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O que a Folha pensa Estados Unidos

Um condenado na Presidência dos EUA?

Culpado em processo criminal, Trump representa desafio para instituições da democracia americana e estabilidade global

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O ex-presidente dos EUA Donald Trump, após condenação na Justiça - Seth Wenig/Pool via Reuters

A condição de ex-presidente condenado criminalmente firma Donald Trump como figura inaudita, e perniciosa, na história da democracia mais importante do Ocidente.

O veredicto do júri que avaliou 34 acusações penais em Nova York demonstra de forma inequívoca o vigor de um sistema legal que vive sob ataque pelo homem que governou, de 2017 a 2021, a maior potência militar do planeta.

Como ocorreu na Chicago dos anos 1930, quando o gângster Al Capone acabou preso por sonegação fiscal e não pelos banhos de sangue que ordenava, a Justiça carimbou Trump como condenado em um caso relativamente lateral.

Seu erro não foi ter tentado calar a atriz com quem havia mantido relações, a fim de preservar sua imagem na campanha eleitoral de 2016, mas sim ter falsificado registros do dinheiro pago a Stormy Daniels para acobertá-los como serviços empresariais.

É pouco ante as outras três acusações criminais a que responde: pela tentativa de reverter a disputa que perdeu para Joe Biden em 2020, pela interferência no processo eleitoral da Geórgia naquele ano e por esconder documentos secretos consigo após deixar o poder.

Trump dificilmente será preso pela sentença a ser proferida em julho. Ainda que fosse, poderia seguir em campanha eleitoral para voltar à Casa Branca em novembro, e até governar da cadeia se eleito.

É uma distorção decorrente de um princípio fundador dos EUA, a soberania da voz do povo. Demagogos como Trump usam essa retórica libertária, pervertendo-a como autorização para um vale-tudo.

A hipótese mais perturbadora, contudo, é a de que o ex-presidente derrote Biden e enfrente as gravíssimas acusações na cadeira presidencial. Os dois processos de âmbito federal tendem a ser suspensos enquanto ele estiver no governo, mas seguem vivos, e não se sabe o que ocorreria com o da Geórgia.

O conjunto compõe receita de instabilidade que testará ainda mais a esgarçada tessitura institucional dos EUA, além de confirmar o risco geopolítico que um eventual nova mandato de Trump trará.

Resta saber o impacto eleitoral da condenação. Se é certo que apoiadores de tipos como o republicano ou seu seguidor Jair Bolsonaro (PL) são impermeáveis a acusações contra seus ídolos, o pleito americano é disputado no detalhe.

Trump está pouco acima de Biden nas sondagens, mas lidera em estados-chave para uma vitória no Colégio Eleitoral —cuja composição se sobrepõe ao voto popular.

Se trumpistas podem se mobilizar pelo que veem como caça às bruxas, pesquisas indicam que pessoas sem aderência partidária tendem a não votar num condenado. E são elas que decidem a disputa.

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