'Sim, n�s fizemos'; leia a �ntegra do discurso de despedida de Obama
Barack Obama, fez nesta ter�a-feira (10) seu discurso de despedida da Presid�ncia dos Estados Unidos.
O pronunciamento ocorreu em Chicago, cidade onde o democrata iniciou sua carreira pol�tica.
O mandat�rio far� em 20 de janeiro a transi��o para o seu sucessor, Donald Trump.
Leia, abaixo, a �ntegra do �ltimo discurso de Obama.
*
� bom estar em casa. Meus concidad�os americanos, Michelle e eu estamos comovidos com todos os bons votos que recebemos nas �ltimas semanas. Mas hoje � minha vez de dizer obrigado. Quer tenhamos coincidido em nossas posi��es ou raramente tenhamos concordado, minhas conversas com voc�s, americanos –em salas de estar e escolas; em fazendas e f�bricas; em restaurantes populares ou em postos avan�ados distantes– s�o o que me mantiveram honesto, me mantiveram inspirado e me deram for�a para seguir adiante. Aprendi com voc�s todos os dias. Voc�s me fizeram um presidente melhor e voc�s me fizeram um homem melhor.
Vim para Chicago originalmente quando tinha 20 e poucos anos, ainda tentando decifrar quem eu era, ainda � procura de um objetivo na vida. Foi em bairros n�o muito distantes daqui que comecei a trabalhar com grupos de igreja � sombra de sider�rgicas fechadas. Foi nestas ruas que testemunhei o poder da f� e a dignidade discreta de pessoas trabalhadoras confrontadas com dificuldades e perdas. Foi aqui que aprendi que a transforma��o s� acontece quando pessoas comuns se envolvem, se engajam e se unem para reivindic�-la.
Ap�s oito anos como seu presidente, ainda acredito nisso. E n�o sou apenas eu quem acredita. Esse � o cora��o latejante de nossa ideia americana –nosso experimento ousado com o autogoverno.
� a convic��o de que todos fomos criados iguais, dotados por nosso Criador de certos direitos inalien�veis, entre os quais est�o a vida, a liberdade e a busca da felicidade.
� a insist�ncia em que esses direitos, embora sejam manifestos, nunca foram autoexecutados; que n�s, o povo, por meio do instrumento de nossa democracia, podemos formar uma uni�o mais perfeita.
Essa � a grande d�diva que nossos fundadores nos legaram. A liberdade de correr atr�s de nossos sonhos individuais, com nossa suor, trabalho e imagina��o –e o imperativo de lutarmos juntos, tamb�m, para alcan�ar um bem maior.
H� 240 anos o chamado de nossa na��o � cidadania confere trabalho e objetivos a cada nova gera��o. Foi esse chamado que levou patriotas a escolher a rep�blica e n�o a tirania, que levou os pioneiros a abrir caminho rumo ao oeste do pa�s, que inspirou escravos a aventurar-se naquele caminho arriscado rumo � liberdade. Foi o que atraiu imigrantes e refugiados a cruzar oceanos e o rio Grande, que impeliu mulheres a buscar o direito de votar, que inspirou trabalhadores a se organizar. Foi por isso que soldados americanos sacrificaram suas vidas na praia de Omaha e em Iwo Jima, no Iraque e no Afeganist�o; foi por isso que homens e mulheres de Selma a Stonewall se dispuseram de sacrificar as suas, tamb�m.
Ent�o � isso o que queremos dizer quando falamos que a Am�rica � excepcional. N�o que nosso pa�s tenha sido perfeito desde o come�o, mas que demonstramos a capacidade de mudar e de melhorar a vida daqueles que v�m depois.
Sim, nosso progresso tem sido desigual. O trabalho da democracia sempre foi �rduo, contencioso e por vezes sangrento. Para cada dois passos � frente, muitas vezes temos a impress�o de termos recuado um. Mas o longo avan�o da Am�rica vem sendo definido pelo movimento para frente, por uma constante amplia��o de nosso credo fundador, de modo a abra�ar todos, e n�o apenas alguns.
