Fechar embaixadas seria retrocesso impratic�vel, diz Celso Amorim
Fechar embaixadas e consulados do Brasil no exterior seria um "retrocesso impratic�vel", apesar do aperto or�ament�rio que tem deixado alguns postos sem dinheiro at� para pagar a conta de luz.
Essa � a opini�o do ex-chanceler Celso Amorim, que, com o ex-presidente Lula, ampliou expressivamente o n�mero de diplomatas no Itamaraty e os postos no exterior.
Para ele, � "esquisito" que o Brasil tenha deixado de participar ativamente na pol�tica internacional. Amorim lan�a em mar�o o livro "Teer�, Ramal� e Doha: Mem�rias da Pol�tica Externa Ativa e Altiva ", em que conta bastidores de negocia��es. Abaixo, trechos da entrevista que o ex-ministro deu � Folha.
Alan Marques/Folhapress | ||
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O ex-ministro de Rela��es Exteriores Celso Amorim acaba de lan�ar livro sobre passagem no Itamaraty |
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Folha - O Brasil, junto com a Turquia, negociou um acordo de troca de combust�vel nuclear com o Ir�, em 2010. Mas o acordo n�o foi aceito por pa�ses como Estados Unidos e Fran�a, que acabaram impondo san��es contra o Ir�. O fato de o Brasil ter costurado esse acordo mudou a estatura do pa�s no cen�rio internacional?
Celso Amorim - Na �poca, v�rios analistas diziam que, independentemente de o acordo ser ou n�o seguido, o Brasil demonstrou que a sua capacidade de a��o internacional de media��o. O pr�prio fato de hoje estarem discutindo um acordo provis�rio indica isso. N�s mostramos que era poss�vel. Pode ser que eles hoje cheguem a outro acordo, n�o sei se vai ser melhor. O estoque de ur�nio do Ir� hoje � muito maior do que era. Na �poca, daria para fazer uma bomba. Hoje em dia, d� para fazer umas quatro ou cinco. O acordo n�o foi para frente porque n�s n�o controlamos a pol�tica interna de certos pa�ses....
O ent�o presidente Lula se sentiu tra�do pelo l�der americano Barack Obama, porque os EUA incentivaram a media��o do Brasil e, na hora ag�, tiraram o corpo fora?
Essas palavras s�o muito pessoais, eu falo s� em meu nome. N�o estava fora dos nossos c�lculos que isso pudesse acontecer, mas n�s ach�vamos que, diante de um acordo exatamente nos termos que haviam sido solicitados, n�o ocorresse. N�o fizemos isso em momento algum para sermos bonzinhos com o Ir�. Temos interesses em ter rela��o com o Ir�, assim como todo mundo tem. Com o atual acordo provis�rio, Fran�a e Alemanha j� voltaram a vender para o Ir�. E n�s ficamos um pouco para tr�s. S�o quase 80 milh�es de habitantes, grande produtor de petr�leo, evidente que temos interesse. E se o Brasil quiser ter um papel no oriente M�dio, como eu acho que deve ter, n�o d� para ignorar o Ir�.
Voc� fala no livro que o pr�prio Obama teria dito que a demora em adotar san��es contra os iranianos poderia levar a um ataque de Israel contra o Ir�...
Sim, fiquei estarrecido e comentei com o presidente Lula: � o protetor com medo do protegido. � o reconhecimento da incapacidade de persuadir um aliado ultra-pr�ximo, que depende de voc� para muita coisa.
Em uma entrevista em 2010, o senhor me disse que uma autocr�tica que faria era a falta de estrat�gia do Brasil para lidar com a China. O que o senhor teria feito diferente?
N�o � que tenhamos negligenciado, o presidente foi � China v�rias vezes, agora mesmo fui sondado para presidir o Conselho Empresarial Brasil China. Mas no �ltimo ano e meio, dei relativamente pouca aten��o � China. A China � t�o grande, � como os EUA. A gente deve ter uns 10 consulados nos EUA e dever�amos ter no m�nimo o mesmo n�mero na China. Mas todo mundo criticava que eu tinha criado muito consulado, muita embaixada.
Inclusive nos EUA h� v�rios consulados sem dinheiro para pagar a conta de luz, de aquecimento...
Isso eu n�o vou comentar.....
Mas voltando � China, talvez pud�ssemos ter feito mais. Assinamos um acordo de coopera��o em defesa com a China recentemente. Nessa �rea, n�s temos que cooperar igualmente com todos os Brics,
Com a R�ssia tamb�m?
Eu n�o vejo porque n�o. N�o � para ter um acordo de defesa com a R�ssia, mas material, transfer�ncia de tecnologia. Ci�ncia e tecnologia n�o v�m com ideologia carimbada.
