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Opini�o

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Vera Regina Fonseca

Quest�o complexa, abordagem ampla

A psican�lise n�o pretende ser a �nica abordagem para o autismo. Mas n�o � admiss�vel que seja exclu�da de um campo no qual atua h� 90 anos

Em resposta ao artigo de Nilde Franch ("Autismo e psican�lise", 13/9), presidente da Sociedade Brasileira de Psican�lise de S�o Paulo, os autores Del Rey, Vilas Boas e Ilo ("An�lise do comportamento e autismo", 25/10) afirmam que h� um desconhecimento em rela��o � terapia comportamental. Se isso ocorre, vale para ambos os lados.

A psican�lise n�o nega que o autismo seja um problema de desenvolvimento, no qual fatores gen�ticos est�o envolvidos. Concebemos o desenvolvimento como um processo n�o-linear complexo. Ainda que os genes tenham um papel, a sua express�o se d� na intera��o com o ambiente, como bem ilustram os estudos de epigen�tica.

No autista, o resultado � uma dificuldade b�sica em se relacionar com as pessoas, o que o impede de usar a liga��o com os pais para a regula��o emocional e de se desenvolver no formato relacional, adquirindo um "radar social" como baliza.

Um dos argumentos da r�plica � que as estereotipias do autismo se devem � falta de repert�rio e de integra��o. Existe tal deficit, mas ele � secund�rio ao preju�zo central na capacidade de se relacionar. Ainda n�o se conseguiu demonstrar um defeito gen�tico espec�fico que cause os sintomas: o deficit social � o cerne, e v�rias das sintomatologias s�o consequentes ao mesmo.

Por meio de recursos t�cnicos pr�prios, o trabalho psicanal�tico objetiva reativar os caminhos do desenvolvimento relacional e compartilhar estrat�gias com os pais. Elas s�o obtidas a partir de uma compreens�o da mente espec�fica da psican�lise: a mente como um "�rg�o" que evoluiu, ao longo de nossa hist�ria filogen�tica, para permitir sobreviv�ncia em nosso nicho ecol�gico, o grupo social --que �, para a crian�a pequena, seus pais.

Uma das tarefas centrais de tal �rg�o-mente, o gerador de nosso comportamento, � processar emo��es. E as emo��es s�o, basicamente, relacionais. Para ajudar os pacientes no processamento de tais emo��es, buscamos conhecer, em cada um, o estado de mente que gera seu comportamento, o que envolve descobrir como ele lida com, ou evita, as emo��es relacionais.

O texto tamb�m critica que patologias s�rias sejam abordadas por tratamentos n�o comprovados cientificamente. H� certamente dificuldades metodol�gicas para desenhar pesquisas longitudinais que comprovem o resultado de psicoterapias. Mas elas n�o s�o insuper�veis, o que � mostrado por v�rios estudos em curso, um deles conduzido na pr�pria Sociedade de Psican�lise.

Al�m disso, o m�todo do estudo de caso foi e continua sendo de extrema import�ncia nas ci�ncias m�dicas; h� mais de 230 artigos nesse molde na base de dados do "Psychoanalytic Electronic Publishing".

A dificuldade na realiza��o de pesquisas de resultado n�o afligem s� a psican�lise; mesmo as que avaliam outros tratamentos sofrem com problemas e insufici�ncias metodol�gicas, como amostras muito pequenas e outros vieses.

N�o se trata de um ensaio cl�nico em que ser�o comparadas medica��es e seus efeitos, mas de um transtorno complexo, de enorme diversidade e que, provavelmente, abriga quadros com origens diferentes.

A psican�lise n�o pretende ser o �nico caminho para a abordagem dos transtornos aut�sticos; tal postura seria religiosa e contr�ria � sua natureza cient�fica. Mas tamb�m n�o � admiss�vel uma "religi�o" que determine a exclus�o da psican�lise de um campo no qual ela tem 90 anos de experi�ncia, j� que Melanie Klein trabalhou com sucesso uma crian�a autista na d�cada de 20, antes at� da descri��o feita por Leo Kanner.

Sejamos humildes e entendamos que pouco sabemos ainda. A psican�lise admite que o paciente � uma pessoa desconhecida que tentaremos compreender, usando nossa mente humana e nossa experi�ncia cient�fica, para traz�-lo para o grupo social, com a ajuda da fam�lia e de outros profissionais.


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