Se eu tivesse lhes dito oito anos atr�s que a Am�rica reverteria uma grande recess�o, revigoraria nossa ind�stria automotiva e daria in�cio � fase mais longa de gera��o de empregos de nossa hist�ria... se eu tivesse dito que abrir�amos um cap�tulo novo com o povo cubano, que fechar�amos o programa iraniano de armas nucleares sem disparar um �nico tiro e que eliminar�amos o arquiteto do 11 de setembro... se eu tivesse dito que conquistar�amos o casamento entre pessoas do mesmo sexo e que garantir�amos a outros 20 milh�es de nossos concidad�os o direito a um plano de sa�de –voc�s talvez tivessem dito que est�vamos querendo demais.
Mas foi o que fizemos. Foi o que voc�s fizeram. Voc�s foram a transforma��o. Voc�s responderam �s esperan�as das pessoas, e por causa de voc�s, segundo praticamente qualquer crit�rio, a Am�rica � um lugar melhor e mais forte hoje do que era quando come�amos.
Dentro de dez dias o mundo vai assistir a um ato que caracteriza nossa democracia: a transfer�ncia pac�fica de poder de um presidente livremente eleito a outro. Prometi ao presidente eleito Trump que minha administra��o asseguraria a transi��o mais tranquila poss�vel, como o presidente Bush fez comigo. Porque cabe a todos n�s assegurar que nosso governo possa nos ajudar a fazer frente aos muitos desafios que ainda enfrentamos.
Dispomos do que precisamos para isso. Afinal, ainda somos o pa�s mais rico, mais poderoso e mais respeitado da Terra. Nossa juventude e garra, nossa diversidade e abertura, nossa capacidade ilimitada de risco e reinven��o significam que o futuro deve nos pertencer.
Mas esse potencial s� ser� realizado se nossa democracia funcionar. Ser� realizado apenas se nossa pol�tica refletir a dec�ncia de nosso povo. Apenas se todos n�s, independentemente de nossa filia��o partid�ria ou de nossos interesses particulares, ajudarmos a restaurar o senso de objetivos comuns que nos � t�o seriamente necess�rio agora.
� disso que quero tratar hoje: o estado de nossa democracia.
Entendam que a democracia n�o requer uniformidade. Nossos fundadores brigaram, fizeram concess�es e esperaram que fiz�ssemos o mesmo. Mas eles sabiam que a democracia requer, sim, um senso b�sico de solidariedade –a ideia de que, n�o obstante todas nossas diferen�as externas, estamos nesta juntos; que nos elevamos ou tombamos com um s�.
Houve momentos ao longo de nossa hist�ria que amea�aram romper essa solidariedade. O in�cio deste s�culo tem sido um desses momentos. Um mundo cada vez menor, a desigualdade crescente; as mudan�as demogr�ficas e o espectro do terrorismo –essas for�as puseram � prova n�o apenas nossa seguran�a e prosperidade, mas tamb�m nossa democracia. E o modo como enfrentamos esses desafios � nossa democracia vai determinar nossa capacidade de educar nossos filhos, gerar bons empregos e proteger nossa p�tria.
Em outras palavras, vai determinar nosso futuro.
Nossa democracia n�o vai funcionar sem a ideia de que todos t�m oportunidades econ�micas. Hoje a economia est� crescendo outra vez; os sal�rios, as rendas, o valor dos im�veis e as aposentadorias est�o voltando a subir, e a pobreza voltou a diminuir. Os ricos est�o pagando uma parcela mais justa de impostos, ao mesmo tempo em que o mercado acion�rio quebra recordes. O �ndice de desemprego se aproxima do n�vel mais baixo em dez anos. O �ndice de pessoas sem seguro nunca foi mais baixo. Os custos da sa�de est�o subindo no ritmo mais lento em 50 anos. E, se algu�m puder montar um plano que seja comprovadamente melhor que as melhorias que promovemos ao nosso sistema de sa�de –que cubra o mesmo n�mero de pessoas a um custo mais baixo-, eu darei apoio p�blico.
