Puxada pela disparada da gasolina, a inflação medida pelo IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) acelerou para 1,73% em abril, informou nesta quarta-feira (27) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
É a maior variação para o mês em 27 anos. Ou seja, desde abril de 1995 (1,95%), período inicial do Plano Real. Em março de 2022, o IPCA-15 havia subido 0,95%.
Mesmo com a forte alta, o resultado de abril veio abaixo das estimativas do mercado financeiro. Na mediana, analistas consultados pela agência Bloomberg projetavam avanço de 1,84%.
Com os dados de abril, o IPCA-15 passou a acumular alta de 12,03% em 12 meses. É a maior desde novembro de 2003 (12,69%). Até março deste ano, estava em 10,79%.
"Houve até uma surpresa com o IPCA-15 abaixo das expectativas, mas o contexto ainda é de uma inflação muito pressionada", afirma o economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos.
O índice oficial de inflação no Brasil é o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), também divulgado pelo IBGE.
Como a variação do IPCA é calculada ao longo do mês de referência, o dado de abril ainda não está fechado. Será conhecido em 11 de maio.
O IPCA-15, pelo fato de ser divulgado antes, sinaliza uma tendência para os preços. O indicador prévio é calculado entre a segunda metade do mês anterior e a primeira metade do mês de referência da divulgação.
Neste caso, os preços foram coletados de 17 de março a 13 de abril. Isso significa que o índice captou reflexos econômicos da fase inicial da guerra entre Rússia e Ucrânia.
Com o conflito no Leste Europeu, houve disparada das cotações do petróleo no mercado internacional, o que levou a Petrobras a promover um mega-aumento nos preços de combustíveis nas refinarias em 11 de março.
Gasolina puxa resultado
De acordo com o IBGE, oito dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados no IPCA-15 tiveram altas de preços em abril.
A maior variação (3,43%) e o principal impacto (0,74 ponto percentual) vieram dos transportes, que aceleraram em relação a março (0,68%).
O grupo foi influenciado justamente pelo aumento dos combustíveis (7,54%). A gasolina teve alta de 7,51%. Assim, respondeu pelo maior impacto individual no IPCA-15 do mês (0,48 ponto percentual).
Também houve altas no óleo diesel (13,11%), no etanol (6,60%) e no gás veicular (2,28%).
Ainda em transportes, as passagens aéreas, que haviam recuado em março (-7,55%), subiram 9,43% em abril. Já os preços do seguro de veículo (3,03%) aceleraram pelo oitavo mês consecutivo, acumulando avanço de 23,46% em 12 meses.
Táxis (4,36%), passagens de metrô (1,66%) e ônibus urbanos (0,75%) tampouco escaparam da carestia.
Alimentos também sobem
O segmento de alimentação e bebidas veio na sequência do ranking dos grupos, atrás de transportes. A alta nesse ramo foi de 2,25%, com impacto de 0,47 percentual no IPCA-15.
O resultado de alimentação e bebidas foi puxado pelos itens consumidos no domicílio (3%), com destaque para tomate (26,17%) e leite longa vida (12,21%).
Outros produtos também tiveram altas expressivas. É o caso da cenoura (15,02%), do óleo de soja (11,47%), da batata-inglesa (9,86%) e do pão francês (4,36%).
A cenoura, aliás, acumulou disparada de 195% em 12 meses. Trata-se da variação mais intensa nessa base de comparação.
No início do ano, a produção de alimentos foi impactada pelo clima adverso no Brasil. Os registros de seca no Sul, além de chuvas fortes no Nordeste e no Sudeste, castigaram plantações diversas. Assim, geraram reflexos sobre a oferta e os preços da comida.
A guerra na Ucrânia também pressionou as cotações de commodities agrícolas como o trigo. O insumo é usado na fabricação de pães, massas e biscoitos.
Juntos, transportes e alimentação e bebidas responderam por cerca de 70% do IPCA-15 de abril. Na comparação entre diferentes meses, a alta de 1,73% é a maior do índice desde fevereiro de 2003 (2,19%).
Pressão sobre o BC
No acumulado de 12 meses, o indicador prévio está bem acima da meta de inflação perseguida pelo BC (Banco Central) para o IPCA.
O centro da medida de referência é de 3,50% em 2022. Já o teto foi definido em 5%.
Analistas do mercado financeiro projetam estouro da meta em 2022, o que significaria o segundo ano consecutivo de descumprimento.
A alta prevista pelo mercado para o IPCA é de 7,65% até dezembro, de acordo com a mediana do boletim Focus, publicado pelo BC. Há instituições financeiras que projetam avanço ainda maior, na faixa de 8%.
Para tentar conter a inflação, o Copom (Comitê de Política Monetária do BC) vem elevando a taxa básica de juros. Em março, o colegiado subiu a Selic para 11,75% ao ano.
Na visão de analistas, a disparada do IPCA-15 em abril mantém a pressão sobre o Copom, que volta a se reunir nos dias 3 e 4 de maio. A expectativa é de um avanço de 1 ponto percentual na Selic, que iria para 12,75%.
Inicialmente, o Copom sinalizou que encerraria o aperto monetário na reunião da próxima semana. Contudo, parte do mercado aposta em um ciclo de alta mais longo, o que poderia colocar a Selic acima de 13% até o final de 2022.
"O patamar de inflação ainda é muito elevado, e o dilema continua para o Banco Central: se termina ou se prolonga o ciclo de aumento no juro", diz Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos, que aposta em Selic de 13,25% até o final de 2022.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, chegou a indicar que o Brasil alcançaria em abril o pico de inflação no acumulado de 12 meses.
A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, avalia que a projeção é factível. Porém, ela menciona que o cenário macroeconômico ainda pode ser impactado por incertezas de diferentes origens.
Entre elas, estão as interrogações da corrida eleitoral e seus eventuais reflexos sobre a taxa de câmbio. "O IPCA-15 mostrou uma leitura ainda preocupante em abril", diz.
Relatório do C6 Bank assinado pelos economistas Claudia Moreno e Felipe Salles sublinha que "a inflação global já está muito elevada, e o mundo sofre hoje com dois choques inflacionários: a guerra da Ucrânia e a volta da Covid-19 na China".
"A desorganização das cadeias globais de produção, que já está complicada, deve piorar ainda mais com esses dois fatores, pressionando os preços em todo o mundo, não só no Brasil", aponta.
"Por ora, nossa projeção é que a inflação de 2022 fique em 7,2%, mas com forte viés de alta. Nossa estimativa é que o IPCA comece a desacelerar já no segundo trimestre, mas a queda pode ser mais lenta do que o esperado", completa.
Acumulado passa de 15% em Curitiba
O IPCA-15 ainda traz a variação dos preços em 11 capitais e regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE. Em 12 meses até abril, Curitiba acumula alta de 15,16%, a maior do levantamento.
Em seguida, aparecem Goiânia (13,09%), Recife (12,43%), Salvador (12,36%) e São Paulo (11,87%). A única metrópole com IPCA-15 um pouco abaixo de 10% é Brasília. A variação foi de 9,98% até abril.
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