Na quarta-feira (28), Arthur Lira publicou no Twitter que os dividendos de empresas do Simples não deveriam ser tributados, pois “são um dos pilares da nossa economia e da geração de empregos”. Essa sugestão foi acatada pelo relator. O ministro Paulo Guedes expressou concordância publicamente.
A reforma da tributação da renda tinha dois claros objetivos.
O primeiro era trazer equidade ao sistema atual, tributando de forma igual os rendimentos equivalentes. Com a pejotização, assalariados ou prestadores de serviços chegam a pagar 300% a mais de imposto que os sócios de empresas do Simples e do lucro presumido. Detalhes dessa distorção estão no Caderno nº 34 da FGV Projetos, em artigo publicado por mim e pelos diretores do CCiF à época (2018).
Estamos rumando para o oposto. Ao manter isentos os dividendos recebidos de empresas do Simples —ou parcela do lucro presumido, como está sendo cogitado—, a pejotização valerá ainda mais a pena. Não há nem ânimo para falar de progressividade...
Essa medida contribuirá para não alcançarmos o segundo objetivo dessa reforma, vinculado à melhoria da competitividade das empresas brasileiras. Ao aumentar o subsídio das pequenas e médias empresas, continuaremos fortalecendo empresas não competitivas.
Não deveria surpreender serem elas a empregar mais, afinal, grande parcela da renúncia fiscal está na contribuição previdenciária patronal.
Em 2019, Leonel Pessôa, professor da FGV, coordenou estudo que produziu uma avaliação econômico-jurídica do Simples. A conclusão foi que esse regime não tem paralelo no resto do mundo e é um gasto tributário que se traduz em entrave ao nosso desenvolvimento. Ao tratar pequenas empresas de forma benéfica, além de termos que tributar mais as empresas maiores, evitamos que aquelas cresçam e se tornem eficientes. É um duplo equívoco.
Essa não é uma crítica às pequenas empresas, mas às regras do jogo. Após o envio de um projeto de lei, cada grupo se organiza para defender seus interesses —e não há nada de errado com isso. Essa é a dinâmica da democracia. No entanto, cabe ao Parlamento ir além da narrativa “pró-reformas”, e ao Executivo, esclarecer de forma clara e assertiva as consequências dessas escolhas.
Se a isenção dos dividendos do Simples e a manutenção de um regime benéfico ao lucro presumido forem condição para aprovação dessa “reforma”, é dever do Executivo avaliar se esse é o caminho correto para chegar aos objetivos pretendidos, criar soluções alternativas e alertar para os efeitos de longo prazo das escolhas feitas pela política.
A tributação dos dividendos não é a única alternativa para eliminar a dupla não tributação da renda nos regimes simplificados. Há exemplos ao lado, como o modelo chileno. A redução da alíquota do Imposto de Renda das empresas também não é o único caminho para melhorar a competitividade das nossas empresas. Há uma agenda extensíssima de medidas menos charmosas e barulhentas, mas que dariam conta de melhorar efetivamente o ambiente de negócios no Brasil.
Abusamos do voluntarismo para criar soluções antes de nos dedicarmos ao que mais importa: diagnósticos baseados em evidências. O rumo dessa reforma da tributação da renda é icônico desse fenômeno. Começamos querendo mais justiça social e competitividade para as nossas empresas, e estamos terminando com o exato oposto. Como diz um grande economista a quem devo meus acertos nesse tema: a gente não é pobre à toa.
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