� por isso, afinal, que servimos nosso pa�s –para fazer a vida da popula��o ser melhor, n�o pior.
Mas, apesar de todos os avan�os reais que conquistamos, sabemos que n�o s�o o suficiente. Nossa economia n�o funciona t�o bem nem cresce tanto quando poucos prosperam �s expensas de uma classe m�dia crescente. A desigualdade gritante tamb�m corr�i nossos princ�pios democr�ticos. Enquanto os 10% mais ricos acumularam uma parcela maior da riqueza e receita, muitas fam�lias demais, nos centros pobres das grandes cidades e nos condados rurais, ficaram para tr�s: oper�rios de f�bricas demitidos, gar�onetes e profissionais de sa�de que t�m dificuldade em pagar suas contas, convencidos de que a situa��o � armada para ser desfavor�vel a eles, que seu governo defende apenas os interesses dos poderosos. � uma receita de mais cinismo e polariza��o de nossa pol�tica.
N�o existem solu��es f�ceis para esta tend�ncia de longo prazo. Concordo que nosso com�rcio deve ser justo, e n�o apenas livre. Mas a pr�xima onda de deslocamento econ�mico n�o vir� d� exterior. Vir� como consequ�ncia do avan�o implac�vel da automatiza��o, que torna obsoletos muitos empregos bons da classe m�dia.
Por isso precisamos forjar um novo pacto social –para garantir a todos nossos filhos a educa��o que necessitam; para conferir aos trabalhadores o poder de se sindicalizarem em busca de sal�rios melhores; para modernizar a rede de seguran�a social de modo a refletir o modo como vivemos hoje e empreender mais reformas tribut�rias, para que as empresas e os indiv�duos que lucram mais com a nova economia n�o evitem cumprir suas obriga��es ao pa�s que possibilitou seu sucesso. Podemos discutir sobre as melhores maneiras de alcan�ar esses objetivos. Mas n�o podemos transigir em rela��o aos pr�prios objetivos. Pois, se n�o gerarmos oportunidades para todas as pessoas, os desafetos e divis�es que paralisaram nosso progresso v�o apenas se intensificar nos pr�ximos anos.
Existe uma segunda amea�a � nossa democracia, uma amea�a que � t�o velha quanto nosso pr�prio pa�s. Ap�s minha elei��o, falou-se em uma Am�rica p�s-racial. Por bem-intencionada que fosse, essa vis�o nunca foi realista. A ra�a continua a ser uma for�a poderosa e divisiva em nossa sociedade. J� vivi o suficiente para saber que as rela��es raciais est�o melhores hoje do que eram dez, 20 ou 30 anos atr�s –isso � vis�vel n�o apenas nas estat�sticas, mas nas atitudes de jovens americanos de todo o espectro pol�tico.
Mas n�o chegamos onde precisamos chegar. Todos n�s temos mais trabalho a fazer. Afinal, se todo problema econ�mico � apresentado como uma luta entre uma classe m�dia branca que trabalha arduamente e minorias que n�o s�o merecedoras, ent�o trabalhadores de todas as cores ser�o relegados a disputar as sobras, enquanto os ricos se retiram ainda mais dentro de seus enclaves privados. Se nos negarmos a investir nos filhos de imigrantes, apenas porque eles n�o se parecem conosco, prejudicaremos as perspectivas futuras de nossos pr�prios filhos –porque essas crian�as morenas v�o representar uma parcela maior da for�a de trabalho da Am�rica. E nossa economia n�o precisa ser um c�lculo em que alguns ganham tudo e outros ficam com nada. No ano passado houve um aumento de renda para todas as ra�as, todas as faixas et�rias, para homens e mulheres.
