Sem Assange e WikiLeaks, não teria havido Vaza Jato e Lula 3, diz Natalia Viana

Para autora, organização revolucionou o jornalismo com grandes vazamentos e está sendo apagada da história pelos EUA

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Eduardo Sombini
Eduardo Sombini

Doutor em geografia pela Unicamp, é repórter da Ilustríssima

Natalia Viana tinha acabado de conhecer Julian Assange, em novembro de 2010, quando recebeu dele o recado em um papel: "Não fale uma palavra".

A jornalista brasileira viajou para Londres sem saber quase nada sobre o projeto em que acabaria se envolvendo, mas logo se deu conta do alcance e dos riscos do que Assange e o WikiLeaks estavam planejando: a divulgação de 250 mil telegramas de embaixadas dos Estados Unidos.

No recém-lançado "O Vazamento: Memórias do Ano em que o WikiLeaks Chacoalhou o Mundo" (Fósforo), a autora apresenta um balanço dessa experiência, que marcou a sua trajetória e mudou os rumos da sua carreira —bem como transformou o jornalismo nos anos 2010 e influenciou negociações diplomáticas e protestos populares ao redor do mundo.

Para mim, o Julian Assange foi o maior revolucionário do jornalismo deste século. Ele criou a ideia de que você pode usar os vazamentos massivos como instrumento do jornalismo investigativo. Se não fosse o Julian Assange, não ia ter havido os grandes vazamentos que vieram logo depois. Nem Snowden nem a Vaza Jato, que expôs as entranhas da Operação Lava Jato, inclusive ilegalidades —e, sem a Vaza Jato, a gente sabe que não haveria o presidente Lula hoje

Natalia Viana

jornalista e autora de 'O Vazamento'

Mulher com cabelo encaracolado jogado para o lado direito com camisa e jaqueta escuras
Retrato de Natalia Viana, autora de 'O Vazamento' - Divulgação

O livro transporta os leitores para o casarão, no interior da Inglaterra, em que a equipe se isolou antes da divulgação dos documentos e retrata a personalidade de Assange, registrando atitudes machistas e sua postura controladora, ao mesmo tempo que reconhece sua grandeza como figura histórica.

O fundador do WikiLeaks passou os últimos 12 anos privado de liberdade —primeiro na embaixada do Equador em Londres, depois em uma prisão britânica. No fim de junho, ele se declarou culpado, como parte de um acordo com o governo de Joe Biden para ser libertado, de uma acusação baseada na Lei de Espionagem dos Estados Unidos de 1917.

Neste episódio, a jornalista diz que esse desfecho cria um precedente que ameaça o trabalho de jornalistas investigativos em todo o mundo e critica o uso, nos Estados Unidos, da ideia de segurança nacional para deslegitimar a publicação de documentos confidenciais de interesse público e apagar da história iniciativas como o WikiLeaks.

Acho que, por conta das variadas fases de perseguição judicial que o Julian Assange sofreu, o valor do trabalho dele e do Wikileaks foram apagados na revisão histórica —um pouco acho que por preconceito, mas também por ação consciente do governo americano. As universidades americanas até hoje são proibidas de acessar os documentos vazados. Você tem um material excelente para construir pesquisa histórica, pesquisa sociológica etc. que a academia mais rica do mundo não pode acessar. Tem aí uma censura que acaba afetando a produção acadêmica

Natalia Viana

jornalista e autora de 'O Vazamento'

O Ilustríssima Conversa está disponível nos principais aplicativos, como Apple Podcasts, Spotify e Stitcher. Ouvintes podem assinar gratuitamente o podcast nos aplicativos para receber notificações de novos episódios.

O podcast entrevista, a cada duas semanas, autores de livros de não ficção e intelectuais para discutir suas obras e seus temas de pesquisa.

Julian Assange em frente a tribunal federal dos EUA nas Ilhas Marianas do Norte depois de se declarar culpado de acusação de espionagem - Yuichi Yamazaki/25.jun.24/AFP

Já participaram do Ilustríssima Conversa Raquel Barreto, pesquisadora do pensamento de Lélia Gonzalez, Carlos Poggio, professor de relações internacionais que analisa como o Brasil moldou a influência dos EUA na América do Sul, Luís Fernando Tófoli, psiquiatra engajado em pesquisas sobre os efeitos da ayahuasca, Pedro Arantes, que defende que a esquerda se levante do conformismo, Monica Benicio, viúva de Marielle Franco, Carlos Fico, historiador que pesquisa a ditadura e a intervenção de militares na política brasileira, Fernando Pinheiro, sociólogo que discutiu como imagens de escritores se mesclam em seus livros, Guilherme Varella, para quem o Carnaval de rua é um direito, Christian Dunker, que se contrapõe à conceituação da psicanálise como pseudociência, Rodrigo Nunes, professor de filosofia que propõe pensar a política como ecologia, Betina Anton, autora de livro sobre os anos do médico nazista Josef Mengele no Brasil, entre outros convidados.

A lista completa de episódios está disponível no índice do podcast. O feed RSS é https://folha.libsyn.com/rss.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.