O primeiro pensamento de Paul Zimmerman quando os resultados da histórica eleição local de Hong Kong começaram a comprovar uma vitória acachapante da oposição a Pequim foi: "Eles elegeram crianças".
"É um risco. Mas estamos em outro patamar, temos tudo para fazer um bom governo local, pressionar dentro do Conselho e nas ruas", diz Eddie Chu, 42. Ele é um importante deputado oposicionista que também buscou um assento de vereador, o que é permitido, mas foi derrotado. Ele e o líder ativista Joshua Wong, 23, barrado na disputa, disseram à Folha que uma das prioridades é justamente ajudar os jovens a governar.
No seu distrito, Pok Fu Lam, Zimmerman contou com 2.547 votos, derrotando dois outros candidatos com um discurso de zeladoria urbana.
Esse deve ser o ponto inicial a atacar, até por ser mais fácil. "Em toda a minha região, montanhosa, há necessidade de trilhas bem marcadas. É algo simples e efetivo", afirma.
Chu tem pretensões maiores. Ele acredita ser possível criar taxas distritais para implementar o que chama de "economia amarela" --em referência à cor dos pró-democracia, em oposição ao azul dos pró-Pequim. Essa economia se basearia em fortalecer comércio e serviço locais, buscando independência das redes ligadas a Pequim. É algo sensível entre moradores.
Nesta semana a rede de conveniência Best Mart 360 anunciou que investirá mais em lojas no continente. Acusada de ligação com Pequim, ela teve 75 de suas 102 unidades destruídas por vândalos neste ano.
"Pequim, a despeito de influenciar a mídia e a educação, largou a geração mais nova que agora foi votar. Deitamos as fundações para uma década de luta, podemos incentivar uma economia local mais forte", afirma Chu.
Os planos da oposição, contudo, são maiores. A ideia é seguir pressionando, na rua e de forma institucional, visando a mudança na legislação eleitoral restritiva.
Como dizem Wong e Chu, apenas conseguindo a maioria no Conselho Legislativo é que se pode vetar atos do Executivo, passo radical nunca antes dado. O problema é que a escolha do Conselho, em eleição no ano que vem, tem regras que favorecem indicações de Pequim. Dos seus 70 membros, 35 vêm de pleitos internos de categorias profissionais, fortemente influenciáveis. O resto, do voto direto.
Políticos pró-Pequim evitam falar sobre derrota no pleito
A Folha buscou a opinião de políticos do DAB (Aliança Democrática pela Melhoria e o Progresso de Hong Kong), o maior partido pró-Pequim, sobre a crise que escorraçou a sigla do poder local.
Obteve um não da agremiação, cujo setor de comunicação alegou falta de tempo de representantes para expressar suas visões sobre o momento político.
A reportagem entrou em contato com Ting Ting, conselheira local eleita pelo conselho de Islands, o único em que o DAB manteve o poder em Hong Kong. Considerada linha-dura na sua defesa de Pequim, ela afirmou que não poderia conceder entrevistas.
Na segunda (25), a liderança do partido pediu desculpas ao eleitorado por não ter oferecido soluções para a crise e ofereceu sua renúncia, que acabou não sendo aceita.
Isso é normal em tempos de derrota. O fato é que o campo pró-Pequim reteve cerca de 40% do eleitorado, e isso é sinal forte de que não pode ser tratado como minoria qualquer.
"Eu votei no DAB, como sempre votei. Não gosto dos protestos, eles trouxeram danos à economia da cidade", afirmou Jimmy, que pediu para não ter o sobrenome publicado, economista que trabalha num dos maiores bancos ocidentais de Hong Kong.
No distrito em que mora em Kowloon, o DAB perdeu todos os assentos que tinha. "É uma pena, pois no fundo essas crianças não saberão o que fazer com o poder que ganharam. Mas temos de ver o longo prazo, e não interessa a Pequim perder Hong Kong. Tudo irá se acomodar", disse.
Concorda com ele Kai, sua colega. "Não acredito que essa conversa de independência possa levar a qualquer lugar bom, não é racional achar que a China deixará de ser comunista da noite para o dia."
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