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Por 7 votos a 2, STF mantém Lei da Anistia sem alteração
Tribunal derruba ação da OAB que pedia revisão da lei para punir torturadores
Lewandowski e Ayres Britto
divergiram do relator ao
definir que tortura é crime comum, mas maioria disse que perdão foi consensual
FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O STF (Supremo Tribunal
Federal) decidiu ontem que a
Lei da Anistia não pode ser alterada para possibilitar a punição de agentes do Estado que
praticaram tortura durante a
ditadura militar (1964-1985).
Os ministros negaram, por 7
votos a 2, um pedido da OAB
(Ordem dos Advogados do Brasil) que questionou a extensão
da legislação, editada em 1979
pelo governo João Figueiredo.
A entidade argumentava que
a tortura é um crime comum e
imprescritível e, portanto,
quem o cometeu não poderia
ser beneficiado pelo perdão. A
tese, porém, não prevaleceu.
O julgamento, considerado
histórico pelos próprios ministros, encerra uma polêmica que
dividiu o governo Lula. Após
dois dias de julgamento e mais
de dez horas de discussão, o tribunal entendeu que a Lei da
Anistia foi "bilateral" e fruto de
um acordo político resultado
de um "amplo debate" travado
pela sociedade brasileira.
Prevaleceu a tese do relator
do caso, ministro Eros Grau, ele
próprio uma vítima da ditadura
militar -foi preso e torturado
na década de 1970. Seu voto,
que durou mais de três horas,
foi proferido anteontem, quando o julgamento foi suspenso.
Ontem, ele foi seguido pelos
colegas Cármen Lúcia, Gilmar
Mendes, Ellen Gracie, Marco
Aurélio Mello, Celso de Mello e
Cezar Peluso -cuja estreia na
presidência da corte foi marcada pelo julgamento.
Todos afirmaram ser importante analisar a legislação em
seu contexto histórico e citaram um parecer da própria
OAB, assinado pelo então conselheiro Sepúlveda Pertence,
hoje ex-ministro do Supremo,
que defendia a maior amplitude possível da anistia. A entidade, à época, defendeu a anistia.
"A anistia é sempre ampla, é
sempre no sentido da generosidade", afirmou o presidente do
STF, no voto que encerrou a
sessão e definiu o placar. "Só
uma sociedade elevada é capaz
de perdoar. Uma sociedade que
quer lutar contra seus inimigos
com as mesmas armas está
condenada ao fracasso."
Mais cedo, os ministros Carlos Ayres Britto e Ricardo Lewandowski haviam inaugurado
uma divergência com o relator
ao defender a punição dos torturadores. Para eles, a tortura é
imperdoável. "O torturador
não é um ideólogo. Ele não comete crime de opinião, portanto, não comete crime politico. É
um monstro, um desnaturado,
um tarado. Não se pode ter condescendência com torturador",
afirmou Ayres Britto.
Ambos fizeram uma diferenciação entre crimes comuns
-no caso, os atos de tortura
praticados na época da ditadura- e crimes políticos, esses
sim, segundo eles, passíveis de
perdão no caso de se proferir
uma anistia. Britto chegou a defender que a lei brasileira não
foi "ampla, geral e irrestrita",
conforme proclamava o slogan
da época, e sim "relativa".
O voto de Lewandowski provocou um mal-estar. Peluso e
Eros Grau fizeram questionamentos sobre sua conclusão, o
que deixou o ministro irritado.
Ao pronunciar o resultado, ele
disse que julgava "procedente
em parte" o pedido da OAB, argumentando que o Judiciário
deveria analisar "caso a caso" a
punição a torturadores.
Peluso e Eros Grau pediram
para Lewandowski explicar
melhor a sua decisão. Nervoso,
o ministro disse que já havia exposto as razões, mas que eles
poderiam, se quisessem, ler novamente o seu voto.
"Não estamos aqui questionando a pertinência do seu voto", disse Peluso, explicando
que era necessário entender o
que o ministro dizia para evitar
problemas na hora da proclamação do resultado e eventuais
recursos da parte derrotada caso sua tese prevalecesse.
Os ministros fizeram questão de dizer, em seus votos, que
o julgamento de ontem não se
estende à polêmica sobre acesso a documentos da época da
ditadura, objeto de outra ação
que será analisada pelo STF.
Divisão
A anistia provocou um racha
na cúpula do governo Lula. A
divisão ficou tão evidente que,
na manifestação do Executivo
no processo no STF, foram encaminhados pareceres de seis
órgãos públicos, e não somente
da AGU (Advocacia-Geral da
União), como tradicionalmente ocorre. A AGU e ministérios
da Defesa e Itamaraty defendiam manter a lei como ela foi
editada, há mais de 30 anos.
Já a Casa Civil, o Ministério
da Justiça e a Secretaria de Direitos Humanos pediram a sua
reformulação para que militares que cometeram tortura fossem responsabilizados pela
Justiça. O presidente Lula não
chegou a se manifestar.
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