A Mattel, com seu "Barbie", anunciou que verterá para a tela de cinema algumas dezenas de seus itens credenciados. Em suma, a Mattel será a nova Marvel.
"Gran Turismo: De Jogador a Corredor" também porta, em latência explícita, nomes conhecidos como Playstation e Nissan —idem a tantos outros filmes frutos de expansão dos negócios, como os citados acima, Mario Bros., Lego etc. Mas o jogo é outro. Literalmente.
A começar por uma aparência de filme justo, direto, leve e que poderia ser considerado de filme médio. Ele não habita, então, o atual campo de batalha das bilheterias disputado pela Marvel e Mattel.
A distinção é até mais radical. O filme não é uma adaptação do simulador "Gran Turismo" da Playstation para o mundo real do cinema, mas sim uma história real levada à tela.
O britânico Jann Mardenborough foi, em 2011, um dos primeiros gamers a fazer parte do projeto GT Academy, que selecionou jogadores para trocar o joystick pelo volante de um carro de corrida real. Era o caso do jovem aficionado virando piloto profissional.
Diretor de "Distrito 9" e "Elysium", Neill Blomkamp faz aqui um leve drama de superação e reconhecimento que acompanha Mardenborough, encarnado por Archie Madekwe.
A relação entre o pai íntegro, mas preocupado com o futuro do filho obcecado pelo simulador, o primeiro amor, um acidente que gera um trauma moral ao herói do filme, o treinador ostracizado feito por David Harbour pretendendo dar a volta por cima e a competitividade sadia e parceira dos bons moços e a outra, violenta, daquele mais conhecido como o vilão do filme são algumas evidências de como segue a fórmula à risca. O filme é uma típica sessão da tarde.
O extraordinário neste "Gran Turismo: De Jogador a Corredor" estaria justamente na adoção de um viés mais ordinário —comum, à altura da experiência real— para falar sobre algo que o cinema de entretenimento certamente gostaria de estampar de forma mais espetacular e grandiosa na tela.
O filme opta, inclusive, por algo mais detido, enraizado na relação entre a corrida feita no simulador e a outra, na pista. O que não deixa de ser também um potente marketing e uma validação —justa, aliás— da excelência do "Gran Turismo" do Playstation como simulador de corrida, algo bem sintonizado com a moral das grandes produções, quando a experiência da sala de cinema é apenas parte de um todo maior.
Mas isso que chamamos de menor e sutil, o específico, funciona bem nesse jogo que Blomkamp faz entre game e pista, com o jovem Jann levando para a física letal das corridas reais algo que ele aprendeu no virtual. O rapaz repete no asfalto o tracejo que experimentou com sucesso na televisão do seu quarto. O filme, assim, insere vetores do game nas cenas das corridas reais.
A equipe tem falado sobre a baixa utilização de CGI nas filmagens. A aparência não condiz com a declaração. O que não é um problema, quando a adoção dessa tecnologia tomou quase todos os filmes como um tsunami, para o mal ou com mais critérios estéticos, caso dos filmes de James Cameron, por exemplo.
Mas a hibridização entre os itens físicos e os digitais funciona em "Gran Turismo" porque faz sentido pelo tema e pelo uso bem mensurado. Das Tartarugas Ninjas aos heróis das histórias em quadrinhos e a mais conhecida boneca do mundo, é minimamente interessante, e absurdo, que um filme sobre gamers que se tornam pilotos credenciados pela FIA carregue o rótulo de "uma história real".
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