Mesmo t�mida, venda de performances cresce no mercado de arte brasileiro
Numa esp�cie de banquete de gala �s avessas, realizado em fevereiro deste ano, os artistas do Grupo Empreza perderam qualquer decoro por conta de pr�teses que dificultavam a mastiga��o e de faixas que os impediam de manusear os talheres. Quem n�o viu a performance, intitulada "Maleduca��o", pode ser que n�o tenha outra oportunidade para assisti-la em 2016.
A obra foi comprada em 2015 pelo colecionador S�rgio Carvalho, e o contrato, ainda em fase de ajustes, pode limitar o n�mero de apresenta��es at� a uma vez por ano. No acervo do advogado curitibano, detentor de mais de 1.300 pe�as, entre pinturas, esculturas e fotografias, esta � a segunda performance –nome que se d� a a��es que envolvem pessoas e possuem pontos em comum com o teatro.
Sua primeira aquisi��o foi "Tr�ptico Matera", do mesmo grupo, que para esta interven��o pesquisa materiais na cidade onde ser� apresentada e, ap�s process�-los dentro de baldes de metal, os despeja na cabe�a. A compra, de 2013, tamb�m possui cl�usulas em negocia��o. O pre�o n�o � revelado pelas partes.
Antes de adquirir as obras do Empreza, Carvalho nunca havia pensado em comprar uma performance. A sugest�o partiu dos integrantes do coletivo, artistas com quem o advogado possui proximidade. Diferentemente da aquisi��o de uma pintura ou escultura, na compra de performances, o colecionador leva para casa apenas pap�is: um passo a passo de como a a��o deve acontecer. Al�m disso, adquire o direito de realiz�-la.
SEM PERGUNTAS
O n�mero reduzido do g�nero na cole��o de Carvalho, apenas dois exemplares, reflete a dificuldade na compra e venda dessas obras. O setor dedicado a performances na SP-Arte –resultado da parceria entre a feira e o Centro Universit�rio Belas Artes de S�o Paulo–, por exemplo, n�o as comercializou neste ano.
Cau� Alves, coordenador do curso de artes visuais do Belas Artes, explica que seu "objetivo n�o era comercial", mas "chamar a aten��o para a pr�tica e a dificuldade de encontrar modelos que funcionem no mercado, que gosta de coisas palp�veis".
"Ano passado, fizemos parceria com a galeria Vermelho, que tem conhecimento comercial. Achamos que o p�blico fosse se interessar em comprar, mas ningu�m perguntou a respeito", diz Alves.
A op��o do setor nesta edi��o da feira, que encerra suas atividades neste domingo (10), foi apenas exibir dez performances selecionadas por uma comiss�o julgadora.
A galeria Bar�, entretanto, conseguiu vender na abertura da SP-Arte a performance "Parangol�", de Lourival Cuquinha, que consiste em um homem parado, vestido de policial militar. A obra, adquirida pela colecionadora Cleusa Garfinkel por R$ 25 mil, foi doada ao Museu de Arte Moderna de S�o Paulo.
RARIDADE
No Brasil, o MAM foi a primeira institui��o a incluir uma performance no acervo. Em 2000, adquiriu de Laura Lima as obras "Bala de Homem= Carne/Mulher=Carne", na qual um performer aguarda a bala derreter na boca aberta, e "Quadris de Homem=Carne/Mulher=Carne", em que duas pessoas se movimentam amarradas pela cintura.
Nenhuma delas � realizada pela artista, mas por performers contratados de acordo com as orienta��es preestabelecidas, que versam sobre a dura��o e at� mesmo o porte f�sico dos envolvidos.
"O fato de nunca ter realizado obras nas quais participo torna mais f�cil que sejam executadas", diz Laura, que, curiosamente, n�o gosta da nomenclatura "performance" para seus trabalhos. Ela possui pe�as desse g�nero no Instituto Inhotim e no Museu de Arte da Pampulha.
Outro exemplo � a obra "O Nome", de Maur�cio Ian�s, adquirida pela Pinacoteca de S�o Paulo em 2015. Na performance, funcion�rios do museu escolhem uma letra da palavra "inef�vel" para cantar –a dura��o varia de acordo com o f�lego dos participantes, poucos segundos. Sem previs�es de apresentar esta obra, a Pinacoteca guarda as instru��es em papel e em v�deo de como realiz�-la.
CASO DE MORTE
No caso do Empreza, a log�stica � mais complicada, pois envolve os dez integrantes do grupo. "Maleduca��o", por exemplo, s� acontece com o m�nimo de cinco membros, que devem chegar ao local cinco dias antes da execu��o, com cach�, transporte e hospedagem inclusos.
No contrato em negocia��o, al�m do limite do n�mero de apresenta��es, h� tamb�m possibilidade de veto, por parte do grupo, se existir diverg�ncia pol�tica ou moral quanto � exibi��o da obra. Qualquer registro, como fotos e v�deos, n�o poder� ser comercializado. Normalmente, quando se trata de performance, essa documenta��o muitas vezes � vendida como arte.
Recentemente, o Empreza modificou uma das cl�usulas, permitindo, em situa��es de exce��o, que outras artistas os representem. "S�o muitas quest�es envolvidas. Se f�ssemos esperar para resolver todas antes de vender, n�o vender�amos", diz Jo�o Angelini, um dos integrantes do grupo.
A negocia��o varia caso a caso, e as discuss�es s�o delicadas, pois artista e obra podem ser um s�. Em 2014, Maur�cio Ian�s vendeu o trabalho "Refus" para o Centro Nacional de Artes Pl�sticas da Fran�a, reconhecido por seu acervo de obras imateriais.
A performance, que se baseia em conversas com o p�blico, s� pode ser realizada pelo pr�prio Ian�s. Caso ele morra, n�o dever� ser repetida. "Fui questionado se deveriam fiscalizar meus h�bitos alimentares e pagar plano de sa�de vital�cio", conta o artista. "Recusei estritamente. Vida e obra se misturam, mas minha liberdade permanece."
De acordo com Eliana Finkelstein, diretora da Vermelho, galeria que representa artistas que trabalham com pr�ticas performativas, e onde ocorre desde 2005 a mostra de performance Verbo, as �nicas obras no formato vendidas pelo espa�o foram as de Ian�s.
Para o Empreza, "o investimento de S�rgio Carvalho � hist�rico". "Parece que as nossas foram as primeiras no pa�s adquiridas por um colecionador particular. Acho que ajudar� a regularizar a pr�tica comercial de trabalhos n�o materiais", diz Angelini, que espera encerrar 2016 com os contratos finalizados.
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