Daqui em diante, precisamos respeitar e implementar as leis contra a discrimina��o –nas contrata��es, no setor habitacional, na educa��o e no sistema de justi�a criminal. � o que exigem nossa Constitui��o e nossos ideais mais elevados. Mas as leis n�o ser�o o bastante, por si s�s. � preciso que os cora��es mudem. Para que nossa democracia funcione neste pa�s cada vez mais diversificado, � preciso que cada um de n�s d� ouvidos ao conselho de um dos grandes personagens da fic��o americana, Atticus Finch, que disse: "Voc� nunca compreende uma pessoa realmente enquanto n�o considera as coisas desde seu ponto de vista... enquanto n�o entra em sua pele e caminha nela".
Scott Olson/Getty Images/AFP | ||
Presidente Barack Obama acena durante seu discurso de despedida nesta ter�a (10), em Chicago |
Para os negros e outras minorias, isso significa vincular nossas pr�prias lutas por justi�a aos desafios que muitas pessoas neste pa�s enfrentam: o refugiado, o imigrante, o pobre rural, o americano transg�nero e tamb�m o homem branco e de meia idade que, visto de fora, pode parecer que desfruta de todas as vantagens, mas que tem visto seu mundo virado do avesso pelas transforma��es econ�micas, culturais e tecnol�gicas.
Para os americanos brancos, isso significa reconhecer que os efeitos da escravid�o e das leis Jim Crow n�o desapareceram de repente na d�cada de 1960; que, quando grupos minorit�rios manifestam insatisfa��o, n�o est�o apenas fazendo racismo ao inverso ou praticando corre��o pol�tica; que, quando promovem protestos pac�ficos, n�o est�o reivindicando tratamento especial, mas o tratamento igual prometido pelos fundadores de nossa na��o.
Para os americanos natos, isso significa recordar que os estere�tipos manifestados hoje sobre imigrantes foram expressos, em termos quase id�nticos, em rela��o aos imigrantes irlandeses, italianos e poloneses. A Am�rica n�o foi enfraquecida pela presen�a desses imigrantes; eles abra�aram o credo deste pa�s, e o pa�s saiu fortalecido.
Assim, independentemente da posi��o que ocupamos, precisamos nos esfor�ar mais; para partir da premissa de que cada um de nossos concidad�os ama este pa�s tanto quanto n�s o amamos; que eles valorizam o trabalho e a fam�lia como n�s; que seus filhos s�o t�o curiosos, cheios de esperan�a e dignos de amor quanto s�o os nossos.
Nada disto � f�cil. Para muitos de n�s, tornou-se mais seguro recuar para dentro de nossas pr�prias bolhas, quer sejam nossos bairros, nossas universidades, nossos lugares de ora��o ou nossos feeds de m�dias sociais, cercados por pessoas de apar�ncia semelhante � nossa, que compartilham nossa vis�o pol�tica e nunca contestam nossas premissas. A polariza��o crescente de opini�es, a crescente estratifica��o econ�mica e regional, a fragmenta��o de nossa m�dia em canais para todos os gostos –tudo isso faz com que esse grande processo de divis�o em categorias distintas pare�a natural, at� inevit�vel. E, cada vez mais, nos sentimos t�o seguros envoltos em nossas bolhas que s� aceitamos informa��es, ver�dicas ou n�o, que se enquadram com nossas opini�es, em vez de basear nossas opini�es nas evid�ncias existentes.
Esta tend�ncia representa uma terceira amea�a � nossa democracia. A pol�tica � uma batalha de ideias; ao longo de um debate sadio, priorizamos metas diferentes e meios distintos de alcan�ar essas metas. Mas, sem alguma base comum de fatos, sem a disposi��o de aceitar novas informa��es e reconhecer que nosso advers�rio est� apresentando um argumento justo e que a ci�ncia e a raz�o t�m import�ncia, vamos continuar a falar sem ouvir ou ser ouvidos por nossos interlocutores, impossibilitando qualquer consenso.
