Descrição de chapéu
Zeynep Tufekci

Você não precisa se preocupar com os aviões da Boeing

Empresa, no entanto, deve mostrar que está trabalhando para melhorar qualidade e segurança

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Zeynep Tufekci

Colunista do New York Times

The New York Times

"Ah, é um Boeing Max", exclamei para meus companheiros de viagem depois de embarcarmos em nosso avião, algumas semanas atrás.

Eu olhei para ver se estávamos sentados ao lado de um painel de plugue de porta escondido, como o que explodiu no voo 1282 da Alaska Airlines em janeiro.

Não estávamos, mas, seguindo uma tendência nas redes sociais, fizemos algumas piadas às custas da Boeing. "Talvez eles possam nos cobrar mais, dizendo que é um assento de janela potencialmente maior."

Boeing 737 Max 9 em construção na fábrica da empresa em Renton, Washington, nos Estados Unidos - Jason Redmond - 13.fev.2017/Reuters

O FBI informou recentemente aos passageiros do fatídico voo da Alaska Airlines que eles podem ter sido vítimas de crime.

A agência não explicou o motivo, mas a Boeing disse ao Senado que não consegue encontrar documentação exata de como o plugue da porta foi removido e reinstalado, embora a empresa tenha reconhecido que deveria ter mantido tais registros.

Diante de tudo isso, a empresa anunciou na semana passada que está substituindo seu CEO.

Mas as más notícias não pararam por aí: na quinta-feira (28), uma investigação do New York Times mostrou um padrão perturbador de procedimentos de segurança descuidados e cortes de custos perigosos.

Um especialista que passou mais de uma década na Boeing disse ao Times: "A questão é: atalhos por todo o canto —não fazendo o trabalho corretamente".

Não é de se admirar que alguns viajantes estejam tentando evitar aviões da Boeing. O Kayak, site de reservas de viagens, notou um aumento no número de pessoas tentando evitá-los; recentemente tornou esse filtro de pesquisa mais proeminente e até adicionou uma opção para evitar modelos específicos.

Os problemas da Boeing, por maiores que sejam, são apenas um dos motivos pelos quais os consumidores podem estar cautelosos em voar.

A United Airlines agora também enfrenta escrutínio por uma série de incidentes de segurança, embora muitos especialistas digam que os problemas lá não parecem ser sistêmicos.

O maior perigo de todos pode ser controladores de tráfego aéreo com poucos funcionários e pistas de pouso superlotadas, o que leva a um número muito grande de potenciais colisões.

Pessoalmente, não fico preocupada em voar, e, além de fazer algumas piadas infelizes, não mudei meu comportamento. Por isso, não me preocupei em verificar se estaria voando em um Boeing Max, ou em qualquer tipo de avião da Boeing, até depois de embarcar.

A trajetória da Boeing como corporação, no entanto, é outra questão. Vai ser preciso muito mais do que uma reorganização no topo para resolver os problemas dessa empresa.

Mas o fato de a Boeing ter conseguido cortar tantos cantos é um testemunho das camadas e camadas de verificações, redundâncias e treinamentos que foram incorporados à indústria da aviação. A segurança da aviação é robusta desse jeito porque a tornamos assim.

Duas coisas aparentemente contraditórias e ambas verdadeiras: as companhias aéreas comerciais dos EUA passaram incríveis 15 anos sem uma única morte em acidentes. E há uma enorme crise de segurança na aviação comercial que precisamos urgentemente resolver.

A aviação comercial é um sistema complexo que envolve muitas dinâmicas: tecnologia, engenharia, cultura corporativa, regulamentação, clima, fatores humanos, política e muito mais.

É extremamente difícil prever o que surgirá de tantas coisas diferentes interagindo ao mesmo tempo —um exemplo do chamado efeito borboleta, no qual um pequeno inseto batendo as asas leva a mudanças climáticas significativas do outro lado do mundo.

E, embora testar cada parte do sistema individualmente seja necessário, não é suficiente, já que é a interação de muitas peças móveis que cria esses problemas difíceis de se prever. Resolver equações não será suficiente para gerenciar tudo isso, porque esses sistemas desafiam cálculos simples.

No entanto, temos métodos para gerenciar sistemas complexos e críticos em termos de segurança, e, se feitos corretamente, podem funcionar muito bem.

Talvez a medida mais importante seja a redundância, a camada de precauções. Como até mesmo uma falha mínima poderia desencadear uma cadeia de eventos catastrófica, é importante fortalecer tudo. Por isso, muitas partes dos aviões têm duplicatas ou backups, e grande parte da produção e manutenção dos aviões está sujeita a inspeções de várias pessoas.

A redundância, no entanto, embora seja ótima para a segurança, é cara.

O primeiro acidente do Boeing 737 Max ocorreu na Indonésia em 2018. Todos a bordo morreram. O seguinte foi em 2019, na Etiópia. Não houve sobreviventes daquele voo também.

Depois disso, os aviões —que estavam voando globalmente há mais de um ano— foram proibidos de voar pela FAA (agência de aviação dos Estados Unidos). Aproximadamente 387 deles haviam sido entregues naquela época, e mais 400 ou algo assim estavam em produção.

O público mais tarde descobriu que a Boeing havia adicionado um novo sistema de software aos aviões para ajudar a mantê-los estáveis. Como o sistema fazia com que os aviões se comportassem mais como modelos antigos da Boeing, com os quais os pilotos já estavam familiarizados, a empresa obteve permissão da FAA para evitar o treinamento adicional nos modelos novos (uma economia para as companhias aéreas que os compraram) ou até mesmo informar os pilotos sobre isso.

É difícil escapar à conclusão de que aqueles na empresa que tomaram todos esses atalhos pensaram que o sistema, com todas as suas redundâncias, os salvaria. Mas isso é um risco. Em algum momento, dois, três ou quatro acidentes improváveis se alinharão.

Um representante da Boeing me disse que a empresa estava assumindo a responsabilidade e trabalhando para melhorar a qualidade. Mas precisamos ver ação, não promessas.

Então, por que alguém ainda deveria voar nos aviões da Boeing? Ou simplesmente voar? Porque as estatísticas ainda mostram que a aviação comercial é milagrosamente segura, muito mais do que todas as outras formas de viajar.

Embora eu não verifique quem fabricou os aviões que eu voo, eu mantenho o cinto de segurança mesmo quando o capitão diz que não é necessário. Fora isso, estou o mais confortável possível durante os voos.

Eu sei que, no geral, a viagem aérea é um sistema bem regulamentado, com tripulações altamente treinadas, camadas e camadas de precauções de segurança e uma dedicação para aprender com acidentes passados. Vamos manter assim.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.