Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia

China e Brasil querem reunir Rússia e Ucrânia em conferência de paz

Celso Amorim, assessor de Lula, e chanceler Wang Yi divulgam proposta conjunta para negociar solução de conflito europeu

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Pequim

O assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, reuniu-se nesta quinta-feira (23) em Pequim com Wang Yi, membro da cúpula do Partido Comunista e chanceler da China, em busca de "uma solução política para a crise na Ucrânia e a desescalada da situação", segundo nota do governo brasileiro.

Entre os entendimentos comuns citados por China e Brasil está o de que ambos "apoiam uma conferência internacional de paz, que seja reconhecida tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia, com participação igualitária de todas as partes relevantes, além de uma discussão justa de todos os planos de paz".

Segundo a assessoria de Amorim, Brasil e China agora "devem engajar países amigos para construir" o encontro.

Celso Amorim, assessor especial da Presidência da República, e Wang Yi, chanceler da China, encontram-se em Pequim - Yue Yuewei/Xinhua

Em fevereiro de 2023, um ano depois do início da invasão da Ucrânia pelo presidente russo, Vladimir Putin, a China divulgou uma proposta para a paz na região que incluía cessar-fogo, proteção de civis e prisioneiros de guerra, rejeição ao uso de armas nucleares, exportação livre de grãos, apoio econômico à reconstrução da Ucrânia, além de fim das sanções impostas a Moscou.

O documento foi criticado por não se posicionar a respeito da presença de tropas russas em território ucraniano e por não fazer menção ao que deveria acontecer com o território anexado pela Rússia em um plebiscito —uma medida considerada ilegal pela grande maioria da comunidade internacional.

Os dois pontos são os principais entraves para uma eventual negociação de paz, considerando que a Ucrânia exige a retirada de todos os militares russos do país, além do retorno às fronteiras de 1991 —incluindo a península da Crimeia, anexada pela Rússia em 2014 logo após a guerra civil que derrubou o governo de Kiev, à época pró-Moscou.

Países ocidentais, em especial os Estados Unidos, rivais da China, disseram ainda que Pequim não tem legitimidade para liderar um processo de paz dada a proximidade entre Putin e o dirigente Xi Jinping. O presidente russo visitou o líder chinês no último dia 16, num encontro que reforçou a oposição dos países a uma ordem mundial liderada por Washington e anunciou cooperação em áreas que vão desde tecnologias espaciais e nucleares até finanças e manufatura.

No início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Brasil tentou se apresentar como mediador e formar o chamado "clube da paz", reunindo países não envolvidos no conflito, como China e Índia, para discutir o fim da guerra. Mas a iniciativa não foi bem recebida pelos EUA e por países da Europa ocidental, e declarações do presidente brasileiro sobre a Ucrânia, além de uma visita do líder petista a Pequim, esfriaram as relações com Washington.

Desentendimentos entre Lula e o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, também prejudicaram a posição do Brasil como mediador, pelo menos aos olhos de observadores ocidentais. O esperado encontro entre os dois não aconteceu durante o G7 em maio de 2023, gerando um conflito de versões entre as duas chancelarias. O ucraniano chegou a dizer à Folha com alguma ironia, no mês seguinte, que o brasileiro estava procurando ser original em sua proposta de paz na região.

O encontro bilateral finalmente aconteceu em setembro, em Nova York e, segundo disse Zelenski à Folha em abril deste ano, a reunião foi "muito boa".

"Algo definitivamente mudou de forma positiva no beco sem saída que era nosso relacionamento", disse o ucraniano. "O Brasil terá um grande impacto se a política de Lula com a Ucrânia mudar, se ele realmente quiser resolver a guerra e reconhecer a Rússia como agressora."

A questão ainda tem o agravante de que o presidente brasileiro disse que Putin poderia ir ao Rio de Janeiro na cúpula do G20, no final do ano, sem medo do Tribunal Penal Internacional, que tem um mandado de prisão contra o russo por supostos crimes de guerra. "Se eu for presidente do Brasil, e se ele vier para o Brasil, não tem como ele ser preso", disse Lula em setembro passado.

A nota de Brasília sobre o encontro de Amorim com Wang Yi também reproduz, em grande parte, o que a diplomacia chinesa vem defendendo em reuniões de seu enviado especial para negociações voltadas à Guerra da Ucrânia. Por exemplo, a rejeição ao uso de armas de destruição em massa e aos ataques a usinas nucleares.

Saindo do tema da guerra, China e Brasil defendem evitar, de maneira geral, segundo o documento divulgado, "a divisão do mundo em grupos políticos ou econômicos isolados". É parte dos esforços chineses e também brasileiros para que não se firme uma nova Guerra Fria, com um bloco ocidental em torno dos Estados Unidos.

Os dois países, de acordo com o comunicado, pedem mobilização para "reforçar a cooperação internacional" em setores como energia, comércio e segurança alimentar. Também a "segurança de infraestrutura crítica, incluindo oleodutos e cabos óticos submarinos, a fim de proteger a estabilidade das cadeias industriais e de suprimentos globais".

Convidado por Pequim, Amorim chegou na terça (21) e deve ficar uma semana na China, com agenda ainda não divulgada.

A Guerra da Ucrânia completa dois anos e três meses nesta sexta-feira (24), e as negociações para a resolução do conflito estão emperradas. Recentemente, o Brasil foi convidado para uma cúpula da paz organizada pela Suíça, mas o governo Lula vê o encontro com ceticismo, uma vez que a Rússia já disse que não vai participar.

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