Homossexualidade � tratada de forma inteligente em 'Moonlight'
J� estamos no fim de "Moonlight - Sob a Luz do Luar", quando Kevin, o amigo de Black, pergunta quem, afinal, ele �. � tudo o que importa, desde que o filme come�a, desde que vemos o menino franzino que foge dos colegas. Ele atende pelo apelido de Little, ou seja, pequeno; ou, ainda, fr�gil.
O que mais chama a aten��o em Little s�o os olhos. Eles n�o parecem ver nada. � como se n�o existissem para ver, mas para que ele fosse visto pelos outros. E essa �, em resumo, a hist�ria de Little: a de algu�m que se constitui de fora para dentro. � como se os outros dissessem a ele, o tempo todo, o que ele �.
N�o s� os colegas que o perseguem dizem quem ele � ("bicha"). Tamb�m sua m�e, a drogada. E tamb�m o traficante Juan, que o acolhe como uma esp�cie de filho (e de quem Little escuta outras coisas que n�o as que falam os colegas ou a m�e). O que importa: Little � o que dizem que ele �. A m�e, frise-se, o chama pelo nome real: Chiron.
� a identidade, ali�s, que o define na segunda parte do filme, quando se torna um rapaz espigado, por�m ainda fraco. Um introvertido que mal conversa com outras pessoas. Exceto com Teresa, a namorada de Juan, o traficante (j� devidamente morto) e com Kevin, o �nico amigo com quem pode contar.
Pode, mas nem tanto: � Kevin quem o abandonar� meio covardemente durante um epis�dio decisivo, em que ser� espancado pelos colegas.
Quando chegamos � terceira parte, tudo parece ter mudado. Como se tiv�ssemos entrado em outro filme: Chiron tornou-se um fort�o, que circula num carro parecido com o de Juan, seu tutor. Tornou-se traficante, tamb�m. Usa um protetor nos dentes que lhe d� a apar�ncia agressiva que conv�m a um traficante. Passou por um reformat�rio e agora atende pelo nome de Black. Isto �, um gen�rico.
Um nome que n�o designa um ser, mas uma cor, uma etnia, uma "ra�a" –como preferir. N�o ser� segredo dizer que esse homem sem nome s� encontrar� sua real identidade ao descobrir sua sexualidade. Sua homossexualidade.
Eis, em suma, um tema delicado. N�o para Little, mas para qualquer um de n�s: a sexualidade � o que somos. E somos ao menos em parte, como Little, aquilo que outros dizem que somos. A busca de si mesmo passa pela sexualidade (ou a busca da sexualidade � o que nos constitui, desde a inf�ncia) de forma decisiva. Freud n�o tocou no tema por acaso...
A jornada de Chiron o leva da delicadeza da inf�ncia � brutalidade da idade madura. De v�tima a algoz, talvez. Barry Jenkins tem a intelig�ncia de reconstituir essa �rdua travessia –nada f�cil para ningu�m– sem facilitar o percurso nem de seu personagem nem de seu espectador.
Talvez "Moonlight" sofra de certa solenidade –mal que afeta quase todo filme do Oscar–, de alguma falta de humor, o que se explica pela complexidade do tema (para personagem e p�blico).
Em todo caso, a sinceridade, o tranquilo bom gosto de Jenkins e a inser��o da sexualidade entre outros temas (crescer; ser negro) garantem a "Moonlight" a primazia de tratar a homossexualidade de forma adulta e inteligente desde "Brokeback Mountain", de 2005, do qual, diga-se, n�o herdou a tend�ncia ao mel� acaipirado.
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