�nio faz sentido. Jornais melhores tendem a gozar de maior prest�gio entre seus leitores e neles exercer maior influ�ncia. Anunciantes, assim, pagar�o valores mais altos para aparecer em suas p�ginas. Com mais recursos, esses jornais ficar�o ainda melhores.
No mundo inteiro, por�m, a roda gira no sentido inverso: anunciantes pagam cada vez menos aos jornais, que cortam custos e, assim, sacrificam a qualidade.
Embora se saiba o quanto a internet contribui para essa situa��o, as solu��es ainda n�o se p�em � vista.
Quest�es relevantes sobre esse assunto foram levantadas no primeiro debate do Encontro Folha de Jornalismo, realizado nos dias 18 e 19 de fevereiro, a prop�sito do anivers�rio de 95 anos do jornal.
Como definiu S�rgio D�vila, editor-executivo da Folha e mediador da mesa, tratava-se de discutir "o dilema da grande m�dia impressa num cen�rio de abund�ncia de informa��es e forte concorr�ncia do meio digital".
Participaram Vera Brandimarte, diretora de Reda��o do jornal "Valor Econ�mico", Eug�nio Bucci, professor da ECA-USP (Escola de Comunica��es e Artes), e Le�o Serva, colunista da Folha.
IMPRENSA � VITAL
Seria muito f�cil, e ainda mais enganoso, imaginar que o dilema se restringe a quem atua no ramo da comunica��o. A sobreviv�ncia dos �rg�os de imprensa interessa ao conjunto da sociedade.
"Jornalismo � uma necessidade estrutural das democracias e das sociedades livres", sustentou Bucci. "Essa institui��o da imprensa que se enra�za fora do Estado � indispens�vel para que a democracia funcione, continue e se aperfei�oe."
O professor da ECA n�o pensa em qualquer ve�culo, mas naqueles que t�m condi��es de refletir criticamente sobre os mecanismos do poder. "O poder � sist�mico, a imprensa � vital", afirma.
Sendo assim, diz Bucci, surge um grande desafio: "Resguardar condi��es para a exist�ncia de Reda��es profissionais e de grandes dimens�es. Reda��es com bastante gente. Se isso n�o existir, estaremos sem perspectiva".
Resguardar tais condi��es, contudo, n�o � tarefa trivial. A concorr�ncia propiciada pela internet n�o se traduz apenas pela necessidade de disputar a aten��o do leitor.
Conte�dos gerados por Reda��es profissionais s�o distribu�dos graciosamente na rede, embalados na confus�o entre internet livre e gr�tis. Tudo se passa como se a produ��o de reportagens n�o envolvesse altos elevados.
Al�m disso, gigantes da internet provocam constantes revis�es de pre�os da publicidade, mais barata nos meios digitais do que nas vers�es impressas dos jornais.
DESAFIO DIGITAL
Ao comentar a situa��o do ve�culo que � dirigido por ela, Vera Brandimarte deu exemplo eloquente da dificuldade envolvida nessa equa��o.
No ano passado, o n�mero de assinaturas tradicionais do "Valor Econ�mico" caiu 7%, mas o de digitais aumentou 35%; este segundo grupo representa hoje cerca de um ter�o dos 63 mil assinantes do jornal; o total de usu�rios da p�gina do ve�culo na internet cresceu 59%, passando de 1,4 milh�o para 2,3 milh�es.
"Mesmo assim, a receita publicit�ria � de chorar", afirmou Brandimarte. � que as verbas decorrentes de an�ncios na internet ainda nem chegam a 5% da receita publicit�ria total do jornal.
O avan�o das assinaturas digitais e o recuo das tradicionais percebido pelo "Valor Econ�mico" est� longe de ser exce��o, como atestam os dados mais recentes relativos � circula��o dos jornais.
De janeiro de 2013 a janeiro de 2016, o total de exemplares impressos encolheu mais de 30%, caindo de 4,3 milh�es para 3 milh�es, de acordo com o IVC (Instituto Verificador de Comunica��o).
O n�mero de edi��es digitais auditadas saltou mais de 250%, de 183 mil para 656 mil. Sua participa��o no bolo foi de 4,1% a 18,2% -mas a circula��o total recuou 20%, de 4,5 milh�es para 3,6 milh�es.
Para Le�o Serva, autor do livro "A Desintegra��o dos Jornais", � preciso ter em mente que a redu��o do tamanho dos jornais n�o prenuncia a morte do jornalismo.
"Provavelmente vamos assistir a um novo ciclo econ�mico e a um novo ciclo de rela��o da sociedade com o jornalismo que n�o se baseie mais nos jornais de massa como os conhecemos", diz.
VELHO PARADIGMA
Na opini�o de Serva, o modelo em gesta��o n�o contar� com publicidade nem com massifica��o, duas caracter�sticas que se associaram ao jornalismo somente em meados do s�culo 19.
"Os jornais anteriores ao modelo de massa viviam da circula��o. Seus leitores pagavam integralmente a conta do custo do jornal. O pre�o de capa era muito alto, mas o compromisso entre o jornal e seu p�blico era de alta intensidade", afirma.
Mas por que, com tanta informa��o de gra�a dispon�vel na rede, algu�m ainda pagaria por conte�do noticioso? A resposta talvez esteja na credibilidade, um ativo que os jornais mant�m.
Na Pesquisa Brasileira de M�dia 2015, 58% dos entrevistados disseram confiar muito ou sempre nos jornais, enquanto 71% disseram confiar pouco ou nada nas not�cias difundidas em redes sociais.
O debate volta, portanto, � quest�o inicial, sem que ningu�m saiba como fechar a conta, sempre elevada, da produ��o di�ria de reportagens de qualidade.
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