Pequim acusou Washington e outras potências ocidentais de transformar o disputado mar do Sul da China em "arena de combate" e "campo de caça" e pediu que nações da região ajudem a repelir a interferência estrangeira.
O apelo foi feito em uma mensagem gravada pelo chanceler chinês, Wang Yi, e enviada aos dez países-membros da Asean (sigla inglesa para Associação de Nações do Sudeste Asiático). Ela marcou os 20 anos da assinatura de um tratado entre o clube e Pequim para tentar normalizar as relações na área marítima que a ditadura comunista vê como quintal estratégico.
Wang evitou nominar os EUA, dizendo que "algumas potências externas estão deliberadamente expandindo conflitos e provocando tensões, colocando em risco os direitos legítimos, os interesses dos países costeiros e a ordem normal no mar".
"A China e a Asean devem deixar sua posição clara: se você veio em paz e cooperação, nós o recebemos; se você veio para disrupção e destruição, por favor vá embora", completou, segundo a mídia chinesa.
As disputas sobre o mar do Sul da China estão no centro da Guerra Fria 2.0 lançada pelos EUA para tentar conter a assertividade chinesa na Ásia-Pacífico, em 2017. Desde então, multiplicaram-se as chamadas operações de liberdade de navegação, segundo as quais navios de guerra ocidentais usam rotas que Pequim considera suas.
Desde 2014, os chineses militarizaram pequenos atóis e ilhotas no mar, alegando assim posse e consequente direitos a águas territoriais. Dois anos depois, uma queixa das Filipinas aceita num tribunal marítimo das Nações Unidas negou tal reivindicação, mas Pequim não reconhece a decisão.
Já à luz da Guerra da Ucrânia, a Otan, a aliança militar ocidental, colocou a China pela primeira vez no centro de suas preocupações ao divulgar seu novo Conceito Estratégico para a próxima década.
Desde 2017, a aliança tem enviado navios para o mar do Sul da China em apoio à posição americana —o Reino Unido é o mais vocal desses aliados, tendo inclusive navegado seu novo porta-aviões por lá no ano passado. No começo deste mês houve o incidente mais recente, com um destróier americano passando perto de ilhas chinesas três vezes numa semana.
Pequim e Washington trocam acusações periódicas acerca do status internacional das águas da região. Mas o apelo chinês terá dificuldade de ser ouvido por metade dos membros da Asean: Filipinas, Malásia, Brunei, Indonésia e Vietnã têm disputas com os chineses sobre trechos da região, particularmente áreas ricas de pesca e de extração de petróleo.
A importância do mar do Sul da China é enorme para Pequim: cerca de 80% do petróleo e do gás que consome passam por rotas marítimas da região, assim como a maior parte de suas importações e exportações. Perder o controle sobre ele é arriscar o estrangulamento econômico.
Por isso, movimentos como o acordo militar dos EUA com Austrália e Reino Unido, que visa reforçar a posição naval de Camberra com submarinos de propulsão nuclear no flanco sul chinês é denunciado por Pequim como inaceitável.
No outro ponto ultrassensível dos mares da região, o estreito de Taiwan, a tensão segue entre a ilha autônoma e a China continental, que a considera sua e trabalha por uma absorção que pode vir à força.
Nesta segunda, foi iniciada a maior simulação anual de uma invasão chinesa, o exercício militar Han Kuang, que envolve um alto grau de realismo, como uso de munição real no mar. Dezenas de caças F-16V decolaram em interceptações simuladas, uma versão ampliada do que já fazem todas as semanas contra incursões de aviões chineses, que testam crescentemente o estado de alerta das defesas locais.
Na terça (26), a presidente Tsai Ing-wen irá supervisionar a ação ao vivo, a bordo do destróier Keeling, que comanda outros 20 navios na região nordeste da ilha. Os exercícios coincidem com a simulação de ataque aéreo Wan An, também anual. O treinamento é levado tão a sério que quem for pego fora de abrigos enquanto as sirenes estiverem ativas pode pagar multas de até R$ 25 mil.
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