Após sinalizar que está pronta para uma nova corrida armamentista, a Rússia afirmou que aceita conversar com os Estados Unidos sobre um novo tratado de controle de mísseis que possa substituir o acordo suspenso por Washington na semana passada.
Na terça (5), o presidente Donald Trump sugeriu em seu discurso do Estado da União que poderia abrir negociações sobre o tema.
Ressalvando que um novo acordo deveria incluir outros países, como a China, o vice-chanceler russo, Serguei Riabkov, disse nesta quinta (7) que "quando nossos colegas americanos chegarem ao ponto de nos apresentar algo concreto, nós vamos examinar isso com interesse e positivamente".
A cautela nas palavras transpira a desconfiança entre os dois países. A possibilidade de desenvolver e tornar operacionais armas antes proibidas tende a falar mais alto do que a expectativa de um novo acordo.
Os EUA suspenderam sua participação no INF (sigla inglesa para Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário), um acordo vital para o fim da Guerra Fria que foi assinado em 1987 e baniu 2.692 mísseis soviéticos e americanos da Europa.
Washington alega que um novo míssil russo, o 9M729, viola o acordo. Moscou nega, o que não convence analistas externos até pela justificativa dada: sua arma só era lançada de aviões e navios, o que era permitido pelo INF.
Moscou também suspendeu sua participação no INF, que veta mísseis balísticos (de trajetória uniforme) e de cruzeiro (mais lentos, mas que desviam do terreno) lançados do solo com alcance entre 500 e 5.500 km. O uso de lançadores terrestres é mais barato e rápido do que embarcar mísseis em aviões e navios.
O objetivo era retirar ogivas nucleares de rápido emprego do território europeu e desanuviar o clima de Apocalipse iminente no continente. Mísseis intercontinentais demoram cerca de meia hora para atingir seus alvos; aqueles que foram vetados chegavam num prazo de cinco a dez minutos.
Na sequência do anúncio americano, o presidente Vladimir Putin respondeu da forma tradicional nesse tipo de discussão: anunciou novas armas e flexionou seus músculos militares. Putin prometeu desenvolver um sistema hipersônico de médio alcance.
O Ministério da Defesa russo também previu, nesta quinta, ter até o fim do ano uma versão capaz de ser disparada do solo do míssil de cruzeiro Kalibr, que já foi lançado de navios contra alvos na Síria.
Na quarta (6), a Rússia também testou uma versão modernizada de um de seus principais mísseis balísticos intercontinentais, o RS-24 Iars. Uma arma que começou a ser produzida em 2010, o Iars pode carregar várias ogivas nucleares —ninguém sabe ao certo, mas os números variam de três a dez, a depender da potência de cada uma.
O lançamento ocorreu do cosmódromo de Plesetsk, próximo à Finlândia. O míssil, armado com ogivas convencionais, atingiu seus alvos a mais de 6.000 km dali, em Kura, na península de Kamchatka (extremo oriente russo). Isso é apenas metade do alcance do foguete, em produção desde 2010.
O sinal é inequívoco para os americanos, como Riabkov disse em sua entrevista a jornalistas russos: a ameaça de uma corrida armamentista por parte de Trump será respondida de forma proporcional pelo Kremlin.
O INF, acreditam especialistas, está morto. Ele já era uma relíquia na prática, dado o desenvolvimento militar desde então. Mas ele sinalizava comedimento de lado a lado, o comprometimento político . Além de um eventual novo acordo, americanos e russos ainda precisam começar a negociar o chamado Novo Start, o principal tratado de limitação do uso de armas como o Iars, as mais poderosas do mundo.
É bem menos do que as 2.800 e 2.200 que Rússia e EUA tinham, respectivamente, nessa condição em 2010. Mas ainda é suficiente para aniquilar o mundo algumas vezes em caso de conflito. Ao todo, os dois países reúnem 92% das 14,5 mil ogivas existentes, segundo a Federação dos Cientistas Americanos.
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