A Alemanha registra um recorde de vagas de trabalho em aberto: no primeiro trimestre de 2022, elas alcançaram 1,74 milhão, a maior cifra desde a reunificação do país, em 1990.
Ao mesmo tempo, há um pronunciado envelhecimento da população: em julho, apenas 10% tinham entre 15 e 24 anos de idade, enquanto 20% estavam acima dos 65 anos. A taxa de natalidade nacional é baixa demais para compensar essa tendência, e uma consequência é que o sistema estatal de aposentadoria encontra-se sob severa pressão.
Como contramedida, no começo de agosto o presidente da Gesamtmetall, a federação das associações patronais dos setores metalúrgico e de engenharia elétrica, Stefan Wolf, propôs que se eleve a idade de aposentadoria para 70 anos. Sindicatos, grupos sociais e de esquerda reagiram furiosos.
O líder do partido A Esquerda, Dietmar Bartsch, classificou a ideia de "bullshit antissocial"; enquanto o ministro do Trabalho, Hubertus Heil, do SPD (Partido Social-Democrata), de centro-esquerda, descartou a proposta como sendo um "debate-fantasma".
Prova de fogo para o sistema de aposentadoria alemão
No momento, o país está no processo de passar gradualmente de 65 para 67 anos a idade mínima para os nascidos depois de 1967. Na verdade, desde a década de 1980 economistas vêm advertindo que o sistema de pensões alemão está ameaçado de colapso.
Em resposta, o então ministro do Trabalho, o democrata-cristão Norbert Blum, assegurava, em 1986: "As aposentadorias estão seguras." Hoje em dia, porém, essa afirmativa está difícil de sustentar.
Na Alemanha, as aposentadorias são principalmente financiadas por uma espécie de sistema "pague enquanto trabalha": a maioria dos cidadãos –excetuados os funcionários públicos e os autônomos– contribui para o fundo estatal de aposentadoria, com o qual se pagam as aposentadorias aos que já cumpriram seu tempo de serviço.
Atualmente os assalariados contribuem com pouco mais de 9% de seu salário, cabendo ao empregador uma alíquota equivalente. Entretanto esse tipo de sistema só funciona havendo suficientes trabalhadores na ativa para cobrir as aposentadorias em curso. E aí é onde o envelhecimento da população se torna um problema.
"Aumentar a idade da aposentadoria é sempre uma medida muito impopular, por isso é postergada ao máximo pelos políticos", observa Johannes Rausch, do Munich Center for the Economics of Aging (MEA). "Mas posso imaginar que em meados dos anos 2030, quando estivermos no meio da mudança demográfica, algo vá ocorrer."
Ele prevê que mais cedo ou mais tarde a idade da aposentadoria subirá para refletir a expectativa de vida crescente. Desse modo, haveria suficientes contribuintes para financiar o sistema, evitando-se um aumento das alíquotas e possibilitando remunerações mais altas.
Imigração e integração ao mercado de trabalho formal
A Alemanha não estaria sozinha em introduzir tal medida: a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) antecipa que a idade de aposentadoria média para quem esteve continuamente empregado subirá para 66,1 anos para os homens e 65,5 anos para as mulheres.
Nos países em que a idade de dispensa já é vinculada à expectativa de vida, entre os quais Dinamarca, Itália e Estônia, já se delineia um incremento significativo do início da aposentadoria.
Johannes Geyer, vice-diretor para economia pública do DIW (Instituto Alemão de Pesquisa Econômica), acredita que o efeito quantitativo de tal medida seria meramente simbólico.
"É uma questão de distribuição: quem arca com o peso da mudança demográfica? Elevar a idade de aposentadoria coloca grande pressão sobre a população trabalhadora. Quem tem baixa expectativa de vida e problemas de saúde é que vai sofrer mais: uma parte relevante da população morre antes de atingir a aposentadoria."
"Precisamos de imigração. É essencial termos gente suficiente vindo do exterior para a Alemanha", prossegue Geyer. "O governo está tentando facilitar o reconhecimento das qualificações dos imigrantes. Também vemos algumas melhorias nos regulamentos para requerentes de asilo e com status de 'tolerados', para que sua permanência seja legalizada e se reconheçam os títulos profissionais obtidos fora da Alemanha. Isso ainda é um problema."
Além disso, há os potenciais domésticos: "Temos um amplo setor dos que trabalham nos assim chamados 'mini-jobs', ou seja, empregos marginais, mal pagos e não sujeitos a impostos ou contribuições para a previdência", frisa o especialista do DIW. "Se pudermos transferir essas pessoas para empregos regulares, isso também ajudaria o sistema."
Jornadas mais longas, contribuições maiores
Outro recurso potencial seria providenciar ocupação para os desempregados e reabilitar quem foi forçado a se aposentar precocemente devido a problemas de saúde, prossegue o subdiretor do DIW. Esse é o caso de milhões de indivíduos, embora muitos deles estejam impossibilitados de trabalhar em tempo integral, por motivos que vão da própria condição médica ao comprometimento com o cuidado de familiares.
Geyer sugere, ainda, que os funcionários públicos e os autônomos, que atualmente contribuem para fundos de pensões distintos, passem a ser integrados ao sistema estatal geral de aposentadoria.
Por fim, haveria outra solução relativamente popular: aumentar a jornada semanal de 35 para 42 horas. Mas aqui Geyer é cético: "Acho que em muitos setores 40 horas é o máximo que se pode esperar que alguém trabalhe. Se se aumentam as horas de trabalho, é preciso considerar que os empregados já estão exaustos, e que essas horas adicionais contribuirão para a exaustão, com um impacto negativo sobre a saúde."
De qualquer modo, até 2025 o economista conta com um incremento das contribuições para a caixa de aposentadoria, dos atuais 18.6% para bem mais de 20%.
Ele ressalta que "dez anos atrás, ninguém esperaria que elas ainda estivessem abaixo de 19%": "Antes da guerra na Ucrânia e da alta da inflação, eu teria dito que podíamos nos permitir aumentar as taxas de contribuição, mas devido à inflação elevada, isso vai desencadear um debate um tanto acalorado."
Por enquanto, a Alemanha ainda pode se dar um tempo para encontrar uma solução, mas a probabilidade é que mudança demográfica acabará forçando o país a agir em relação à aposentadoria.
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