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LOUISIANA, 200
Região foi musa do autor, que preferia Nova Orleans a Baton Rouge
Mark Twain aprisionou rio Mississippi em sua obra
DO ENVIADO ESPECIAL À LOUISIANA
Mark Twain (1835-1910) é um
desses escritores cuja obra está ligada a um lugar. Grandiosa e
bem-humorada, sua literatura está tão relacionada ao sul dos EUA,
a seus personagens e a seu folclore, que há quem o chame de "Homero do Mississippi", "Charles
Dickens da América" ou "Giuseppe Verga do "swamp'" -o pântano cheio de vida que viceja paralelamente ao curso das águas do
grande rio.
Os romances de Twain fizeram
com o rio Mississippi o que Homero já havia feito com o Mediterrâneo no século 8� a.C., ao aprisionar, no poema épico "Odisséia", a magia do mar cravejado
de sereias que tentavam o personagem Ulisses com o seu canto.
A ligação entre Mark Twain e o
mais extenso e volumoso rio dos
EUA também encontra paralelo
nas obras de outros dois autores
do século 19: Charles Dickens, que
em "Oliver Twist" descreve uma
Londres "de sombras imensas e
opressivas", e Giuseppe Verga,
que em "Os Malavoglia" narra a
tragédia de uma família de pescadores nos arredores da Catânia,
na Sicília, Itália.
Nascido Samuel Laghorne Clemens às margens do rio, o autor é
um dos grandes escritores do seu
tempo e até seu nome de pluma,
Mark Twain, tem relação com o
Mississippi, curso d'água de 3.750
quilômetros com 500 afluentes
que flui embalado pelo ritmo da
música e emoldurado, em alguns
locais, por casarões aristocráticos.
O rio, que passa ao largo de cidades como Baton Rouge, capital
da Louisiana, e Nova Orleans, capital do jazz, onde deságua no golfo do México, foi cenário para "As
Aventuras de Huckleberry Finn",
que Twain publicou em 1884.
O tempo passou, indústrias tomaram conta das margens em diversas regiões, porém o rio resistiu e ainda dá as caras, mostrando
uma faceta histórica, por meio de
casas e barcos a vapor ou dos seus
"swamps" (pântanos) repletos de
árvores e animais.
Mesmo nas "plantations", fazendas antigas hoje transformadas em local de peregrinação de
turistas, as margens do Mississippi ainda exibem, com uma boa
dose de realismo, o tempo aprisionado na literatura de Twain.
Rivalidade
O autor, que transformou o dia-a-dia em torno do rio em literatura atemporal, era dono de um
bom humor infinito, mas nunca
se entusiasmou por Baton Rouge.
Preferia Nova Orleans, porto localizado rio abaixo, e nessa cidade
costumava se hospedar na casa do
escritor George Washington Cable, no número 1.318 da 8th Street.
A preferência do escritor, que,
aliás, gostava de escarafunchar o
folclore nascido e mantido nos
pequenos povoados ao longo do
rio Mississippi, explica um pouco
o relacionamento e o papel complementar que Baton Rouge e Nova Orleans têm até hoje no Estado
da Louisiana.
Nova Orleans, capital da folia,
foi edificada para os prazeres
mundanos, a vadiagem do Carnaval (Mardi Grass), o jazz, o culto
da magia negra (vodu) e a libertinagem dos bordéis.
Já Baton Rouge, capital política,
cresceu como o local onde prosperou a burocracia, onde os donos das "plantations" transformavam suas prosperidades em
poder -Mark Twain costumava
dizer que "o dinheiro era a raiz de
todo o mal".
Pseudônimo
Mark Twain viveu à beira do
Mississippi durante 14 dos seus 75
anos de vida. Filho de um juiz que
perdeu dinheiro comerciando
-e que morreu quando o escritor tinha apenas 11 anos-, o autor teria adotado o pseudônimo
para fazer um trocadilho, pois os
barqueiros do Mississippi, ao jogarem a corda da sonda, gritavam
algo que soava como "mark
twain" (ou "marque aos pares"),
informando aos grumetes a profundidade do rio.
Depois de deixar Hannibal, sua
cidade natal, Mark Twain foi piloto de navio no rio Mississippi, garimpeiro no Estado de Nevada,
gráfico e jornalista em cidades como St. Louis, Nova York e Filadélfia, onde decidiu navegar pelo terreno da literatura.
A fama veio quando publicou livros cheios de fantasia, alguns até
com ingredientes como viagens
no tempo, que tinham a propriedade de tecer uma crítica à sociedade norte-americana.
"As Aventuras de Huckleberry
Finn" tem esse poder e conta a
história de um menino branco
banido que, ao lado de um escravo adulto em fuga, percorre a região às margens do rio.
Hoje, a paisagem do rio não é
mais a mesma em toda a sua extensão, mas o Mississippi ainda
tem seu encanto, notadamente ao
redor de Baton Rouge.
Grande estrada de água da
América do Norte, o rio não tem
mais tantos barcos a vapor, mas
as chatas que percorrem o seu
curso e que parecem trens puxados por rebocadores deslocam algo como 500 milhões de toneladas de carga por ano.
(SILVIO CIOFFI)
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