Editora-executiva do Washington Post deixa cargo após CEO contestar reportagem que o cita

Will Lewis disse que matéria sobre ação movida por príncipe Harry por invasão telefônica não merecia publicação

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Benjamin Mullin Katie Robertson
The New York Times

Semanas antes de a editora-executiva do jornal The Washington Post renunciar ao cargo no domingo (2), sua relação com o CEO da empresa ficava cada vez mais tensa.

Em meados de maio, os dois entraram em conflito sobre a decisão de publicar uma reportagem sobre um escândalo britânico com algumas conexões com o CEO do Post, Will Lewis, de acordo com duas pessoas a par da relação.

A editora, Sally Buzbee, disse a Lewis que a Redação planejava cobrir uma decisão judicial de um processo em curso no Reino Unido movido pelo príncipe Harry contra alguns tabloides do magnata da mídia Rupert Murdoch, disseram as pessoas —ele acusa os veículos de obter informações de forma ilegal.

Sede do jornal The Washington Post, em Washington, nos EUA - Eric Baradat/AFP

Como parte da decisão, o juiz deveria dizer se os autores da ação poderiam adicionar o nome de Lewis a uma lista de executivos acusados de ocultar evidências de interceptação telefônica nos jornais.

De acordo com interlocutores, Lewis disse a Buzbee que o caso envolvendo-o não justificava cobertura.

Quando Buzbee disse que o Post publicaria a reportagem de qualquer forma, ele disse que sua decisão representava uma falha de julgamento e encerrou abruptamente a conversa.

A interação abalou Buzbee, que então consultou confidentes de fora do Post sobre como deveria lidar com a situação. Quando o juiz decidiu, em 21 de maio, que Lewis poderia ser adicionado ao caso, o Post publicou uma reportagem sobre a decisão.

Lewis não impediu a publicação do artigo. Mas o incidente continuou a recair sobre Buzbee enquanto ela considerava seu futuro no jornal, de acordo com as duas pessoas com conhecimento da situação. Sua decisão de renunciar abalou uma das principais empresas de notícias dos Estados Unidos.

A interação sobre a decisão judicial não foi a razão principal para sua renúncia. Buzbee já estava repensando seu futuro no Post por causa de um plano de Lewis para reorganizar a Redação apresentado a ela em abril, disseram as pessoas.

Lewis havia oferecido a Buzbee um cargo para liderar uma nova divisão focada em redes sociais e jornalismo de serviço, de acordo com as pessoas. Ela considerou isso um rebaixamento, já que seu cargo de editora-executiva exigia supervisionar toda a divisão de reportagem.

Um porta-voz do Post se recusou a comentar. Buzbee também se recusou a comentar.

A ex-editora-executiva do Washington Post, Sally Buzbee, em evento do jornal realizado em 2022 - Anna Moneymaker/Getty Images via AFP

Lewis foi nomeado por Jeff Bezos, dono do Washington Post e fundador da Amazon, no final do ano passado para reformular o jornal após uma acentuada queda de audiência e perdas anuais na casa dos milhões de dólares.

Nos últimos meses, Lewis, que anteriormente era CEO da News Corp, que publica o Wall Street Journal, vinha formulando uma estratégia para reformular o negócio.

Ele decidiu dividir o jornal em três núcleos: uma Redação principal que cobre política, economia e outros tópicos; uma seção de opinião; e uma nova divisão que se concentraria em redes sociais, como narrativas em vídeo, jornalismo de serviço e cobertura de bem-estar e estilo de vida. O Post está atualmente dividido em duas partes, notícias e opinião.

Ao oferecer a Buzbee um papel na liderança da divisão de redes sociais e jornalismo de serviço, de acordo com pessoas a par do assunto, Lewis disse que ela poderia opinar sobre a contratação do editor-executivo que supervisionaria o braço de notícias.

Ele depois disse-lhe que havia selecionado Robert Winnett, editor do Daily Telegraph que havia trabalhado com Lewis, disseram as pessoas.

A conversa entre Lewis e Buzbee sobre a cobertura do processo ocorreu em uma sala de conferências em uma reunião executiva fora da Redação do Post. Na reunião, executivos do Post discutiram as mudanças planejadas por Lewis.

Os editores ocasionalmente alertam os principais executivos sobre reportagens delicadas antes de serem publicadas. Em 2013, Martin Baron, o editor de longa data que antecedeu Buzbee, informou a publisher do Post, Katharine Weymouth, antes da publicação de reportagens sensíveis sobre a NSA (National Security Agency).

Em 1971, Ben Bradlee, um editor-chefe combativo, avisou Katharine Graham, a ex-proprietária do Post, antes que o jornal publicasse artigos sobre os Pentagon Papers, que revelaram a história secreta da Guerra do Vietnã.

Lewis não se pronunciou na reportagem do Post sobre a decisão do juiz. Mas, em várias entrevistas anteriores, ele negou as alegações de que encobriu as interceptações telefônicas durante seu período como executivo de Murdoch. O Post publicou um artigo em março sobre o processo que também mencionava Lewis.

Em uma reunião com a equipe na segunda-feira (3), Lewis defendeu sua estratégia de negócios, dizendo à Redação que o Post teve prejuízo de US$ 77 milhões no ano anterior, viu uma queda de 50% na audiência desde 2020 e precisava fazer mudanças radicais para ter sucesso.

"Não vamos amenizar. Precisa ser revertido, certo?", disse ele, de acordo com uma gravação da reunião. "Estamos perdendo grandes quantias de dinheiro. A audiência caiu pela metade nos últimos anos. As pessoas não estão lendo o que vocês produzem."

Ele continuou: "Tive que tomar ações decisivas e urgentes para nos colocar em um caminho diferente, buscando talentos com quem trabalhei e que são os melhores dos melhores dos melhores."

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