Na atual sociedade da informação, as plataformas digitais atingiram nível de relevância tal que praticamente compõem a infraestrutura pública de comunicação, de forma semelhante aos meios de comunicação em massa.
Há uma base privada na relação contratual delas com cada usuário, mas com essa dimensão pública, diante do impacto em toda a população, o que se denomina efeito de rede comunicacional.
Se dos anos 1990 até 2015 houve a criação de novos direitos para isentar intermediários de responsabilidades, com a legítima preocupação de proteger a liberdade de expressão e a inovação (em linha com a escola libertária da rede), agora, diante do uso intenso e da relevância das novas tecnologias para as relações humanas, as plataformas são pressionadas a proverem informações para permitir a investigação dos responsáveis por crimes, a adotarem medidas para mitigar os efeitos negativos de campanhas de desinformação (algumas atentatórias à democracia), crimes de ódio, comportamentos inautênticos (por meio do uso de robôs e contas falsas), entre outros ilícitos cibernéticos, bem como tratarem dados e algoritmos de forma ética, segura e responsável.
Assim, diante do poder econômico e da informação, baseado em dados, algoritmos e moderação de comportamento e conteúdo, passa a ser indispensável que as plataformas observem direitos fundamentais, como o contraditório e a ampla defesa. Ainda, as decisões das plataformas devem ser fundamentadas e transparentes para que possa haver o escrutínio da sociedade e das autoridades competentes sobre a mitigação de comportamentos nocivos. Há interesse público, portanto, na transparência sobre os critérios de decisão, pois eles afetam a forma como a "atual esfera pública" é constituída.
Em termos de soberania nacional, não importa o local em que dados são armazenados ou se a empresa tem sede no Brasil. Se há exploração do mercado brasileiro ou alguma parte do tratamento dessas informações ocorrer em nosso país, deverá obrigatoriamente ser respeitada a legislação nacional, como expressamente consta no Marco Civil da Internet (MCI) e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), incluindo o dever de armazenamento e provimento de dados para identificação de infratores (seis meses para provedores de aplicação e um ano para conexão), conforme o MCI.
Nessa linha, a discussão sobre a obrigação de os data centers terem sede no Brasil é ultrapassada (foi rechaçada depois de amplo debate público durante o MCI), pois onera a operação, não contribui para a segurança dos dados e limita o uso de novas soluções tecnológicas. Fato é que mesmo que os servidores tenham suas sedes nos Estados Unidos ou na Europa, por exemplo, poderão ficar sujeitos às regras e decisões judiciais brasileiras.
Liberdade de expressão, privacidade, inovação, investigação e combate a ilícitos cibernéticos devem caminhar de mãos dadas. As plataformas digitais serão cada vez mais importantes para a manutenção de um ambiente "figital", em que não há mais segregação do físico com o digital, saudável e sustentável, a fim de garantir o desenvolvimento econômico e tecnológico —e, ao mesmo tempo, o respeito a direitos e garantias fundamentais.
TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.