Que ninguém se anime com a estabilização do desmatamento no cerrado. De fato, as derrubadas cresceram não mais de 3% neste ano; entretanto a devastação no segundo maior bioma brasileiro avança com o dobro da velocidade verificada na floresta amazônica.
Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre agosto de 2022 e julho de 2023, foram desmatados 11 mil km² de cobertura do cerrado, que nesse caso compreende vegetação florestal (cerradão), savânica e campestre.
Na Amazônia, os cortes somaram 9 mil km² no mesmo período. Ocorre que este bioma ao norte do país abrange uma área (49% do território nacional) equivalente a duas vezes a do cerrado (24%). Pior: a savana brasileira, uma das mais biodiversas do mundo, já perdeu metade da vegetação original, ante 20% da floresta amazônica.
Decerto 3% de alta na devastação é melhor que os 25% de 2022, na gestão de Jair Bolsonaro (PL). Soa positivo, ainda, que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha dado transparência ao número constrangedor dois dias antes da cúpula do clima, COP28, em Dubai.
O Planalto também anunciou a quarta fase do PPCerrado, que visa controlar o desmatamento no bioma. O plano havia sido desativado sob Bolsonaro, e é sensato que seja retomado, mas ainda parece aquém do necessário para estancar a devastação —que contribui para a crise climática tanto quanto a registrada na Amazônia.
O PPCerrado está concentrado em ações para conter o desmatamento ilegal. Como os proprietários nesse bioma estão autorizados a derrubar até 80% de suas áreas, haveria ainda como desmatar, sob amparo da lei, 300 mil km² de vegetação nativa —superfície 20% maior que a do estado de São Paulo.
O programa reconhece a necessidade de medidas e incentivos para desacelerar também os cortes legalizados e, assim, alcançar a meta de zerar o desmate até 2030.
Mostra-se, porém, parco em objetivos definidos e mensuráveis para tanto. Seria desejável, por exemplo, um plano robusto para a região conhecida como Matopiba (nos estados de MA, TO, PI e BA). Ela concentra 75% da destruição na região e apresenta grande vulnerabilidade às mudanças climáticas, como atraso na estação chuvosa e menor pluviosidade.
Há 141 mil km² de áreas degradadas no cerrado, segundo o MapBiomas. São em geral pastagens improdutivas, que urge recuperar.
É imperativo concatenar incentivos, outorgas de irrigação e zoneamento para orientar a expansão agropecuária a elas, assim como eleger áreas prioritárias para criar unidades de conservação nos 50% remanescentes de cerrado. Antes que todo ele sucumba ao fogo.
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