Isso n�o faz parte daquilo que torna a pol�tica t�o desanimadora? Como podem os pol�ticos ficar falando em d�ficits quando propomos que se gaste dinheiro com pr�-escola para nossas crian�as, mas n�o quando reduzimos os impostos pagos pelas grandes empresas? Como podemos desculpar os lapsos �ticos cometidos em nosso pr�prio partido, mas criticar arduamente o outro partido quando ele faz o mesmo? Essa classifica��o desonesta de fatos n�o � apenas desonesta –ela acaba derrotando sua pr�pria finalidade. Porque, como me dizia minha m�e, a realidade costuma nos cobrar a conta.
Tomemos o desafio das mudan�as clim�ticas. Em apenas oito anos, reduzimos nossa depend�ncia do petr�leo estrangeiro pela metade, dobramos nossa energia renov�vel e levamos o mundo a um acordo que encerra a promessa de salvar este planeta. Mas, sem a��o mais ousada, nossos filhos n�o ter�o tempo para discutir a exist�ncia das mudan�as clim�ticas: estar�o ocupados enfrentando seus efeitos –desastres ambientais, turbul�ncias econ�micas e ondas de refugiados clim�ticos buscando abrigo em outros pa�ses.
Podemos e devemos discutir sobre a melhor maneira de abordar o problema. Mas simplesmente negar o problema significa n�o apenas trair as gera��es futuras: � trair o esp�rito essencial de inova��o e resolu��o pr�tica de problemas que guiou os fundadores de nosso pa�s.
Foi esse esp�rito, nascido do iluminismo, que nos converteu em grande pot�ncia econ�mica; foi esse esp�rito que decolou do Kitty Hawk e de Cabo Canaveral; � esse o esp�rito que cura doen�as e coloca um computador em cada bolso.
� esse esp�rito –a cren�a na raz�o, no empreendedorismo e na primazia do direito, n�o da for�a, que nos permitiu resistir � atra��o do fascismo e da tirania durante a Grande Depress�o e a construir uma ordem p�s-Segunda Guerra Mundial com outras democracias, uma ordem baseada n�o apenas no poderio militar e em filia��es nacionais, mas em princ�pios: o estado de direito, os direitos humanos, as liberdades de religi�o, de express�o, de reuni�o e de imprensa.
Essa ordem est� sendo desafiada hoje –primeiramente por fan�ticos violentos que alegam falar em nome do isl�; mais recentemente, por autocratas em capitais estrangeiras que enxergam o mercado livre, as democracias abertas e a pr�pria sociedade civil como amea�a ao seu poder. O perigo que cada um representa � nossa democracia tem alcance maior que um carro-bomba ou um m�ssil. Ele representa o medo das mudan�as; o medo das pessoas de apar�ncia diferente � nossa, que falam ou oram de modo diferente; o desprezo pelo estado de direito, que obriga os l�deres a prestar conta de seus atos; a intoler�ncia da dissens�o e do livre pensamento; a cren�a de que a espada, a arma de fogo, a bomba ou a m�quina de propaganda pol�tica s�o os �rbitros finais do que � certo ou errado.
Gra�as � coragem extraordin�ria de nossos homens e mulheres nas For�as Armadas e aos agentes de intelig�ncia, policiais e diplomatas que os apoiam, nenhuma organiza��o terrorista estrangeira planejou e executou com sucesso um ataque em nosso pa�s nos �ltimos oito anos; e, embora Boston e Orlando nos recordem de qu�o perigosa pode ser a radicaliza��o, nossas ag�ncias policiais est�o mais vigilantes e s�o mais eficazes que nunca. Eliminamos milhares de terroristas, incluindo Osama bin Laden. A coaliz�o global que lideramos contra o Estado Isl�mico eliminou seus l�deres e arrancou metade de seu territ�rio. O EI ser� destru�do, e ningu�m que amea�a a Am�rica estar� em seguran�a, jamais. A todos os membros das For�as Armadas, ser seu comandante em chefe tem sido a grande honra de minha vida.
