A Califórnia, estado americano que se fosse um país teria a quinta maior economia do mundo, lançou nesta semana seu maior esforço até aqui para enfrentar a crise climática. Seus legisladores aprovaram uma série de leis que visam a reduzir as emissões e deixar o consumo de combustíveis fósseis para trás.
O pacote inclui o valor recorde de US$ 54 bilhões em gastos e novas e amplas restrições a perfurações de óleo e gás, determinando que até 2045 o estado terá obrigatoriamente que parar de lançar dióxido de carbono na atmosfera.
Votou-se ainda pela prorrogação por cinco anos do funcionamento da última usina nuclear local, algo que no passado teria sido visto por ambientalistas como impensável. Defensores da medida disseram que a Califórnia —que novamente está com dificuldade em conservar luzes acesas em meio a uma onda de calor escaldante— precisa da eletricidade da usina, isenta de emissões, enquanto outras fontes de energia limpa são ampliadas.
Aprovadas na noite de quarta-feira (31), as leis representam uma vitória do governador Gavin Newsom, democrata que vem procurando se mostrar como líder climático enquanto eleva seu perfil nacional e começa a atrair especulações sobre uma possível candidatura à Casa Branca.
Newsom surpreendeu legisladores em agosto quando os exortou a aprovar várias novas leis climáticas, muitas das quais não tinham sido aprovadas antes. Ao final, todas as suas propostas passaram, menos uma: um projeto que buscava reforçar a meta estadual de redução dos gases estufa até 2030. A medida foi rejeitada por quatro votos.
"O progresso que fizermos na questão da crise climática neste ano será sentido por gerações, e o impacto se espalhará para muito além de nossas fronteiras", disse Newsom em comunicado. As novas iniciativas da Califórnia dão impulso a crescentes esforços nos EUA para limitar as emissões de gases que estão superaquecendo o planeta.
Em agosto o presidente Joe Biden assinou uma lei climática ampla que prevê investimentos de US$ 370 bilhões nos próximos dez anos. Mas ela, por si só, não será o bastante para eliminar até 2050 a emissão de gases estufa no país, meta que cientistas dizem que o mundo inteiro precisa alcançar para evitar os efeitos mais catastróficos da mudança climática. A Casa Branca afirma que os estados também precisam tomar iniciativas mais decisivas.
A Califórnia já possui algumas das políticas mais rigorosas para promover a energia renovável. No mês passado, reguladores estaduais finalizaram um plano para proibir até 2035 a venda de carros novos movidos a gasolina. A expectativa é que a política acelere a transição global para veículos elétricos.
Mas diante das ondas recordes de calor, secas e incêndios que vêm fustigando o estado, Newsom enfrenta a pressão crescente de ativistas. Enquanto os parlamentares votavam, o Serviço Meteorológico Nacional avisava que uma onda de calor "extremamente perigosa" cobriria o estado.
Especialistas afirmam que agora o estado terá que efetuar o trabalho difícil de concretizar as metas de cortes de emissões.
Legisladores haviam definido anteriormente uma meta para a Califórnia de até 2030 reduzir as emissões para 40% abaixo dos níveis de 1990. Pelonovo texto, o estado terá que reduzi-las em pelo menos 85% até 2045 e compensar por quaisquer emissões ainda remanescentes, plantando árvores ou usando tecnologias como a captura direta de ar.
Mas definir uma meta ambiciosa é apenas um primeiro passo. Por enquanto, o estado nem sequer está no caminho certo para alcançar suas metas para 2030, segundo Danny Cullenward, diretor de política pública da ONG CarbonPlan. "Se essas novas metas forçarem o Parlamento a reestudar o assunto e apresentar um plano de corte de emissões novo e digno de crédito, ótimo", diz. "Mas acho que eles ainda não têm um plano realista de implementação."
O orçamento de Newsom prevê o gasto recorde de US$ 54 bilhões com programas climáticos ao longo de cinco anos. Ele inclui US$ 6,1 bilhões para veículos elétricos, incluindo verbas para a compra de ônibus escolares movidos a bateria; US$ 14,8 bilhões para obras; US$ 8 bilhões para limpar e estabilizar a rede elétrica; US$ 2,7 bilhões para reduzir o risco de incêndios; e US$ 2,8 bilhões em combate a seca.
Além da manutenção da operação dos reatores de Diablo Canyon, uma das medidas mais polêmicas aprovadas pelo Legislativo é a exigência de que novos poços petrolíferos e de gás fiquem a pelo menos 975 metros de distância de casas, escolas e hospitais, além da imposição de controles de poluição mais rigorosos sobre poços em distâncias menores.
A Califórnia é o sétimo maior produtor de óleo do país, mas nunca antes implementou zonas de proteção em volta de poços, como fazem estados como Colorado e Pensilvânia. Os defensores da nova regra estimam que 2,7 milhões de californianos estejam nessas condições; no ano passado um comitê de saúde estadual concluiu que residir perto de poços ativos eleva o risco de asma, ataques cardíacos e partos prematuros.
"A indústria não é contra a definição dos limites", diz Kevin Slagle, porta-voz da Associação Petrolífera dos Estados Ocidentais. "Mas uma ordem política igual para todo o estado pouco ajuda a proteger a saúde e segurança; nos tornará mais dependentes de petróleo do exterior e aumentará os custos."
Outra lei manda os reguladores traçarem novas diretrizes para a captura e armazenagem de carbono. Newsom disse que a tecnologia, ainda de custo alto, é necessária para o estado alcançar suas metas climáticas, mas alguns ativistas dizem que ela permitiria que indústrias continuassem a queimar combustíveis fósseis.
Especialistas afirmam que o impasse em torno da política climática na Califórnia foi quebrado graças ao governador. Muitos projetos pareciam estar parados até que Newsom interveio. "Nos últimos anos o Senado tem sido o lugar onde a política climática vai para morrer", diz David Weiskopf, assessor da NexGen Policy. "Mas então Newsom disse: ‘Vamos resolver o clima’. Ele nunca havia feito isso antes."
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