Com perdas de receita e dificuldades logísticas, pequenos negócios da Amazônia são forçados a buscar alternativas para sobreviver durante a crise. Entre as saídas encontradas estão o financiamento coletivo e as vendas de produtos online.
“As empresas tiveram redução média de 70% no faturamento. O acesso às matérias-primas se tornou mais difícil e mais caro, porque muitas comunidades extrativistas ficaram isoladas”, diz Mariano Cenamo, coordenador do programa de aceleração do PPA (Plataforma Parceiros pela Amazônia), rede que reúne ONGs, companhias privadas e órgãos internacionais.
Com o avanço do novo coronavírus, a entidade fez um plano para atender empreendedores da Amazônia em cinco frentes. Uma delas foi a criação de um fundo de capital de giro para fazer aportes de até R$ 20 mil em empresas com dificuldades financeiras, a juro zero ou fundo perdido (que não precisa ser pago).
Os recursos do fundo emergencial já foram aplicados em sete negócios e devem ajudar os empresários a formar estoques, comprar insumos de comunidades ribeirinhas e renegociar dívidas com credores.
A rede também fez parcerias com canais de venda online, para facilitar o escoamento dos produtos amazônicos.
Um desses acordos foi com o Mercado Livre, que abriu espaço em junho para dez empreendedores da floresta na área destinada a produtos sustentáveis na plataforma. Logo na primeira semana, a categoria alcançou 60 mil acessos, um crescimento de 100%.
A empresa de ecommerce promoveu ainda mentorias com os empreendedores. “O comércio eletrônico é um desafio para muitos deles. Com a iniciativa, buscamos ajuda-los a romper barreiras e dar visibilidade aos produtos da Amazônia”, afirma Laura Motta, gerente de sustentabilidade do Mercado Livre.
Boa parte dos negócios já tinha planos de criar ou reforçar suas próprias lojas online. A Da Tribu, de Belém, conseguiu aumentar suas vendas em 20% com a iniciativa do Mercado Livre e agora está reestruturando seu ecommerce.
A microempresa familiar, criada pela produtora cultural Tainah Fagundes, 37, e sua mãe, Kátia Fagundes, 56, produz acessórios (colares, anéis, brincos e pulseiras) com insumos da floresta, como fios de algodão revestidos de látex comprados de uma comunidade de seringueiros da Ilha de Cotijuba, no Pará.
No início da pandemia, as vendas cessaram, e as empreendedoras cogitaram fechar o negócio. “Foi um susto, ficamos dois meses sem vender um único brinco. Mas vimos que existem pelo menos 30 pessoas na nossa cadeia de fornecedores que dependem da empresa e unimos forças para continuar”, diz Tainah.
A Da Tribu criou uma campanha de financiamento coletivo atrelada à venda de produtos para ajudar a comunidade de fornecedores. A iniciativa arrecadou R$ 5.400 em junho e ainda está no ar.
Além disso, recebeu um aporte de R$ 20 mil do fundo de capital de giro do PPA. O dinheiro está sendo usado no desenvolvimento de uma nova linha de produtos.
O financiamento coletivo também foi uma das estratégias de sobrevivência da Na Floresta. Com sede em Manaus, a microempresa produz e comercializa chocolates e outros itens tendo como matéria-prima cacau de origem amazônica comprado de uma rede de 32 produtores de comunidades ribeirinhas dos rios Madeira e Amazonas.
Os produtos, cuja marca de chocolates Na’Kau é o carro-chefe, são vendidos em lojas físicas em 16 estados.
Com vários pontos de venda fechados, o faturamento chegou a cair 80% nos meses de março e abril. A companhia teve que demitir 6 dos 9 funcionários e lançou uma campanha de financiamento coletivo.
Nela, disponibilizou kits de chocolates atrelados a uma doação para profissionais essenciais que estavam trabalhando na pandemia.
“O objetivo inicial era arrecadar R$ 25 mil, mas a resposta surpreendeu. Conseguimos 250 apoiadores e batemos R$ 40 mil”, diz Artur Coimbra, 37, fundador da Na Floresta.
Os recursos ajudaram a companhia a reestruturar sua operação e fortalecer a área comercial, com aposta no comércio eletrônico.
A Na Floresta está vendendo chocolates na plataforma do Mercado Livre e em outros três marketplaces e deve lançar neste ano sua própria loja online. “Foram meses difíceis, mas estamos nos reerguendo”, afirma Artur.
Também no ramo de alimentação, a Taberna da Amazônia conecta pequenos empreendedores da região Norte com o mercado consumidor do restante do país.
A empresa trabalha com cerca de 50 itens, entre castanhas, farinhas, molhos de pimentas, geleias de frutas regionais, cachaça de jambu, tucupi e cestaria amazônica.
Seus principais canais de venda eram feiras e eventos gastronômicos, mas a pandemia paralisou os negócios por quase três meses.
As restrições da malha aérea no início da quarentena também dificultaram o envio dos produtos da sede, em Manaus, para os consumidores da região Sudeste.
A estratégia encontrada por Anne Mello, 34, fundadora da Taberna da Amazônia, para driblar a crise foi ofertar vales-compra que vão de R$ 60 a R$ 120, por meio de canais como WhatsApp e Instagram.
A comercialização de produtos no Mercado Livre também possibilitou retomar parte do faturamento.
“Ainda não é nem metade do que faturávamos antes da pandemia, mas o movimento está voltando aos poucos”, afirma Anne. Agora, a empresa está estruturando seu próprio ecommerce, que deve ser lançado até setembro.
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