Cerveja com os amigos: 30ºC.
Discoteca: 28ºC.
Hospital: 25ºC.
UTI: 22ºC.
Forno crematório: 980ºC.
Se você tem menos de 35 anos, este recado é para você. Sobre um fundo preto, as frases piscam no novo vídeo do governo espanhol contra a epidemia do coronavírus.
O alvo são os jovens, e não só na Espanha. Vários países europeus consideram a faixa etária entre 18 a 35 como o principal vetor dos novos casos de Covid-19.
É ainda uma onda rasa, como disse Susanne Johna, representante da associação de médicos da Alemanha, mas está subindo. No trajeto, recuperou antigas restrições e introduziu novas, como a proibição de fumar na rua onde não for possível manter distância de 2 metros.
Discotecas fecharam as portas por todo o continente, e o espanhol “botellón” —grupinhos que se juntam em escadas ou muretas das cidades para beber— pode dar multa de 15 mil euros (R$ 90 mil).
Com o mesmo objetivo, a Bélgica limitou as lojas noturnas, onde garotos compram álcool quando os bares fecham. Passou das 22h, acabou a festa.
A preocupação não é descabida, ainda que a situação atual esteja longe do pico registrado em abril deste ano. Depois de cair a 2.886 novos casos diários no dia 26 de junho, na última quinta (13) o número no continente era mais que o triplo.
Em 31 países (os 27 da União Europeia, mais Reino Unido, Liechtenstein, Noruega e Islândia), houve 10.464. É uma fração do pior dia europeu, 1º de abril, quando 35.782 testes deram positivo, mas não são só os números que importam.
Desses 31 países, 19 domaram a transmissão comunitária: Malta praticamente erradicou o vírus, e outros 18 apresentam apenas clusters, entre eles a Espanha. Se baixarem a guarda, a situação escapa do controle, como tem alertado a OMS (Organização Mundial da Saúde) e a ECDC (agência europeia de controle de doenças infecciosas).
“Contenha. Contenha. Contenha” é o novo mantra do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus e seus principais auxiliares para a pandemia, o diretor-executivo Michael Ryan e a líder técnica Maria van Kerkhove.
“Não há surpresa. Toda vez que se retira a pressão, o vírus volta”, afirmou Ryan sobre os novos surtos de Covid-19 na Europa. “Já temos as ferramentas para impedir uma nova onda”, completa Van Kherkhove.
São elas que os europeus voltaram a tirar da caixa: reconfinamentos localizados, quarentenas obrigatórias, uso de máscara em qualquer espaço público, testes, formulários de contato. As medidas variam de país para país, mas o objetivo é o mesmo: impedir a transmissão do coronavírus.
Como já se sabe, ele passa de uma pessoa a outra quando gotas ou nuvens de saliva de uma atingem olhos, nariz ou boca da outra.
Quanto mais perto e por mais tempo as pessoas ficarem de mais gente diferente, mais rápido crescerá a curva de novos casos e maior o perigo de contágio desenfreado.
Parece simples, mas é preciso contar com a boa-vontade humana, e nem sempre ela aparece, mostram os números. No último dia 6, uma pesquisa realizada em Bruxelas, onde o uso de máscaras na rua é obrigatório, mostrou que 15% optaram por ignorar a regra. Num único fim de semana, 152 resistentes foram multados.
Alguns reclamaram da culpa atribuída à faixa etária, como a dançarina espanhola Adarra Solas, que disse a um repórter: “Apenas chegou o verão. Começamos a relaxar”. Exatamente o problema apontado pelos epidemiologistas.
Grécia, França, Suécia e Holanda também notaram um crescimento maior de caso entre jovens.
O governo alemão criticou publicamente os “foliões descuidados” que ignoraram regras de distanciamento, lotaram boates da ilha espanhola de Mallorca até que as prefeituras fossem obrigadas a fechá-las e então foram fazer o mesmo na Bulgária —onde a moda deste verão eram as “festas da espuma”, com pistas de dança flutuantes sobre imensas piscinas.
“Está faltando disciplina”, reclamou em vídeo o ministro das Capacidades Humanas (pasta que inclui entre outras coisas saúde e educação) da Hungria, Miklós Kásler.
Seja o que for que estiver faltando, o fato é que os novos casos subiram, e com eles as restrições. Na praia belga de Blankenberge, quando a maré subiu, faltou areia para garantir distanciamento entre os banhistas no sábado passado. A polícia pediu que todos saíssem, mas um grupo de jovens se revoltou.
A solução foi imediata: visitas à cidade estão proibidas. Em Antuérpia, a solução foi o toque de recolher entre as 23h30 e as 6h.
Em parte porque são os jovens a maioria dos novos casos de Covid-19 —e o risco de doença grave é menor entre eles—, a curva de mortes na Europa não acompanhou a de infectados.
Por dia, os 31 países têm registrado entre 100 e 300 óbitos por coronavírus, um número que no passado chegou a superar 5.000.
A ciência também evoluiu, novos tratamentos e procedimentos evitaram complicações e não há superlotação hospitalar. E, como afirma o virologista Marc Van Ranst, do conselho de segurança belga, “conhecemos melhor vírus e testamos melhor”, o que explica a diferença crescente entre casos e mortes.
Mas, por menos que sejam, todas as mortes por Covid-19 poderiam ter sido evitadas se não houvesse contaminação.
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