Mas proteger nosso modo de vida requer mais que nossos militares. A democracia pode sucumbir quando cedemos ao medo. Assim, do mesmo modo que n�s, cidad�os, precisamos nos manter vigilantes contra a agress�o externa, precisamos nos precaver contra o enfraquecimento dos valores que nos tornam quem somos. Foi por isso que trabalhei nos �ltimos oito anos para colocar a luta contra o terrorismo em posi��o legal mais firme. Foi por isso que acabamos com a tortura, trabalhamos para fechar Guant�namo e reformar nossas leis de vigil�ncia, de modo a proteger a privacidade e as liberdades civis. � por isso que rejeito a discrimina��o contra americanos mu�ulmanos. � por isso que n�o podemos deixar de participar de lutas globais –para ampliar a democracia, os direitos humanos, os direitos das mulheres e os direitos LGBT–, por mais que nossos esfor�os sejam imperfeitos, por mais que possa parecer conveniente ignorar esses valores. Pois a luta contra o extremismo, a intoler�ncia e o sectarismo faz parte da luta contra o autoritarismo e a agress�o nacionalista. Se o alcance da liberdade e do respeito pelas leis encolher em todo o mundo, aumentar� a probabilidade de guerras dentro e entre pa�ses, e nossas pr�prias liberdades acabar�o amea�adas.
Portanto, sejamos vigilantes, mas n�o tenhamos medo. O EI vai tentar matar inocentes. Mas n�o poder� derrotar a Am�rica, a n�o ser que traiamos nossa Constitui��o e nossos princ�pios na luta contra ele. Rivais como R�ssia e China n�o poder�o equiparar-se � nossa influ�ncia em todo o mundo –a n�o ser que abrirmos m�o daquilo que representamos e nos convertermos em apenas mais um pa�s grande que oprime seus vizinhos menores.
E isso me conduz � quest�o final que quero abordar: nossa democracia � amea�ada sempre que n�s a damos como garantida. Todos n�s, independentemente de nossa filia��o partid�ria, devemos nos engajar na tarefa de reconstru��o de nossas institui��es democr�ticas. Quando nossos �ndices de participa��o eleitoral est�o entre os mais baixos entre as democracias avan�adas, precisamos facilitar o voto, e n�o dificult�-lo. Quando a confian�a em nossas institui��es est� baixa, devemos reduzir a influ�ncia corrosiva do dinheiro em nossa pol�tica e fazer quest�o que os princ�pios de transpar�ncia e �tica sejam respeitados por nossos pol�ticos. Quando o Congresso est� disfuncional, precisamos levar nossos distritos a incentivar os pol�ticos a agirem pautados pelo bom senso, e n�o por posi��es extremas e r�gidas.
E tudo isso depende de nossa participa��o; depende de cada um de n�s aceitar a responsabilidade da cidadania, independentemente do rumo seguido pelo p�ndulo do poder.
Nossa Constitui��o � uma d�diva not�vel e bela. Mas, na realidade, � apenas um pergaminho. Ela n�o possui poder, por si pr�pria. Somos n�s, o povo, que lhe damos poder –com nossa participa��o e com as escolhas que fazemos. Se nos posicionamos ou n�o em defesa de nossas liberdades. Se respeitamos e aplicamos as leis, ou n�o. A Am�rica n�o � algo fr�gil. Mas as conquistas de nossa longa jornada rumo � liberdade n�o s�o garantidas.
Em seu pr�prio discurso de despedida, George Washington escreveu que o autogoverno � a base de nossa seguran�a, prosperidade e liberdade, mas que "muitos esfor�os ser�o feitos, a partir de causas e de origens diferentes, para enfraquecer a convic��o desta verdade em vossas mentes"; que devemos preservar essa convic��o "com ansiedade zelosa"; que devemos rejeitar "a primeira aurora de cada tentativa de alienar qualquer parcela de nosso pa�s do restante dele ou de enfraquecer os la�os sagrados" que nos unem.
Enfraquecemos esses la�os quando deixamos nosso di�logo pol�tico ficar t�o corrosivo que pessoas de bom car�ter s�o desencorajadas de atuar na pol�tica; t�o grosseiro e rancoroso que enxergamos americanos com os quais discordamos como n�o apenas estando enganados, mas sendo mal�volos, de alguma maneira. Enfraquecemos esses la�os quando definimos alguns de n�s como sendo mais americanos que outros; quando tachamos o sistema por inteiro como sendo inevitavelmente corrupto e atribu�mos a culpa por isso aos l�deres que elegemos, sem analisar nosso pr�prio papel em sua elei��o.
