Novo livro de Carol Bensimon trata de maconha na Calif�rnia; leia trecho
Deborah Paiva | ||
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Pintura de Deborah Paiva |
SOBRE O TEXTO O trecho nesta p�gina integra "O Clube dos Jardineiros de Fuma�a", livro que ser� lan�ado em novembro pela Companhia das Letras. A obra � ambientada na regi�o californiana do Tri�ngulo da Esmeralda, que concentra a maior produ��o de maconha dos Estados Unidos. Com in�cio no ambiente da contracultura dos anos 1960, a hist�ria faz um retrato do legado da gera��o hippie tendo como pano de fundo a recente descriminaliza��o da droga.
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Ele queria entender tanta coisa. Lua sangrenta. A falha de San Andreas. Aquilo que parece fuma�a e que chamam de Via L�ctea e voc� pode ver quando est� longe das cidades. As moscas da beira da praia. Impostos sobre gorjeta. Certas tatuagens. Uma mulher surfista com um rabo de cavalo grisalho. Ciclistas de roupas fluorescentes viajando pela Highway 1. Adesivos no para-choque dizendo "veterano do Vietn�". O canabidiol e os endocanabinoides. Entender de verdade. Lugares onde de repente todas as �rvores morrem. A morte de sua m�e. A garota que faz bijuteria e seu discurso urgente sobre karma. Espiritualidade.
Arthur Lopes est� sentado dentro de um carro na costa norte da Calif�rnia. Nada parece fazer muito sentido por enquanto, a come�ar pelo pr�prio carro, um Grand Marquis dourado, enorme, com frisos de pl�stico imitando veios de madeira, o �ltimo carro das pessoas que logo v�o ficar velhas demais para dirigir. Pagou mil e oitocentos d�lares por ele, duas semanas atr�s, em Los Angeles. Havia um cartaz no vidro traseiro, colado com fita adesiva azul e escrito nas letras grandes perturbadoras de algu�m que tinha se concentrado muito para escrever meia d�zia de palavras: "Todo o dinheiro vai para minha namorada". E a menina estava realmente l� enquanto Arthur contava as notas de cem d�lares, o gordinho segurando a m�o dela de uma maneira que podia tanto ser felicidade como desespero, os tr�s de p� em uma rua vazia do centro de Los Angeles, perto demais do Skid Row, onde viciados em metanfetamina viviam em barracas do tipo iglu.
N�o consegue pensar em Los Angeles agora de uma forma muito n�tida, ou no Brasil ou em seu pai ou em Elisa, porque est� naquele outro lugar, no p�er de Point Arena, no condado de Mendocino, e esse lugar engoliu todos os outros. Continua parado na �rea de estacionamento. Na sua frente h� uma pequena praia entre fal�sias monstruosas, encaixada atrav�s de processos geol�gicos sobre os quais ele n�o sabe coisa alguma. As navalhadas secas no rochedo ao menos deixam �bvio que nada aconteceu com tranquilidade. A Terra n�o dan�a, ele formula, fazendo uma careta para si mesmo como se j� estivesse tomado por certo esp�rito californiano que o seu ceticismo quer desesperadamente rejeitar. A Terra expele, traga, convulsiona. �s vezes d� certo, outras vezes n�o.
Faltam quinze minutos para as tr�s, o dia sem uma �nica nuvem, homens pescando no p�er, um cara s� de cueca vestindo sua roupa de neoprene. Um latino em uma picape vermelha desbotada estaciona ao lado do Grand Marquis, abre uma lata de alguma bebida doce demais e fica dentro do carro com os olhos vidrados no oceano. Essa � uma cidade de menos de quinhentos habitantes. As pessoas se divertem com o que t�m. V�o no fim do dia at� a rua principal e escolhem um dos lugares que ainda n�o fecharam as portas. Quase toda a parte sul de Point Arena est� abandonada, como se os estabelecimentos esperassem todos juntos a chegada de um milagre econ�mico ou uma s�bita disparada no n�mero de turistas. Se o Napa Valley e o condado de Sonoma conseguem atrair tanta gente, por que eles n�o conseguiriam? A imobili�ria East Ridge com folhas de compensado nas aberturas. A cantina italiana Gianinni's com um cartaz de "vende-se" ao lado de um retrato a �leo de Jesus Cristo. O centro comunit�rio da terceira idade. O Sea Shell Inn com os quartos sem mob�lia e as duas baleias grafitadas na parede.
Arthur tem um encontro �s tr�s horas. N�o consegue se sentir exatamente confort�vel quando est� a ponto de encontrar algu�m que nunca viu antes. Tamara arranjou tudo para ele. Ela disse: "Tem uma pessoa que acho que pode te ajudar". Ser ajudado tamb�m n�o � algo que o deixa � vontade, de maneira que Arthur gostaria de pensar n�o nesses termos, ele como a parte que implora para aprender, mas talvez em uma troca, isso, uma troca justa e objetiva, embora ele n�o fa�a a menor ideia do que teria a oferecer a um cara de setenta anos chamado Dusk.
O Clube dos Jardineiros de Fuma�a |
Carol Bensimon |
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Ri um pouco do nome ao descer do carro. Crep�sculo. Totalmente californiano. Ele se sente ent�o parte daquele cen�rio porque o calor do sol de repente toca seus bra�os e o vento est� soprando e fazendo mis�rias com os cabelos de duas garotas que tiram fotografias com um celular. As duas olham para ele enquanto Arthur caminha rumo � �nica constru��o da pequena praia, tirando a casinha que ele acredita ser uma escola n�utica e um pr�dio abandonado revestido de chapas met�licas, l� atr�s, perto da estrada. Chega na estrutura comprida de madeira com alguns estabelecimentos comerciais, dos quais dois ou tr�s est�o para alugar. Enquanto acessa a escada externa e sobe at� o Chowder House, pensa se Dusk vai se parecer com um hippie, um bandido ou uma mistura dos dois. N�mero tr�s. Aquele � o condado de Mendocino, afinal, e todo o pa�s sabe o que isso significa.
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CAROL BENSIMON, 35, autora dos romances "Sinuca Embaixo d'�gua" e "Todos N�s Ador�vamos Caub�is" (Companhia das Letras), � uma das integrantes da edi��o "Os Melhores Jovens Escritores Brasileiros", da revista inglesa "Granta".
DEBORAH PAIVA, 67, � artista pl�stica.
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