Após dois meses de governo, passa da hora de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixar em segundo plano os discursos inflamados e divisivos. Cumpre trabalhar com afinco nos temas essenciais para a retomada do crescimento econômico e a melhoria das condições de vida da população.
Houve um ou outro progresso nas últimas semanas em áreas pouco controversas. É positivo, por exemplo, que o programa Bolsa Família comece a voltar aos trilhos, com revisão do cadastro para combate a fraudes, diferenciação de valores do benefício a depender do tamanho da família e o retorno de contrapartidas, como mandam as boas práticas.
Entretanto a retomada da economia dependerá do sucesso em fazer avançar reformas essenciais, como a tributária. Eis um campo minado desde sempre por interesses setoriais e federativos diversos, que há décadas travam qualquer tentativa de mudança.
Para vencer as resistências e convencer a sociedade de que as alterações são necessárias, não bastará o Ministério da Fazenda lutar sozinho no Congresso. É preciso que o presidente da República deixe claro se tratar de sua prioridade política e que se engaje pessoalmente no avanço da pauta.
Mais ainda no contexto atual, em que não se tem clareza da solidez da base de apoio parlamentar, a ser testada na prática.
Quanto mais Lula insistir numa atuação teatral, como se ignorasse a realidade do governo, mais distanciará outros atores políticos de seu projeto —se é que há um.
A reforma é complexa e suscita controvérsia sempre que o debate desce aos detalhes. Nos últimos anos, ao menos, cresceu o alinhamento político em torno de sua primeira fase —a que simplifica e moderniza a cobrança dos impostos sobre bens e serviços.
Já há boa compreensão de parlamentares sobre as vantagens da unificação dos cinco tributos atuais (PIS/Confins, IPI, ICMS e ISS) num novo imposto cobrado sobre uma base de incidência ampla e no local de consumo.
Outra boa notícia é o destaque dado ao tema nas falas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do vice-presidente, Geraldo Alckmin. Resta Lula, de inegável capacidade de comunicação e negociação, entrar em campo.
É necessário engajar governadores e prefeitos, superando as resistências federativas. Há que vencer as objeções setoriais, concentradas nos serviços e no agronegócio.
Se o presidente quer restaurar o crescimento sustentável, como diz, a reforma tributária é a agenda positiva mais ao alcance da administração petista. Nela, as tertúlias ideológicas pesam menos que o esclarecimento da sociedade.
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