O verão traz grandes oportunidades para negócios sazonais, mas também desafios ao longo do ano.
Conhecer o calendário do segmento e traçar estratégias para os outros meses é a chave para não passar aperto, diz Rubens Massa, professor do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da FGV-Eaesp (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas).
"Uma vez que você entende o ritmo da sua empresa, você consegue gerir melhor seus recursos, seja de compras, de vendas ou de equipe", afirma.
A época em que o movimento é menor, por exemplo, pode ser ideal para organizar resultados e se preparar para a próxima temporada de alta.
"A otimização do tempo é o maior gargalo, principalmente para quem precisa organizar os dados e ainda não têm ferramentas de projeção. É importante entender as necessidades de caixa e de estoque e o fluxo de clientes. O planejamento não pode se basear em ‘achismos'", afirma Monica Lemes, consultora de negócios do Sebrae.
Ela aponta também a oferta de produtos diversos como alternativa para aumentar os ganhos. "É importante entender qual variedade de itens e serviços a empresa pode oferecer nos meses mais frios, sem perder a identidade da marca."
Mesmo que as vendas sejam menores, ela acrescenta, manter o produto principal em evidência é importante para os clientes e ajuda a fortalecer a marca.
Para Rubens Massa, no caso de negócios em que não é possível diversificar o mix de produtos, a redução dos custos é uma alternativa.
Veja, a seguir, histórias de quem está na gestão de negócios que costumam encher durante o verão.
'Vender no verão para se manter no inverno’
Priscila Jardim, 36, proprietária de três lojas da franquia Oggi Sorvetes
Abri a primeira loja em Suzano (SP) em agosto de 2018, então peguei poucos meses de frio. O primeiro ano deu muito certo e as vendas explodiram. Eu me surpreendi. Em 2019, abri a segunda unidade e também um quiosque em um shopping da cidade. O quiosque não dava retorno, então o fechei em março de 2020, dias antes de estourar a pandemia. Em setembro, abri a terceira unidade.
Tem sido bem desafiador. No clima frio, tenho bastante dificuldade com a queda de movimento, então é vender no verão para se manter no inverno.
É difícil fazer um planejamento, porque mesmo quando a gente espera um período quente, imaginando que as vendas vão aumentar, a temperatura cai e temos dois meses sem sol. Neste ano ‘cancelaram’ o verão e só chove. E o sorvete ainda está muito associado ao calor.
No clima frio, as vendas não são suficientes para manter os custos fixos. Então tento dar férias para alguns funcionários e negociar o aluguel. O desafio tem sido manter o capital de giro neste cenário de pandemia e crise, que é um pouco assustador.
Nesses dois anos eu usei recursos que o governo ofereceu por causa da crise, de redução de jornada.
No meu caso, tenho a limitação de vender apenas sorvete —não é uma bomboniere com variedade de doces, por exe mplo. São várias linhas de picolé e de sorvetes de pote.
No último inverno, criei um livro de receitas para o frio, para o cliente retirar na loja. Havia, por exemplo, um cappuccino com sorvete de creme e uma sobremesa quente que levava uma bola de sorvete por cima.
O cliente ia até a loja buscar o material e acabava comprando o sorvete para fazer a receita em casa.
‘Chuva em dois finais de semana já impacta o resultado do mês’
Pedro Döhnert, 38, gerente-geral do hotel Doral Guarujá
Temos oscilações constantemente. O hotel é um típico empreendimento de lazer, dependemos muito das condições do clima.
Tentamos usar a criatividade, com promoções temáticas para que o cliente queira se hospedar aqui mesmo fora do verão. Somos um hotel dog friendly [que aceita cachorros] e, no último mês de agosto, em que o movimento é mais fraco, fizemos uma parceria com um pet shop para receber ‘pais de pets’.
Esperamos um aumento na ocupação em fevereiro, mas existe o receio das pessoas de voltar a viajar, devido à gripe e à variante ômicron, e o medo de gastar dinheiro com lazer devido à crise econômica.
A gente se prepara para não faltar nem sobrar nada, mas se chove em dois finais de semana do mês isso já impacta o resultado que esperávamos. Temos uma equipe fixa de 25 funcionários, e a contratação de temporários varia conforme a demanda —pode chegar a 30 a mais.
Mesmo com todos esses desafios, não vejo a sazonalidade como uma desvantagem, o hotel já foi projetado pensando nisso. Fora isso, tentamos oferecer lazer com outras abordagens, gastronomia e pequenos eventos. Em alguns meses fechamos no vermelho, o que é inevitável.
‘Num período de baixa, olhamos atentamente para a nossa cliente’
Francielly Moyses, 28, sócia-proprietária da marca de roupas Tudo Afro
Eu e minha irmã, Fabiele, 34, começamos a Tudo Afro em julho de 2020, com vendas online de peças de roupa feminina com estampas étnicas para valorizar a estética afro. Em Niterói (RJ) quase não há opções de moda afro. Biquínis são ainda mais raros.
Em setembro de 2020, uma das nossas primeiras clientes foi a influenciadora Gabi Oliveira, que tem mais de 500 mil seguidores só no Instagram. Ela falou sobre a peça que tinha comprado na loja, e o post levou a marca para o país inteiro. Isso fez do nosso verão de 2020 um sucesso, mas nós não estávamos preparadas.
A marca era pouco conhecida e precisávamos correr contra o tempo para confeccionar tudo e atender o público. Depois, as vendas se estabilizaram e, com a aproximação do inverno, os pedidos diminuíram. Foi quando começamos a vender também moda fitness, que nos manteve ativas durante o período mais frio.
Mas, mesmo nos períodos de baixa procura não paramos de produzir os biquínis, porque é por meio deles que a cliente chega até nós, a moda praia é a nossa cara.
Foi nesse primeiro período de baixa que olhamos mais atentamente para quem é a nossa cliente: são mulheres negras, com corpos reais, que buscam representatividade.
Neste verão, nos planejamos para o lançamento de estampas exclusivas e para atender novos públicos além do feminino, com produtos infantis e masculinos.
Nossa intenção, no início, era atender o público local, mas, com a visibilidade que tivemos, entendemos que mulheres negras do país todo procuram roupas que conversem com a sua identidade. Hoje, além do Rio de Janeiro, os estados que mais atendemos são Bahia e São Paulo.
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