Pequenos empresários reinventam seus negócios para que eles sigam funcionando em meio à pandemia de Covid-19. As táticas anticrise vão de mudança de produto carro-chefe a oferta de voucher com desconto para quem comprar agora serviços que serão usufruídos só quando tudo voltar ao normal.
O restaurante vietnamita Bia Hoi, em São Paulo, viu o número de clientes minguar antes mesmo de a cidade proibir o atendimento no salão. No último fim de semana em que ficou aberto, apenas cinco fregueses apareceram.
"Recebemos, em média, 150 clientes no sábado e 100 no domingo", diz Fernando Brito, 32, que comanda a casa com Dani Borges, 39, sua mulher.
Nos dias seguintes, eles migraram para o sistema de delivery, mas não deu certo. "Temos ticket médio alto (R$ 80) e servimos comida vietnamita. O supérfluo é a primeira coisa que as pessoas cortam na crise", afirma ele.
O casal, então, adotou o modelo de vouchers para tentar ao menos manter o emprego de seus 12 funcionários, já que não devem ter faturamento durante o período.
O cliente compra um crédito de R$ 30, R$ 50 ou R$ 100 que se transformará em consumo de, respectivamente, R$ 40, R$ 65 e R$ 140 quando o restaurante voltar a abrir.
Nos nove primeiros dias de campanha, foram arrecadados R$ 2.300. Todo o valor vai para o pagamento de pessoal. Em tempos normais, o Bia Hoi, aberto em 2017, fatura R$ 150 mil por mês.
Já a empresária Heloísa Morgado, 33, teve de mudar o carro-chefe do seu negócio para tentar sobreviver à crise. Dona de franquia da Sterna Café num prédio comercial na zona oeste paulistana, ela conta que 99% de seus fregueses trabalham no edifício.
A queda no movimento veio a partir do dia 13, quando a clientela começou a fazer home office. O número de pedidos caiu de 350 para 42.
A empresária decidiu, então, deixar o café de lado e entregar comida em domicílio. Montou um sistema no qual oferece pacotes de refeições para cinco, dez ou 15 dias, com preços entre R$ 220 e R$ 679.
"Há pessoas que trabalham de casa, mas não têm tempo para cozinhar, porque a agenda segue intensa. É esse cliente que busco", afirma.
Para divulgar o serviço, conseguiu a ajuda de uma influenciadora digital, com 107 mil seguidores. Até quinta (26), Heloísa havia vendido 200 refeições e 15 pacotes de salgados, o equivalente a 8% de seu faturamento bruto mensal. A loja existe desde 2018 e emprega sete pessoas. Os funcionários devem ser mantidos.
Dono da marca de scooters elétricas Voltz, o pernambucano Renato Villar, 32, está usando a tecnologia e os próprios clientes a seu favor para passar pelo período difícil.
Com showrooms físicos fechados, a empresa montou uma espécie de mostruário virtual, com a ajuda de quem já é proprietário de uma moto, para esclarecer dúvidas de outros potenciais compradores.
Num grupo do aplicativo de mensagens Telegram com 340 pessoas (45 das quais já são clientes), são discutidas especificidades de cada modelo.
Quem indica um novo cliente ganha pontos, que podem ser trocados por capacetes ou por créditos na compra de uma scooter. Antes da crise, entre seis e sete modelos eram vendidos por dia. Hoje, são entre quatro e cinco.
O maior impacto foi o adiamento de contratos que fariam a marca crescer. Com oito showrooms pelo país (PE, AL, RN e PB), a Voltz pretendia abrir mais 13 neste ano. A empresa, que começou a operar em novembro, faturou cerca de R$ 5 milhões desde então.
Em momentos de crise, pequenos empresários devem criar produtos e serviços, mesmo que diferentes dos que estão habituados a vender, para seguir funcionando, diz Adriano Campos, consultor do Sebrae-SP. "Ainda que não seja a coisa mais lucrativa do mundo, é uma alternativa para passar pelo período."
Também é preciso manter boa comunicação com a clientela. "Se a empresa seguir funcionando, é essencial dizer quais medidas de prevenção toma com seus produtos e equipe para evitar a disseminação do vírus", diz.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.