Um pôr do sol avermelhado cobre o céu de Nova Primavera, cidade rural fictícia onde se passa "Terra e Paixão", que estreou nesta segunda-feira sucedendo "Travessia" na Globo. Uma espécie de poema sobre a cor vermelha é declamado por um pajé, vivido por Daniel Munduruku, enquanto labaredas cobrem a casa da protagonista, que foge dali enfiada num vestido carmim.
"Terra e Paixão" abusa dos tons terrosos em sua sequência de abertura e também da vinheta, cujo céu parece artificial. É uma tentativa de estabelecer o tom rural e se distanciar do azul cinzento de "Travessia", de Gloria Perez, que teve a segunda pior audiência para uma novela das nove da Globo, e ainda fazer um aceno a "Pantanal", um fenômeno absoluto.
Se no início de "Travessia" as atenções estavam voltadas para a estreia da ex-BBB Jade Picon como atriz, "Terra e Paixão" prefere apostar em tradições. Veteranos como Tony Ramos, Susana Vieira e Gloria Pires conduzem as primeiras cenas com a maestria que acumulam depois de atuar em dezenas de novelas.
Susana interpreta Cândida, dona de um bordel. É uma mulher desbocada, como a atriz é na vida real. Conhecida como um meme ambulante, não demorou para que Susana e sua personagem viralizassem no Twitter. Os internautas elogiaram suas piadas sórdidas, como a que ela debocha de um capataz machão pondo à prova o tamanho de seu pênis.
Tony e Gloria formam o casal Antônio e Irene La Selva, dois ricaços poderosos da região. É ele quem orquestra a invasão às terras de Aline, vivida por Bárbara Reis, que quase morre na confusão antes de ser salva por Caio, personagem de Cauã Reymond, o filho rebelde de Antônio que vai se voltar contra o pai.
Tudo indica que Reymond vai formar um triângulo amoroso com Johnny Massaro, que interpreta seu irmão Daniel, e Aline. Ainda é cedo para afirmar, mas os três parecem estar bem em seus papéis, ainda que o roteiro, com diálogos dramáticos e expositivos demais, não ajude muito Reymond.
Os dramalhões tradicionais de qualquer folhetim estão lá. Antônio, por exemplo, diz em voz alta que seu filho Caio foi o culpado pela morte da mãe após complicações no parto. É uma cena exagerada, simplista e maniqueísta demais.
É como se Walcyr Carrasco, o autor, estivesse colocando a carroça na frente dos bois ao estabelecer com tanta rapidez e exagero quem são os vilões e quem são os mocinhos com um texto exageradamente expositivo.
Os diálogos do primeiro capítulo foram usados várias vezes para explicar ao espectador em que ponto da vida cada um daqueles personagens se encontram. É difícil não recorrer a este recurso num primeiro capítulo, mas Carrasco parece ter feito pouco esforço.
Aline repetiu a vários personagens que não venderia as terras do seu marido morto. Na cena final, um tanto quanto cafona, ela exalta a terra em que pisa num monólogo. Terra vermelha, como ela diz muitas vezes ao longo do capítulo, ao ponto de ter virado meme nas redes sociais.
Isso não se restringiu aos protagonistas. Filha de Antônio, Petra, interpretada por Debora Ozório, a todo momento foi retratada grogue, seja enquanto estava à frente da câmera, com o foco voltado para si, seja enquanto estava atrás, borrada. Sempre grogue, porque toma muito remédio.
Se não agrade a crítica e um público mais exigente, esta abordagem é, contudo, segura. Carrasco costuma garantir sucesso à Globo, mesmo quando exagera no didatismo e no drama. O cenário, porém, é delicado. "Terra e Paixão" teve a pior audiência da história para uma estreia de novela das novela. Pode ser, também, um sinal de que Carrasco vai ter que afinar seu texto se quiser sair vitorioso como sua protagonista.
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