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Abin paga empresa para espionar entidades
Agência de notícias de fachada foi criada por ex-agentes do governo; documentos revelam que sem-terra e sindicatos são monitorados
Donos da BR Capital Press, credenciada como imprensa no Planalto, negam relação com a Abin; agência diz não autorizar criação de empresa
EDUARDO SCOLESE
FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo Lula paga há cinco
anos uma empresa de comunicação de fachada para espionar
ações de sindicatos, movimentos de sem-terra e indígenas.
A empresa de notícias foi formalmente criada em 2005 por
dois servidores da reserva, um
da Marinha e outro da Polícia
Militar do Distrito Federal. Antes de registrarem a empresa,
em Brasília, ambos atuaram
oficialmente como arapongas
da Abin (Agência Brasileira de
Inteligência), vinculada à Presidência da República e que hoje paga serviços dessa agência
de notícias de fachada.
Com o nome de BR Capital
Press Empresa Jornalística
Ltda., funciona em salas no décimo e no 13� andares de um
prédio no centro de Brasília.
Para sustentar o disfarce, emprega dois estagiários, um fotógrafo e abastece timidamente
uma página na internet.
A Folha teve acesso a uma
série de relatórios da BR Capital Press, além de documentos
sobre a sua criação e "negociação" de imagens e textos. A papelada revela que se trata de
uma fachada legal criada para
monitorar e produzir relatórios sobre manifestações, marchas e encontros, em especial
de sem-terra e sindicatos.
Prática enraizada na ditadura pelo SNI (Serviço Nacional
de Informações) e agora mantida por meio da Abin, a espionagem de movimentos não é
novidade. Neste caso, porém,
dois pontos chamam a atenção:
o monitoramento num governo que se diz aliado dos movimentos de sem-terra e o uso
dos meios jornalísticos -a BR
Capital Press é credenciada no
Planalto e tem acesso a todos
os eventos públicos de Lula.
Apesar de a Abin afirmar que
não está na lista de suas competências autorizar a abertura
de CNPJs, a criação de empresas fictícias é um dos principais
métodos de espionagem, chamado "história cobertura".
Definida em manuais de serviços de inteligência como técnica para encobrir identidades
e dissimular ações, a fachada
legal muitas vezes se torna um
negócio real e lucrativo, segundo servidores e colaboradores
da Abin ouvidos pela Folha.
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
tem sido um alvo da empresa.
Em maio, por exemplo, o repórter-fotográfico com o crachá da agência seguiu todos os
passos da entidade em Brasília,
em meio a um acampamento
para pressionar o governo.
"Tínhamos conhecimento de
que somos monitorados pela
Abin. Não imaginávamos que
tinham atingido esse grau de
sofisticação, criando uma
agência de notícias", afirma
Marina dos Santos, da coordenação nacional do MST.
No caso da BR Capital Press,
a busca por legitimidade para
afastar possíveis desconfianças
de seu real objetivo deixa rastros de desleixo. Em seu site, o
conteúdo está invariavelmente
desatualizado e algumas legendas de fotos são colocadas de
forma genérica, sem sentido.
A reportagem indagou os donos sobre seus clientes e a ligação com a Abin. Eles dizem que
vendem material para quem
solicitar e negam relação com o
governo.
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