Cabe a cada um de n�s ser um daqueles guardi�es ansiosos e zelosos de nossa democracia e abra�ar a tarefa compensadora que nos foi dada de procurar continuamente melhorar esta nossa grande na��o. Porque, n�o obstante todas nossas diferen�as externas, todos compartilhamos o mesmo t�tulo que � motivo de orgulho: cidad�o.
Em �ltima an�lise, � isso o que nossa democracia exige. Ela precisa de voc�. N�o apenas quando h� uma elei��o, n�o apenas quando seus pr�prios interesses limitados est�o em jogo, mas ao longo de toda sua vida. Se voc� est� cansado de argumentar com desconhecidos na internet, experimente conversar com um desconhecido na vida real. Se alguma coisa precisa ser consertada, arregace as mangas e organize pessoas para consert�-la. Se voc� est� decepcionado com os pol�ticos que elegeu, agarre uma prancheta, colete algumas assinaturas e candidate-se a um cargo na pol�tica, voc� mesmo. Compare�a. Mergulhe fundo. Persevere. �s vezes voc� vencer�. �s vezes perder�. Supor que h� uma reserva enorme de bondade nos outros pode ser um risco, e haver� momentos em que o processo o decepcionar�. Mas, para aqueles de n�s que tivemos a sorte de fazer parte desse trabalho, de v�-lo de perto, ele pode energizar e inspirar as pessoas, garanto a voc�s. E, na maioria das vezes, sua f� na Am�rica e nos americanos ser� confirmada.
A minha o foi, sem d�vida alguma. Nos �ltimos oito anos pude ver os rostos esperan�osos de jovens rec�m-formados e de nossos oficiais militares mais recentes. Chorei com fam�lias enlutadas, em busca de respostas, e encontrei a gra�a divina numa igreja de Charleston. Vi nossos cientistas ajudarem um paral�tico a recobrar o senso de tato e vi nossos guerreiros feridos voltarem a andar. Vi nossos m�dicos e volunt�rios reconstruir ap�s terremotos e impedir o avan�o de pandemias. Vi as crian�as menores nos fazerem lembrar de nossas obriga��es de cuidar de refugiados, de trabalhar em paz e, sobretudo, de velar pelo bem uns dos outros.
A f� que depositei todos aqueles anos atr�s, n�o longe daqui, no poder dos americanos comuns de efetuarem mudan�as –essa f� foi recompensada de maneiras que eu jamais poderia ter imaginado. Espero que a sua tamb�m tenha sido. Alguns de voc�s que est�o aqui hoje ou que est�o assistindo em casa estiveram conosco em 2004, em 2008, em 2012 –e talvez voc�s ainda mal acreditem que conseguimos realizar tudo isto.
Voc�s n�o s�o os �nicos. Michelle –h� 25 anos voc� � n�o apenas minha mulher e a m�e de minhas filhas, mas tamb�m minha melhor amiga. Voc� assumiu um papel que n�o tinha pedido e o fez seu, com gra�a, garra, estilo e bom humor. Voc� fez da Casa Branca um lugar que pertence a todos. E uma nova gera��o passou a ter aspira��es maiores por ter voc� como exemplo a seguir. Voc� me deixou orgulhoso. Deixou o pa�s orgulhoso.
Malia e Sasha, sob as circunst�ncias mais estranhas poss�veis voc�s se tornaram duas jovens surpreendentes, inteligentes e lindas, mas, o que � mais importante, gentis, profundas e cheias de paix�o. Voc�s conviveram t�o facilmente com o peso dos anos passados sob os holofotes. De tudo o que eu j� fiz em minha vida, o que me d� maior orgulho � ser seu pai.