Muita gente condena o fato de o Brasil ter apostado tudo na rodada multilateral da OMC e n�o ter outros acordos comerciais de peso....
N�s e a torcida do Flamengo apostamos na OMC. E a coisa que mais interessava ao Brasil eram os subs�dios agr�colas, e isso s� seria resolvido na rodada multilateral. Outros pa�ses queriam acordos que nos obrigariam a fazer muito mais concess�es do que eram exigidas em Doha. Com a pol�tica industrial atual, que ainda quer fortalecer a ind�stria brasileira, � muito dif�cil. N�o sou contra um acordo com a UE, mas continuo achando que o acordo multilateral � essencial para o Brasil. � preciso ver se a UE far� concess�es e se as exig�ncias que eles nos far�o n�o ser�o de tal ordem que liquidem qualquer possibilidade de pol�tica industrial ou tecnol�gica. Tem que ser bem negociado, porque os negociadores do outro lado contam com o apoio da m�dia deles e da nossa.
No livro, o senhor elogia o ex-presidente americano George W Bush e critica Obama. Para o Brasil, qual dos dois foi melhor?
A atitude mais pacifista do Obama � muito positiva, apesar das idas e vindas, como no caso do Ir�. Mas o Bush era mais direto, tinha di�logo franco, e no Obama eu nunca percebi a mesma confian�a. Ele era paternalista. N�s oferecemos situa��es que ajudariam o Obama, n�o s� em rela��o ao Ir�, mas em rela��o � Venezuela e ao Equador, e ele n�o deu aten��o. O Bush e os republicanos t�m uma vis�o mais realista, eles compreendem melhor a import�ncia do Brasil. No partido Democrata h� uma tend�ncia de tratar tudo como se fosse "hemisf�rio ocidental". Nesse sentido o Bush foi mais positivo.
Voc� diz que o presidente Lula tinha muito clara a import�ncia da pol�tica externa. Como era o relacionamento entre voc�s dois?
Eu sentia que eu tinha a confian�a do presidente Lula, que podia ir adiante, e se por acaso fizesse algo que n�o correspondia, ele diria � Celso, o que que � isso, e a gente ia discutir e por tudo em pratos limpos. Ele se interessava por pol�tica externa.
E com a presidente Dilma como era o relacionamento?
Pessoal? Muito bom, respeitoso, gosto muito da presidenta.
Mas era um estilo bastante diferente?
Ela � que � a presidenta, a pessoa � que precisa se adaptar a ela, e n�o vice-versa.
O senhor escreveu recentemente um artigo para Folha sobre a falta de recursos para o Itamaraty. Existe uma discuss�o agora sobre a necessidade de fechar alguns postos no exterior, j� que n�o h� or�amento....
Eu n�o acredito que isso ocorra. Isso seria um retrocesso impratic�vel para um pa�s como o Brasil. H� pa�ses que est�o em decl�nio, foram grandes pot�ncias e hoje n�o mais. Eles podem at� pensar dessa maneira. O Brasil n�o pode pensar dessa maneira. � um recurso t�o pequeno (do Itamaraty) que isso n�o vai ter peso no conjunto das coisas. Os postos no exterior s�o essenciais, t�m um efeito multiplicador. Cresceu muito o volume de neg�cios que o Brasil passou a fazer nos pa�ses �rabes, na �frica. A escolha do Brasil para ser sede das Olimp�adas, a elei��o do Roberto Azev�do na OMC, Jos� Graziano na FAO. Nenhum pa�s tem a FAO e a OMC ao mesmo tempo se n�o tem tamb�m uma boa diplomacia. Um pouco de dinheiro isso envolve. Mas dentro do Or�amento da Uni�o � m�nimo.
Em 2014, houve uma reuni�o internacional sobre a guerra civil na S�ria, realizada em Montreux, na Su��a. O Brasil foi convidado, mas a presidente Dilma resolveu n�o enviar o chanceler, na �poca o Luiz Alberto Figueiredo. Naquela ocasi�o, encontrei com um diplomata estrangeiro que achava estranho o Brasil ter lutado tanto para ter um lugar � mesa, e agora n�o participar.
Eu tamb�m acho muito esquisito. Quando nos convidaram para ir a An�polis (nos EUA, confer�ncia sobre Oriente M�dio em 2007), o Brasil estava l�. Fui numa confer�ncia at� sobre Afeganist�o, o Brasil era o �nico pa�s latino-americano convidado. S�o certas coisas que voc� tem que fazer. Eu e o presidente Lula, n�s temos uma vis�o de que o Brasil deve ter uma participa��o intensa. Mas estou otimista, tenho muita confian�a no Mauro Vieira (chanceler), trabalhamos juntos v�rias ocasi�es, foi meu chefe de gabinete, esteve em Buenos Aires.
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