O Canadá anunciou nesta terça-feira (31) que descriminalizará a posse de drogas pesadas a partir do ano que vem em um projeto-piloto na província de Colúmbia Britânica. A região enfrenta uma crise de consumo de opioides, que já provocou milhares de mortes, e as autoridades tentam agora tratar o vício de forma clínica em vez de encarcerar usuários.
O projeto estabelece que adultos não poderão ser presos caso flagrados com até 2,5 gramas de drogas pesadas —a polícia também não poderá confiscar as substâncias. Será tolerada a posse de opioides, cocaína e metanfetamina, entre outros entorpecentes. O programa terá duração inicial de três anos.
"Por muitos anos, a oposição ideológica à redução de danos custou vidas", disse a ministra federal de Saúde Mental e Vícios, Carolyn Bennett, em entrevista para anunciar o projeto. Se flagrados com as substâncias, os usuários receberão informações sobre como acessar ajuda médica para tratar o vício.
"Estamos fazendo isso para salvar vidas e para dar aos usuários de drogas dignidade e poder de decisão", completou Bennett, enfatizando que a iniciativa não representa uma legalização. Segundo ela, o programa servirá como referência para outras jurisdições no Canadá —outras localidades, incluindo Montreal e Toronto, manifestaram desejo de implementar medidas semelhantes.
O prefeito de Vancouver, Kennedy Stewart, disse que a decisão "reformula de forma fundamental a política de drogas para favorecer assistência em saúde". A cidade é tida como epicentro da crise de opioides no Canadá.
O político ainda classificou a medida de histórica e corajosa. Segundo ele, o projeto representa um passo pioneiro "na luta para salvar vidas da guerra às drogas" e tem potencial para reduzir a incidência de pequenos crimes que costumam estar relacionados à dependência química.
Nesta quarta (1º), o Novo Partido Democrático, de esquerda, deverá apresentar um projeto de lei para descriminalizar a posse de entorpecentes em todo o país. Analistas, contudo, acreditam que o texto será rejeitado no plenário do Parlamento.
A Colúmbia Britânica será a segunda jurisdição na América do Norte a descriminalizar drogas pesadas. Em 2020, o estado americano do Oregon aprovou lei para que usuários flagrados com pequenas quantidades paguem multa e participem de um programa de recuperação para dependentes.
A experiência, até aqui, teve resultados tímidos —poucas pessoas aderiram a tratamentos, enquanto os gastos com vigilância policial diminuíram. Em Ohio, policiais buscam dependentes para oferecer tratamento em vez de prender.
Na Colúmbia Britânica, o abuso de substâncias ilícitas já causou milhares de mortes. A titular da pasta responsável por dependências químicas, Sheila Malcolmson, disse à agência de notícias AFP, em novembro, que a província enfrentava uma "crise de overdoses que causa uma perda de vidas terrível".
Nesta terça, Malcolmson argumentou que a pandemia agravou seus efeitos. "A vergonha e o medo impedem que as pessoas acessem a atenção em saúde de que precisam", afirmou. "E o medo de serem criminalizadas levou muitos a omitir sua dependência e usar drogas de forma solitária".
De acordo com dados do governo federal, 26.690 pessoas morreram de overdose de opioides no Canadá de janeiro de 2016 a setembro de 2021.
Na Colúmbia Britânica, estima-se que seis pessoas morrem todos os dias devido a intoxicações ligadas a esse tipo de substância. A província registrou mais de 2.200 óbitos no ano passado e aproximadamente 9.400 desde que a chefe de saúde pública da região, Bonnie Henry, declarou emergência em 2016.
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