A Joe Biden, o garoto briguento de Scranton que se tornou o filho favorito de Delaware: voc� foi o primeiro nome que escolhi para minha equipe e foi minha melhor escolha. N�o apenas porque voc� foi um vice-presidente fant�stico, mas porque, com isso, acabei ganhando um irm�o. Amamos voc� e Jill como se fossem de nossa fam�lia, e a amizade com voc�s tem sido uma das grandes alegrias de nossa vida.
A meus assessores excepcionais: por oito anos –e, no caso de alguns de voc�s, h� muito mais tempo que isso– venho me fortalecendo com sua energia e procurando refletir de volta aquilo que voc�s demonstraram diariamente: cora��o, car�ter e idealismo. Vi voc�s crescerem, se casarem, ter filhos e iniciar jornadas pr�prias, novas e incr�veis. Mesmo quando as coisas ficaram �rduas e frustrantes, voc�s nunca deixaram que Washington os dominasse. A �nica coisa que me d� orgulho maior que tudo o que realizamos � pensar em todas as coisas not�veis que voc�s v�o realizar daqui em diante.
E a todos voc�s a� fora –a cada organizador que se mudou para uma cidade desconhecida, a cada fam�lia gentil que o acolheu, a cada volunt�rio que j� foi de porta em porta, a cada jovem que foi votar pela primeira vez, a cada americano que viveu e respirou o trabalho �rduo de conquistar mudan�as –voc�s s�o os melhores partid�rios e organizadores que seria poss�vel desejar, e serei eternamente grato. Porque, sim, voc�s mudaram o mundo.
� por isso que deixo este palco esta noite ainda mais otimista em rela��o a este pa�s do que estava quando come�amos. Porque sei que nosso trabalho n�o apenas ajudou tantos americanos; ele inspirou tantos americanos –especialmente tantos jovens a� fora– a acreditar que voc�s podem fazer uma diferen�a; a atrelar suas esperan�as a algo maior que voc�s mesmos. Esta gera��o que est� chegando –uma gera��o altru�sta, criativa, patri�tica–, eu vi voc�s em todos os cantos do pa�s. Voc�s acreditam em uma Am�rica justa e inclusive; sabem que as transforma��es constantes t�m sido a marca registrada da Am�rica, algo n�o a ser temido, mas abra�ado, e voc�s est�o dispostos a levar adiante este trabalho �rduo da democracia. Dentro em breve voc�s v�o nos superar em n�mero, e acredito que, gra�as a isso, o futuro estar� em boas m�os.
Meus concidad�os americanos, servir a voc�s tem sido a maior honra de minha vida. N�o vou deixar de faz�-lo; na verdade, estarei � sua disposi��o, como cidad�o, por todos os dias de vida que me restarem. Por enquanto, quer voc� seja jovem ou jovem de cora��o, tenho um �ltimo pedido a lhe fazer como seu presidente –a mesma coisa que lhe pedi quando voc� apostou em mim, oito anos atr�s.
Estou pedindo que voc� acredite. N�o em minha capacidade de trazer mudan�as, mas na de voc�s.
Estou pedindo que voc�s se aferrem � f� inscrita em nossos documentos fundadores; aquela ideia sussurrada por escravos e abolicionistas; o esp�rito cantado por imigrantes, lavradores e aqueles que marcharam pela justi�a; o credo reafirmado por aqueles que plantaram bandeiras em lugares desde campos de batalha no exterior at� a superf�cie da Lua; um credo que est� ao cerne de todo americano cuja hist�ria ainda n�o foi escrita:
Sim, n�s podemos.
Sim, n�s fizemos.
Sim, n�s podemos.
Obrigado. Deus os aben�oe. E que Deus continue a aben�oar os Estados Unidos da Am�rica.
Tradu��o de CLARA ALLAIN
Livraria da Folha
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenci�rio
- Livro analisa comunica��es pol�ticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade
Um mundo de muros
Em uma série de reportagens, a Folha vai a quatro continentes mostrar o que está por trás das barreiras que bloqueiam aqueles que consideram indesejáveis