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ÀS VEZES ELES VOLTAM
Radiohead lança novo ataque à cultura na próxima segunda
2 + 2 = 5
GUILHERME WERNECK
DA REPORTAGEM LOCAL
A matemática improvável do título ao lado tem
razão de ser. Afinal, são cinco os membros do
Radiohead, e a soma dos elementos que eles trabalham em seus discos, desde "OK Computer",
nunca é exata. Se você achou tudo isso uma viagem sem fim, então pode pensar que é apenas
uma homenagem ao novo álbum da banda, "Hail
to the Thief", que será lançado na próxima segunda-feira, e abre com a faixa "2+2 = 5".
Voltando à matemática improvável, só ela pode
explicar como, em pouco mais de dez anos, o Radiohead deixou de ser um forte candidato a banda
de uma nota só (o hit "Creep") para se transformar no embaixador da música experimental dentro do primeiro escalão da indústria cultural.
Tudo começa em Oxford, Inglaterra, nos anos
80, com a banda On A Friday, formada pelos amigos de escola Thom Yorke (vocais e guitarra), Phil
Selway (bateria), Colin Greenwood (baixo), seu
irmão mais novo, Jonny, e Ed O'Brian (guitarras).
Foi com a segunda demo do On A Friday, já nos
anos 90,
que eles
conseguiram um
contrato com a EMI. Sacaram que o nome não
era dos melhores e buscaram inspiração numa
canção do Talking Heads, lançada no disco "True
Stories".
"Pablo Honey", seu primeiro álbum, foi lançado em 93 sem muito estardalhaço no Reino Unido. Contudo os americanos descobriram a balada grunge "Creep", e a banda virou o equivalente
inglês do Nirvana. Aí surgiram as suspeitas de
que o Radiohead era mais um desses grupos que
lançam um grande hit e somem da face da Terra.
Ouvindo "Pablo Honey" hoje, parece injusto. O
disco é irregular, soa bastante como U2 em algumas faixas, mas a alquimia entre os três guitarristas já era evidente e explodiu no álbum mais pop
da banda até hoje, "The Bends", de 95.
Com uma produção melhor, um triunvirato de
guitarras e letras que alternavam tristeza sem fim,
escárnio e críticas à sociedade de consumo, "The
Bends" invadiu as rádios com um single atrás do
outro, e a crítica percebeu que tinha nas mãos um
filho legítimo de um triângulo amoroso formado
por Pixies, Sonic Youth e R.E.M..
Era pouco. Em 96, um novo personagem surge
para ajudar a banda a forjar o seguinte e mais duradouro assalto à cultura. O produtor Nigel Godrich leva o Radiohead para uma mansão, onde é
gestado um dos mais louvados discos da história
do rock, "OK Computer". Um álbum conceitual,
magnífico em sua investigação da relação entre
homem e máquina na era pós-industrial, com
vocais torturados e poesia oblíqua, mas crítica.
Mesmo na contramão da aposta mercadológica de empurrar o lixão para as massas, "OK Computer" chegou ao topo das paradas, ganhou
Grammy e foi eleito pelos leitores da revista "Q 4
Music" o melhor álbum de todos os tempos.
Depois de megaturnês em estádios lotados, o
Radiohead poderia descansar sossegado e repetir
a fórmula vencedora ao infinito. Mas deu seu salto mais ambicioso. No estúdio com Godrich, pôs
as guitarras de molho, incorporou instrumentos
eletrônicos estranhos, como o Ondes Martenot
(uma espécie de teremim mais preciso) e passou a
usar técnicas de gravação inspiradas nos métodos
de Brian Eno (ex-membro do Roxy Music, produtor musical e inventor da ambient music). Resultado: os desafiadores "Kid A" e "Amnesiac".
Usando a mesa de mixagem como instrumento,
a banda aproxima-se da eletrônica de vanguarda
do selo Warp (Aphex Twin, Autechre), dilui os
significados das letras e trucida melodias. O estranho é que, mesmo descartando o jeitão de hino de
suas canções, o Radiohead consegue manter o
status de gigante da mesma indústria que critica.
Agora, a banda volta com "Hail to the Thief", título surrupiado dos protestos contra a eleição de
George W. Bush, em 2000, quando os manifestantes seguravam cartazes com os dizeres "Hail to the
thief, our commander in chief" (Viva o ladrão,
nosso comandante em exercício).
A reportagem do Folhateen não ouviu o novo
disco. Mas, como qualquer fã que tenha um computador e uma linha telefônica, baixou a versão
que vazou na internet, ainda sem a mixagem final,
segundo a banda. Como a mixagem é parte do
processo criativo do Radiohead, fica difícil julgar
essa versão. Só dá para dizer que terá mais guitarras e que a fascinante estranheza eletrônica permanece um elemento crucial.
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